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O desafio estratégico entre o 0800 e o 0300

A substituição do 0800 pelo 0300, motivada por pressões de redução de custos com telefonia, está criando um novo diferencial competitivo na prestação de serviço ao cliente. Conseqüência da retração econômica, a medida tem despertado polêmicas e revoltas da parte dos consumidores que, com o Código de Defesa do Consumidor, estão se acostumando a correr atrás de seus direitos. O assunto é delicado e algumas empresas têm evitado comentar as razões que as levaram a transformar um importante canal de comunicação com o cliente – que originalmente era gratuito – em serviço pago.
Pelo 0300, o minuto de ligação custa R$ 0,27, no telefone fixo, e R$ 0,50 pelo celular, além do imposto. É óbvio que o consumidor que deseja fazer uma reclamação ou encaminhar alguma sugestão à empresa sente-se injustiçado ao ter de pagar por esse telefonema. Até porque não faz muito tempo que o 0800 apoiou toda uma campanha de marketing de relacionamento, fortalecendo a cultura da excelência no atendimento, cada vez mais consciência da sua importância para os negócios das companhias que oferecem produtos ou serviços.
Não raro, polêmicas desta natureza nascem carregadas de emoções poderosas e cheias de contradições. Um sinal do possível impacto na relação dos clientes com algumas empresas pode ser avaliado nas reclamações divulgadas pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor (Idec), em matéria veiculada no mês de junho. É o caso de um consumidor que teve de pagar longos interurbanos para resolver o problema de um produto defeituoso adquirido num portal de comércio eletrônico, a situação de uma pessoa que usou o 0300 para comprar uma passagem aérea e, após dez minutos de espera sem resposta, teclou o número para reclamações e foi informada, em dez segundos, que o sistema estava fora do ar e que não havia previsão de retorno. E também o inconformismo de um empresário que não acha certo a empresa conquistar o cliente e depois alterar as condições do serviço prestado.
Unimed – De 1999 até o mês de abril deste ano, a Unimed-Rio manteve o benefício do 0800 para os seus 380 mil clientes. Virgínio Sanches, superintendente de comunicação corporativa da empresa, introduz a justificativa para a adoção do 0300 falando sobre as dificuldades encontradas pela Unimed para repassar seus custos à mensalidade dos seus filiados:
“A Unimed é um conjunto de 364 cooperativas médicas reunidas numa confederação nacional, e cada uma é independente. Com a regulamentação do setor de planos de saúde, a partir de 98, os índices de reajuste passaram a ser inferiores à realidade de custos das empresas. Nos últimos três anos, a defasagem acumulada entre os custos da Unimed-RJ e as condições de mercado é de 22%. Isto fez com que reduzíssemos custos para manter a cooperativa equilibrada, inclusive porque somos uma cooperativa médica e não temos objetivo de lucro, mas sim de gerar benefício para o associado.”
Virgínio esclarece que foi contratada uma consultoria para se encontrar uma solução. Descobriu-se que o 0800 não era totalmente utilizado por pessoas que necessitavam do serviço. “Muita gente ligava à noite para conversar. Estava com o guia na gaveta e ligava sem muito compromisso com o custo, mas a Unimed pagava sem conseguir transferir esse custo para a mensalidade”, conta o superintendente, informando que os gastos mensais com o serviço eram de R$ 400 mil.
No balanço final, a adoção do 0300 pela Unimed-RJ trouxe sensível redução no volume de ligações (de 140, 150mil/mês para 120, 130 mil/mês) e no tempo de espera da ligação, e o call center passou a atender com mais agilidade (hoje o tempo médio de atendimento é de 3 minutos).
“O cliente Unimed liga em média de uma a duas vezes por ano. A cooperativa do Rio de Janeiro representa o maior faturamento do sistema. Mas existem outras Unimed que ainda mantêm o 0800. É claro que para uma empresa que presta serviço a pior coisa é interferir no benefício oferecido ao cliente, mas esse é um processo meio inevitável. Talvez a grande questão seja colocar isso para o mercado de telefonia; as operadoras terão que descobrir um outro mecanismo mais dentro da realidade brasileira e criar um produto mais barato”, sugere Virgínio, que ultimamente tem discutido o assunto com diversos formadores de opinião.
Submarino.com – Um dos empreendimentos de comércio eletrônico mais bem-sucedidos no mercado nacional, o Submarino.com é outro exemplo de negócio que migrou para o 0300. Peter Furukawa, diretor comercial e de marketing da loja virtual, assegura que a mudança não resultou em reclamações dos usuários. “O 0800 vinha recebendo muitos trotes e cantadas, o que estava representando de 15% a 20% das ligações. Com o 0300, o consumidor tem ciência de que não deve usar o telefone para falar bobagem, inclusive porque é ele que está pagando”, observa o executivo.
A mudança trouxe uma economia de R$ 25 mil por mês à empresa, cuja central de atendimento recebe de 300 a 400 ligações diárias. O cliente do Submarino.com dá preferência ao chat quando quer fazer contato, já que a internet possibilita as mesmas facilidades de um atendimento telefônico, com a vantagem de não ser preciso desconectar o computador.
A Vasp também colocou o 0300 na sua Central de Reservas e Informações no ano passado. De acordo com a sua assessoria de imprensa, essa é uma tendência de mercado, e o Serviço de Atendimento ao Cliente (SAC), que mantém o 0800, já foi concebido (em 96) como um canal de comunicação entre a empresa e o seu cliente cativo. Por isso, o 0800 (704-7887) é divulgado no bilhete de passagem e nas lojas, e não no site da companhia.
“A empresa encara o 0800 como um pós-venda, sendo que muita gente costuma usar o SAC para pedir informações. Já quem usa a Central de Reservas tem demanda específica. O 0300 é vantajoso para quem fala de fora, de outras localidades. Na verdade, as companhias já vêm colocando o 0300 há algum tempo”, alerta a assessora de imprensa da Vasp.
A TAM Linhas Aéreas é outra empresa do segmento de aviação que acompanhou essa tendência de mercado, incorporando o 0300 para suas áreas de Reserva e Cartão Fidelidade (milhagem). Entretanto, conserva o 0800 (123-200) para o Serviço de Atendimento ao Consumidor, destinado a receber sugestões e reclamações dos clientes, e que é mais conhecido pela denominação “Fale com o Presidente”.
Americanas.com, Shoptime, DirecTV, Sky, Viação Itaperimim e Viação 1001 são algumas das demais companhias que adotaram o 0300, para surpresa de muitos consumidores. Tal medida foi detectada pela Fundação Procon a partir do mês de abril, e pode dar margem a uma prática abusiva se confrontar com certos direitos já conquistados.
Sem ferir o CDC – “Existem vários momentos a serem apreciados. Se a empresa usou o 0800 de maneira agressiva, como forma de venda, de marketing para atingir o público, e isso fizer parte do contrato, a mudança para o 0300 é uma prática abusiva, conforme o artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor”, afirma José Carlos Guido, assessor técnico da diretoria executiva do Procon São Paulo.
Se o 0800 estiver vinculado ao contrato comercial da empresa, o consumidor não deve pagar pela ligação que irá fazer para encaminhar qualquer tipo de reclamação. Assim, a empresa não pode adotar o 0300 como telefone de reclamação.
“O 0800 estava embutido no custo das empresas, mas elas não querem mais arcar com isso. Para o Procon, não se pode generalizar mas sim estudar caso a caso. Por outro lado, o poder estatal não pode interferir nessa prática comercial. Por isso, o Procon aconselha o consumidor a não comprar por impulso e a prestar mais atenção ao momento pré-contratual. O juízo de valor, a escolha, quem deve fazer é o consumidor”, reforça José Carlos, lembrando que é muito incômodo para o poder público interferir na relação comercial, no caso de burla ao CDC.
Decerto, não serão todas as organizações que irão eliminar o 0800 de suas relações com o público. O crescimento do número de companhias que estão fazendo a transição para o 0300 ainda é um fato recente, e bem pode ser compensado por alguma nova medida que venha a surgir. Enquanto isso não acontece, quem oferecer o 0800 terá um diferencial competitivo de valor muito maior à percepção dos seus clientes.

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