Certa vez precisei comprar um livro que ainda não havia sido publicado no Brasil. Com tantas opções de livrarias on-line, optei pela mais conhecida na época, a Amazon.com, que sofria com o estouro da bolha da Internet. Fiz a solicitação do livro, paguei com cartão de crédito e como eu não tinha tanta pressa em receber optei pela entrega internacional normal (mais barata).
Escolhendo este modo, recebi a expectativa de entrega do livro para até 45 dias após meu pedido. Quando recebi a encomenda 15 dias depois, surpresa. Uma interessante carta junto ao pacote dizia mais ou menos assim: “Caro Consumidor, como estamos próximo do Dia das Mães, entendemos que este livro deve ser um presente. Como o modo de entrega que o Sr. escolheu não permitiria que o livro fosse entregue em tempo hábil, decidimos sem custo adicional, mudar o tipo de entrega de normal para prioritário. Esperamos que nossa escolha esteja correta. Obrigado, Atendimento ao Consumidor – Amazon.com”.
Eu, que nunca havia comprado um livro on-line, fiquei boquiaberto com o atendimento da loja. Mais que uma decisão, foi um golpe certeiro no meu emocional como consumidor!
Este mês precisei comprar outro livro – desta vez em espanhol – e resolvi usar novamente a Amazon.com. Fiz todo o processo, inclusive colocando o tipo de entrega como normal, a previsão de entrega era de 50 dias após o pedido. A minha surpresa foi ainda maior, pois o livro chegou em menos de 5 dias após a compra, em remessa DHL e com envio pela Argentina!
Estes dois casos narrados ilustram de forma interessante o conceito de lealdade ou customer loyalty. Normalmente, um cliente só se torna fiel quando a satisfação vira uma constante, ou seja, de nada adiantam as pesquisas instantâneas de satisfação, já que o cliente pode estar tanto em um bom momento (e qualificar positivamente a sua empresa) como pode ter acordado de mau humor e literalmente arrasar a sua empresa.
KOTLER (1998) indica que a satisfação é função do desempenho percebido e das expectativas: se o desempenho atender (ou exceder) às expectativas, o consumidor ficará satisfeito (ou altamente satisfeito), e se ficar aquém das expectativas, o consumidor ficará insatisfeito.
Uma pesquisa realizada por uma grande montadora em 2003 mostrou que 85% dos seus clientes estavam satisfeitos com seus veículos; no entanto, estes mesmos clientes mudaram de marca um ano depois!
Isso me faz concluir que manter um cliente satisfeito vai além das pesquisas e dos brindes de final de ano; é tornar cada interação, ou “momento da verdade”, uma experiência única e marcante para o consumidor.
Segundo GALE (1996), é necessário migrar da satisfação dos clientes para o conceito de valor percebido pelo cliente para aumentar a lealdade. Ele diz ainda que as pesquisas de satisfação de clientes deveriam ser substituídas pela análise de valor e preço de mercado.
Cada departamento, cada área da empresa, deve compreender e buscar formas de satisfazer o cliente – seja ele interno ou externo. A área de pós-vendas, muitas vezes considerada apenas como “delivery”, tem função primordial nesta busca, pois normalmente está em contato com o cliente nos momentos difíceis, quando um equipamento falha, ou um projeto precisa ser revisado.
Às vezes só pela pró-atividade em ligar para o cliente informando a situação atual, faz com que ele sinta-se seguro e amparado, o que irá refletir em um momento de satisfação com a prestadora de serviços. Este exemplo pode ser estendido a todas as áreas da empresa, cada uma com maior ou menor intensidade de exposição ao cliente.
E como isto afeta a lucratividade? Se a lealdade é um processo contínuo, podemos entender que manter nossos clientes leais é o mesmo que mantê-los em nossa base por um bom tempo. Um estudo realizado por REICHHELD (1996), analisando a lucratividade em vários segmentos, mostrou que uma redução na perda de clientes em 5% aumenta a lucratividade entre 35% no segmento de software e 85% no segmento de varejo.
Este efeito na lucratividade, ainda segundo REICHHELD, chega a superar o efeito das variáveis tradicionais, como participação de mercado, redução de custos ou desenvolvimento de novos produtos (DOMINGUEZ, 2000). Ainda, se este aumento for reinvestido em melhoria da qualidade para atendimento, ou aumento da satisfação, entraremos em uma espiral ascendente fantástica.
SHAPIRO e SVIOKLA (1995) já escreviam sobre o custo de conquista de clientes que é pelo menos 5 vezes maior que o custo de retenção. Isso sustenta definitivamente a busca pela lealdade como forma de aumento da lucratividade.
A lealdade deve ser encarada com seriedade pelas empresas de serviço. Em um mundo cada vez mais competitivo, mudar de prestadora de serviço é tão simples como parece e perder um cliente pode ser a diferença entre estar no céu ou no inferno.
Leonardo Nogueira é Diretor de Desenvolvimento de Negócios e Canais da Dimension Data.
Bibliografia
GALE, Bradley T. Gerenciando o valor do cliente: criando qualidade e serviços que os clientes podem ver. São Paulo: Pioneira, 1996.
KOTLER, Philip Administração de Marketing: análise, planejamento, implementação e controle. São Paulo: Atlas, 1998
REICHHELD, Frederick A estratégia da lealdade. Rio de Janeiro: Campus, 1996.
SHAPIRO, Benson e SVIOKLA, John. Mantendo clientes. São Paulo: Makron Books, 1995.
DOMINGUEZ, Sigfried. O valor percebido como elemento estratégico para obter a lealdade dos clientes. Caderno de Pesquisas em Adminstração. São Paulo: v.07, no. 04, outubro/dezembro 2000