Hora de olhar o futebol como negócio

Será mesmo que o programa-sócio torcedor vale a pena? Ao contrário do que se pode imaginar, ele ainda não representa ganhos significativos aos clubes, uma vez que faz parte apenas de 10% das receitas totais, segundo mostrou uma pesquisa realizada pela Ernst & Young, em parceria com o grupo de marketing esportivo CSM Brasil. Por isso, por mais que o programa seja importante, é necessário que os times também tenham atenção com todos os públicos, mesmo os não associados. Ou, como chama Henrique Netto, diretor da CSM Brasil, de simpatizantes. “Torcedor é o cara que de fato consome futebol e está mais propenso a assinar o sócio-torcedor, já o simpatizante é aquele que não necessariamente vai ao estádio, compra ingresso, camisa oficial, assina o pay-per-view”, explica.
É pensar com uma visão voltada para o negócio perceber que é essencial transformar a torcida em cliente, independente de quem seja. “Os clubes têm que estar preparados para encarar o torcedor como um cliente, um consumidor de marcas e produtos”, acrescenta Marcos Nicola, diretor de mercados estratégicos da EY. Em entrevista à ClienteSA, ambos contam sobre a necessidade de fidelização e conquista da base de clientes por parte dos clubes. 
Qual a importância de tornar um torcedor em um cliente para o time?
Netto: A importância é total nos dias atuais, já que está mais do que comprovado que o sócio-torcedor, hoje, é uma das principais receitas de um clube de futebol. Na realidade, quando você pensa nessa base de torcedores, eles ainda não são exatamente clientes. A gente costuma trabalhar com o conceito de separar o torcedor do simpatizante. Torcedor é o cara que de fato consome futebol e está mais propenso a assinar o sócio-torcedor, já o simpatizante é aquele que não necessariamente vai ao estádio, compra ingresso, camisa oficial, assina o pay-per-view. Então, o que tem que fazer, e o que a gente procura fazer, é cadastrar todos esses torcedores e simpatizantes e estabelecer um programa de relacionamento contínuo, para que possa identificar os desejos e necessidades de cada um deles. Aí sim, através do relacionamento e de uma análise de perfil daquilo que ele exatamente espera, começar a monetizar esse cara e transformá-lo em um cliente. É basicamente assim que os clubes devem se comportar e ter em mente como uma visão de negócios. 
Nicola: Sobre o ponto de vista da gestão, do negócio, a importância significa dar uma visão de amplificação de efeito, os clubes têm que estar preparados para encarar o torcedor como um cliente, um consumidor de marcas e produtos. A fidelização é o passo subsequente na questão do cadastramento. Um relacionamento que leva à monetização e transformação, por consequência, em cliente, buscando a fidelização e manter esse torcedor e simpatizante engajado de uma maneira permanente. Um exemplo disso, no nosso estudo, a gente aponta que a arrecadação com esse programa representa menos de 10% das receitas totais da metade dos clubes analisados. O que quer dizer, tem importância para o time, mas está bem aquém ainda dos 30%, 35% do faturamento. Significando que existe um grande potencial para crescimento ainda. Se olhar para um mercado maduro, como a Europa, que é onde a gente se espelha, ainda tem muito campo para se jogar. 
 
Por conta, justamente, de ser uma estratégia que está no começo, os times têm consciência da importância de se fidelizar o torcedor?
Nicola: Sim, eles têm consciência, mas, por outro lado, sabemos o quanto ainda não se consegue o domínio, a real compreensão desse assunto. Isso foi até o que me motivou a fazer essa pesquisa, a forma de como é que é essa relação de clubes e torcidas dentro desse modelo mais profissional, de entender o futebol como um business.
Netto: Sobretudo nós da CSM, que somos uma empresa de marketing esportivo e temos uma unidade de negócio que faz a gestão integral desses programas, em parceria com os clubes, aplicando ferramentas e inteligência de negócio, quando falamos de sócio-torcedor, estamos falando de produto de fidelização, que são assinaturas que o cliente acaba conquistando. Embora já haja o nível crescente de conscientização, os investimentos necessários ainda são difíceis de serem feitos, porque a maioria dos clubes têm outras prioridades, então, em um médio prazo todo clube fará os investimentos nesse trabalho.
 
Por ele já ser um torcedor, a fidelização é mais facilitada?
Nicola: Por ser torcedor, a pessoa garante uma maneira de relacionar com a marca, com o clube. Ele tem a paixão, vai ao jogo, compra camisas e outros produtos, mas existe uma distância grande em garantir fidelização. Garantir que vai levá-lo a fazer parte de um programa de sócio-torcedor, onde ele vai se manter fiel ao programa, para que possa traduzir sua paixão para algo que gere mais receita, não dá para fazer.
Netto: Nesse aspecto é que entra a importância de um trabalho mais estruturado para poder garantir que a fidelização aconteça de uma maneira mais consistente e não apenas iniciativas pontuais e mais simples, que talvez seja o que a maioria dos clubes ainda faça.
 
O que é preciso fazer para que ele seja fiel à marca?
Nicola: A fidelização à marca já é natural. É a segunda pele do torcedor. Agora, sob a ótica do negócio há a exposição da marca e quando se faz isso, busca através de um modelo de negócio trazer novas oportunidades, que com isso tragam aos clubes maiores receitas e transformar em novos investimentos. 
Netto: Quando falamos de um programa como o sócio-torcedor, a gente pode considerar algo entorno de 1 a 5% da base. O Internacional é o time que tem a maior conversão do país em sócio-torcedores e são apenas 2% de sua base. Especificamente, em relação à estratégia de marca, é sempre bom contar com o dueto: produto/serviços bem feitos e bom atendimento. É preciso ter um bom relacionamento, entender quais são as expectativas e necessidades, para que esta oferta de produtos seja a mais adequada possível. Essa é a premissa da fidelização.  
É preciso ter um algum tipo de cuidado para não correr o risco de perder o cliente? 
Netto: Sem dúvida! Uma experiência ruim é o inicio desse torcedor para começar a se afastar. Quando se estrutura uma boa oferta e pacote de serviços é preciso tentar o máximo possível para que tudo funcione a contento. A experiência do torcedor, por exemplo, na compra do ingresso tem que ser a melhor possível, se for pela internet, o link tem que estar estável e, caso não funcione, a resolução tem que ser imediata, tem que haver uma estrutura específica para atender esse sócio, pois em tese ele já é um torcedor fidelizado. Por isso, é preciso ter uma boa estrutura por detrás, havendo um bom atendimento para que este canal seja permanente, onde as resoluções dos problemas sejam resolvidas de maneira satisfatória, garantindo a satisfação do cliente. Se isso não acontecer, o risco de perda desse cliente é grande, ela existe e é real.

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