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Saber negociar é pré-requisito para gestão


Luis Felipe Cortoni


Até o início dos anos 80 a negociação, no Brasil, era uma habilidade exigida e tida como prerrogativa de apenas alguns agentes organizacionais. Vendedores, compradores e negociadores de RH eram os legítimos “donos” desta habilidade, ou seja, agentes que operam na fronteira da empresa com algumas de suas interfaces (fornecedores, clientes, sindicatos).

Mudanças na nossa concepção de organização (assumindo os conflitos internos como inerentes ao sistema, considerando as divergências de interesses e posições funcionais como legítimas) fizeram com que a habilidade de negociação amplificasse sua utilidade. Hoje em dia, a possibilidade de se chegar a convergências pactuadas entre partes foi transportada para o cotidiano da empresa como um comportamento esperado de gestores de qualquer nível. Quer dizer, estruturas mais complexas, diversidade de públicos internos e externos, relações globalizadas foram alguns dos elementos que determinaram que gestores deveriam orquestrar as atividades de pessoas e de funções internas e externas, visando firmar acordos sólidos, solucionar conflitos, buscar convergências. Desta forma, a negociação ganha status de habilidade gerencial, igualando-se em importância ao planejamento e à gestão de pessoas. Pode-se dizer que a negociação tornou-se um pré-requisito ao aspirante de postos gerenciais, porque não se concebe o exercício da gestão sem a presença desta habilidade.

Muito se falou e se escreveu sobre como desenvolver esta habilidade, agora considerada gerencial: o acordo ganha, os estilos de negociação que facilitam (ou dificultam), estratégias e táticas etc. No entanto, nunca é demais salientar a ocorrência de alguns erros básicos nos processos de negociação que impedem o encontro de soluções adequadas. São elas:

Acreditar na argumentação pura e simplesmente – É normal que consideremos, durante um processo de negociação, que nossos argumentos são poderosos e imbatíveis. No entanto, não é a nós mesmos que nossos argumentos devem convencer, e sim ao nosso interlocutor. Mais ainda, para cada argumento apresentado, nosso interlocutor tem pelo menos dois para rebatê-lo, que ele também acredita serem imbatíveis.

Pressionar o interlocutor ou subestimá-lo – Neste caso, a questão é muito simples, pois se imagina que pressionando o interlocutor ele cederá, quando o efeito é exatamente o contrário: quanto mais pressionado maior sua defesa e portanto maior a dificuldade de se chegar a um acordo. Da mesma maneira, acredita-se que o interlocutor não tenha argumentos, resistência e nem armas para nos pressionar.

Não estar disposto a ceder, não formar o nós – Pode-se comentar este erro por meio da própria definição de negociação: processo pelo qual as partes se deslocam de suas posições inicialmente divergentes a um ponto no qual possam alcançar um acordo. Se nós vamos ou queremos negociar precisamos abrir mão de nossas posições para formar uma terceira, que não é a nossa nem a do nosso interlocutor, mas uma posição onde o acordo é confortável para os dois. Se nós não temos esta atitude estamos fazendo qualquer outra coisa, menos negociando.

Demonstrar triunfo ao final – Este parece um erro básico e infantil, no entanto ainda muito freqüente. Óbvio, ninguém gosta de saber que foi vencido ou que poderia ter saído do processo com mais algumas vantagens que não conseguiu. A reação do interlocutor a este comportamento pode ser a retomada do processo e o suposto final se transforma em um novo começo de discussão.

Participar sozinho de negociações complexas – Mais pessoas sempre ajudam no momento das negociações complexas, sempre nos sentimos mais fortes e apoiados na presença de outros, isto algumas vezes também faz com que nosso interlocutor nos veja de outra maneira. No entanto a fase de preparação e de acertos entre os parceiros é fundamental. Cada um deve saber o que fazer, como e quando fazer. Parceiros mal acertados podem significar fracassos na negociação.

As dicas poderiam continuar, no entanto a habilidade de negociar não se desenvolve apenas com leituras e muito menos por meio de dicas. O pretendente a desenvolvê-la deve, antes de tudo, fazer um exame de auto-conhecimento e levantar seus pontos reconhecidamente positivos e negativos em relação a esta habilidade. O processo de desenvolvimento se dá fundamentalmente por intermédio de workshops e seminários onde a simulação e o feedback sejam a metodologia central do trabalho. Sem saber como cada um é durante a negociação, e como faz para negociar dificilmente se pode desenvolver adequadamente tão complexa habilidade. Por fim, a leitura sempre apóia a aprendizagem, porém não pode ser considerada a peça central do processo de desenvolvimento.

Luis Felipe Cortoni, professor do Instituto Vanzolini (USP) e sócio-diretor da LCZ Desenvolvimento de Pessoas e Organizações.

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