A oportunidade, na necessidade



Prestes a completar cem anos, a Camisaria Colombo é o reflexo na prática do aumento das classes de consumo no Brasil. Fundada em 1917, a empresa deu um salto empresarial quando em 1990, ao abrir a segunda filial,acabou ampliando seu share, mas com objetivo de atender uma necessidade de fluxo de caixa. Focada na classe A, decidiu apostar em uma promoção para quitar os fornecedores da segunda loja, em um shopping tradicional da capital paulista, provocado pelo atraso na inauguração. O primeiro passo foi negociar com os fornecedores. Mas o que deu resultado foi reduzir margens e fazer ofertas convidativas para recuperar o tempo perdido. Como resultado, o movimento da loja quadruplicou. “Tivemos a percepção de que vendendo mais barato teríamos um giro maior. Foi quando adotamos a estratégia de vender um produto de qualidade com um preço justo, e assim ampliamos nosso share”, conta o presidente Paulo Jabur Maluf, que divide o comando da empresa com o irmão Álvaro Jabur Maluf Jr.

A político do “preço justo” acabou se transformando na plataforma de crescimento da companhia. E a rede não parou mais de crescer, associando uma política agressiva e apostando em novas classes, como o aumento da classe C. Hoje, são 250 lojas espalhadas por 120 cidades, com crescimento médio nos últimos 20 anos de 35%. E deve encerrar 2011faturando R$ 500 milhões. E a perspectiva é chegar em R$ 1 bilhão até 2014, 2015. Para Maluf, esse é o grande momento do varejo, que tem um mercado interno estruturado e forte. “São cerca de 20 a 30 anos pela frente que teremos para explorarmos esse cenário”, explica. Porém, para seguir nesse ritmo a Colombo aposta na entrega de serviços de valor agregado, além de investir fortemente em ações para conhecer melhor o cliente. Para ele, o cliente brasileiro é muito inteligente, sabe o quer e, se não for bem tratado, dá o recado deixando de comprar. “Quem não entende isso, fica sem cliente”, completa. Nessa entrevista exclusiva, Paulo Jabur Maluf fala sobre a transformação pela qual a camisaria passou desde que assumiu a direção, e revela os planos para se manter na ponta do mercado, inclusive o interesse em entrar no mercado de capitais.

Como nasceu a Colombo?
A empresa foi fundada em 1917 pelo meu avô. Ele era imigrante, e quando chegou ao Brasil foi trabalhar em lavoura de café. Como perfil de varejo, já que o comércio estava em seu sangue como todo libanês, decidiu abrir seu próprio negócio.O interessante é a perpetuidade. Já estamos na terceira geração.

Como é dividir o comando da empresa com o irmão?
Sou engenheiro formado pela Escola Politécnica da USP, enquanto meu irmão é economista pelo Mackenzie. Isso faz bem para o negócio, porque tenho um perfil mais técnico e ele mais de marketing. Foi uma soma importante, que acabou gerando uma união harmoniosa. Mas entramos na empresa ainda antes de nos formar. Nosso pai sempre teve uma visão interessante de que os jovens têm um DNA de crescimento. Ele soube delegar essa visão e administrar a nossa ansiedade. Foi um grande empreendedor que soube acreditar nos potenciais dos filhos. E saber delegar é uma virtude importante. O grande empreendedor delega para a pessoa certa. Na época eu tinha 19 anos e possuía procuração de tudo da empresa. Isso te dá uma responsabilidade. Claro que também havia cobrança, mas era bem tranquila. Ele acreditou no nosso potencial e os negócios fluíram. No momento o meu filho e o do meu irmão estão com onze anos. Acho que a continuidade do negócio é ruim de travar, mas é preciso que seja algo natural.

Mas no começo a Colombo fabricava os produtos?
Não, a empresa já nasceu fazendo comércio, ou seja, comprando e vendendo produtos. Essa é a nossa essência. Só que no começo meu avô buscava o público A. Acredito que de maneira inteligente, pois maximizava a receita. É muito melhor agregar valor ao produto e vender mais caro quando se tem apenas uma loja. Depois teve a segunda geração até 1985, quando meu pai comprou a parte do meu tio e chamou meu irmão e eu para ajudar nos negócios. Foi quando começamos a expansão com a abertura da primeira filial em 1990, no Shopping Ibirapuera. Foi um grande desafio, pois se algo desse errado, você comprometeria 50% do negócio. Mas foi um marco. Ali houve a identificação da oportunidade de mercado que tínhamos, sem a abrangência do tamanho que ela teria no futuro.

Houve uma mudança de público-alvo?
Hoje,trabalhamos com um share maior. Caso contrário, não daria para chegar a 250 lojas, como temos atualmente. E queremos expandir para 1500, o que, segundo o Ibope, é possível com o share que estamos trabalhando. Você fica limitado ao focar apenas na classe A. Natural que seja interessante, mas ela possui um crescimento menor. E é um mercado muito mais difícil de atuar, exigente e infiel. Ele é totalmente vulnerável. Não está preocupado com o preço, mas com o que está na moda.Essa mudança também foi um pouco casual. No momento de abertura da loja, tínhamos programado o pagamento das mercadorias que havíamos comprado. Porém, com o atraso na inauguração do shopping, tivemos que negociar com os fornecedores que entenderam a nossa situação. Porém, meu irmão estava ansioso em recuperar o tempo perdido e sugeriu diminuir a margem de lucro. Se antes comprávamos por 10 e vendíamos por 40, passamos a vender por 20. Como resultado, o movimento quadruplicou. Tivemos a percepção de que vendendo mais barato teríamos um giro maior. Foi quando adotamos a estratégia de vender um produto de qualidade com um preço justo. Nossa marca está muito fundamentada nesse princípio. Claro que ainda temos penetração no público A, mas não é mais o nosso share. O nosso foco é a classe B e C, mas temos penetração até a E, porque criamos condições de fluxo de pagamento para qualquer um poder comprar.

Essa mudança foi também na matriz?
Desde o começo, com a primeira filial, decidimos praticar uma política de preço único. Foi uma grande ideia que fez o negócio crescer e ter uma boa aceitação. Foi assim no Centro Empresarial, Center Norte, Shopping Butantã, West Plaza e assim por diante. No momento estamos presente em quase todo o território nacional, com exceção de Piauí e Acre. São 120 cidades. E a nossa política continua a mesma. É natural que uma camisa para chegar ao Amazonas deveria ter uma diferenciação no preço, principalmente por causa do frete, mas entendemos que isso é irrelevante frente ao respeito ao consumidor.

Qual o resultado na prática dessa mudança?
Nosso crescimento médio nesses últimos 20 anos foi de 35 % ao ano. Uma loja nossa tem o retorno em praticamente três anos. É natural que teve muitos momentos de crise. Quando você está com processos de expansão, a crise te afeta um pouco mais, inibindo o crescimento. Tem anos que é preciso ser mais conservador, em função do menor apetite de crédito. O Brasil agora está bem estável, mas teve flutuações ao longo desse período, inclusive vários planos econômicos. Apesar de que nossas grandes fases de crescimento vieram diante dos planos econômicos, principalmente do Luiz Inácio Lula da Silva. O Brasil despontou na mão dele. Podemos ver um crescimento bem acentuado, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. Teve momentos que vimos o nosso ticket médio caindo e nos preocupávamos. Mas quando olhamos as operações uma a uma, identificamos uma grande demanda por peças de menor valor. Ou seja, era a classe C emergente comprando com mais agressividade. Isso deu sustentação ao nosso crescimento. É interessante ver que a população que era teoricamente jovem está virando uma população ativa, entrando no mercado de consumo. São cerca de 20 a 30 anos pela frente que teremos para explorarmos esse cenário. Por isso, digo que esse é o grande momento do varejo, que tem um mercado interno estruturado e forte. Esse ano devemos faturar em torno de R$ 500 milhões. A perspectiva é chegar em R$ 1 bilhão até 2014, 2015. É um crescimentos tangível, mas que pede um suporte de funding adequado. E a maneira correta é ter um parceiro que solidifique essa fase. Por isso, queremos entrar no mercado de capitais.

Esse cenário também traz novos desafios como a concorrência.
Em termos de moda masculina, temos uma grande penetração nacional e um dos maiores volumes de venda de peças. E como em todo negócio, o que é bom é copiado. É natural que tenha concorrência. Nossa vantagem é que são poucos os players que possuem a grande escala e quantidade de lojas que temos. Isso é o que nos dá apetite para abrir a oportunidade de ter o ingresso de um sócio, visando fortalecer o negócio e acelerar o crescimento. Dessa forma, nos posicionamos melhor, não dando espaço para a concorrência absorver o mercado. Somos do tempo em que haviam poucos shopping centers. Agora estamos falando de uns 400 no Brasil. Acompanhamos esse crescimento de perto. Porém, quando não nos posicionamos em alguns shoppings, demos espaço para uma eventual concorrência entrar. Por isso, é preciso ter uma base sólida para inibir o crescimento da concorrência.

Podemos dizer que a fidelização do cliente se torna ainda mais importante?
O cliente brasileiro é muito inteligente, sabe o quer e, se não for bem tratado, vai dar o seu recado deixando de comprar. Quem não entende isso, fica sem cliente. E mais, você não pode tê-lo momentaneamente, mas ao longo de sua vida. Diante disso, a Colombo busca vender desde sapato até perfume, além de oferecer serviços de alfaiataria, seguro, crédito por meio do nosso cartão. Aceitamos até pagamento de água, luz, telefone e boletos bancários. Criamos um mix de produto e serviços para gerar um valor agregado.

Também estamos presente em todas as mídias possíveis. Porém, quando você vai para as mídias tradicionais, eu posso até atingir o público, mas não é algo tão direcionado. Elas demonstram a ineficiência da capacidade de gerir o teu perfil de cliente. Por isso, estamos investindo em CRM. Nós capturamos informações para poder fazer as ofertas certas. Isso já virou uma cultura nossa. Hoje, a grande sacada para fidelizar é saber identificar o teu público e fazer o marketing direcionado.

Como o Sr. vê o e-commerce?
Temos loja virtual, mas não somos tão agressivos na internet. Primeiro queremos conhecer melhor o mercado, deixar ele amadurecer um pouco mais, ter todas as políticas bem alinhadas, para não errarmos. Nossa filosofia é de que quando vamos fazer algo, tem que ser bem feito. E a venda pela internet é mais sofisticada. Você tem que identificar o produto, a cor, o tamanho, saber exatamente o que o cliente escolheu e fazer o pedido chegar a casa dele. O brasileiro é mal acostumado nesse ponto. No exterior, a política de entrega é de uma semana. Aqui no Brasil, se passou de dois dias, o cliente já fica de mau humor.De qualquer forma, temos um grande volume de vendas on-line. O faturamento médio de uma loja gira em torno de R$ 150 mil. Nosso e-commerce fatura 20% a mais do que isso. Mas é um mercado em que podemos amadurecer mais. Agora, considero complicado ter um blog ou rede social e delegar isso para alguém cuidar. Essa pessoa precisa ter o DNA da empresa, alguém que saiba o que você pensa, e não um ponto de vista pessoal. A mesma coisa vale para o Serviço de Atendimento ao Consumidor. Nós demoramos muito para implantar um porque tinha que ser algo que funcionasse. Você precisa resolver, ou é melhor não ter o canal. E para isso é importante que a pessoa que está na ponta do relacionamento tenha as visões dos acionistas bem alinhadas. Precisa estar próximo, se não de mim, tem que ser da área responsável.

Há a possibilidade de internacionalização do negócio?
Temos essa perspectiva. Vejo com bons olhos a América Latina, com países importantes como Argentina, Chile, Bolívia. São mercados que tem share, mesmo que não seja para ter 10 lojas, mas pelo menos duas ou cinco. Porém, antes precisamos fazer a lição de casa. Ainda temos muito que crescer aqui no Brasil. O mercado internacional interessa, mas não é o momento.

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