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Universidade corporativa. Modismo ou uma excepcional oportunidade?

A partir da década de 50, nos Estados Unidos, as grandes e pequenas empresas formaram grupos para ensinar a trabalhadores profissionais como fazer seu trabalho melhor. Essas infra-estruturas organizacionais proliferaram por todo aquele país e ficaram conhecidas como universidades e institutos corporativos. A motivação inicial delas então era manter os empregados à frente das tendências do mercado. Essas universidades espalharam-se dentro das empresas e hoje já são mais de 3000 em todos os Estados Unidos.
 
Atualmente, a missão das UCs é desenvolver competências críticas, buscando o aumento da vantagem competitiva das empresas, sendo uma de suas finalidades principais, reter os empregados, ou seja, reduzir o fantasma do turnover (nos EUA, estudos feitos pelos departamentos de RH das empresas indicam que 50% a 60% de todos os novos empregados deixam o emprego nos primeiros sete meses). O fato é que, mantida a atual taxa de crescimento, estima-se que, em 2010, o número de UCs nos Estados Unidos ultrapassará a quantidade de universidades tradicionais existentes naquele país, tornando-se o principal veículo de educação de estudantes pós-secundário.
 
“No Brasil, essa tendência está aumentando a cada dia, à medida que as empresas começam a perceber a necessidade de repensar seus tradicionais Centros de Treinamento e Desenvolvimento, de modo que possam contribuir, com eficácia e sucesso, para a estratégia empresarial, agregando valor ao resultado do negócio.” (Eboli, 2004). No Brasil, algumas iniciativas nessa direção surgem a partir dos anos 90. Vejamos um pouco sobre o que de fato são UCs  e qual o impacto delas no setor de Telesserviços.
 
Inicialmente, devemos associar três macrocontextos: primeiro, o desenvolvimento da cultura de serviço orientada ao cliente e o crescimento do setor de serviços, cuja maioria dos profissionais é marcadamente composta por jovens sem experiência; segundo, o analfabetismo funcional de 75% de nossa população, que, ainda com ensino médio completo, apresenta deficiências cognitivas e de comunicação básica assustadoras, impondo às áreas de recrutamento e seleção uma realidade de mercado que induz à contratação de pessoas mais e mais qualificadas ante uma mesma realidade educacional com enormes lacunas de aprendizagem; e terceiro, as margens, cada vez mais reduzidas, impostas pelos tomadores de serviço, criam uma equação de difícil solução: como reter pessoas, desenvolver uma operação de qualidade e ser competitivo?
 
Algumas empresas decidiram adotar a velha fórmula do auxílio-educação, ou bolsa, para criar planos de incentivo à elevação de escolaridade.  Por mais louvável que seja a iniciativa dessas empresas de subsidiar o acesso a cursos superiores para seus empregados, podemos chamar isso de Universidade Corporativa? Como veremos, diversas são as diferenças que as afastam; dentre elas, destacaremos quatro: Qual  o currículo de uma UC? Quem são os educadores da UC? Qual a diferença entre a UC e um Centro de Treinamento? Como medir ROI (return on investment) dos programas de desenvolvimento?
 
Primeiro vamos falar do currículo básico de uma UC. A estrutura curricular proposta por Jeanne Meister, autoridade mundial no tema, é composta por três amplas áreas, denominadas de os três Cs. São elas:
 
 Cidadania Corporativa – Incute em todos os níveis de empregados a cultura, os valores, as tradições e a visão da empresa. Nesse conceito de cidadania está implícita uma forte identificação com a empresa em que se trabalha e seus valores centrais. Para tanto, estão treinando seus empregados formalmente nos valores, cultura, tradições que só aquela organização possui e nos comportamentos específicos que os empregados precisam demonstrar para “viver de acordo com aqueles valores” no emprego. Uma das maneiras de despertar interesse pela cultura de uma organização é usar metáforas. Elas são poderosas porque as pessoas as usam para representar pensamentos implícitos e subentendidos.
 
 Estrutura contextual – Oferece a todos os empregados uma noção dos negócios da empresa, seus clientes, concorrentes e as melhores práticas dos outros. Os empregados adquirem um conhecimento sólido das características e dos benefícios e serviços da empresa; como ela ganha dinheiro, como seus negócios se comparam aos da concorrência e, o mais importante, como aprender com as melhores práticas de empresas de primeira linha que determinam os padrões de excelência dentro do mercado.
 
 Competências básicas do ambiente de negócios – Desenvolvem um conjunto de competências específicas para o negócio da organização, as quais definem a vantagem competitiva da empresa.
 
As competências básicas comuns identificadas pelas empresas estudadas por Meister, 1999, são:
 
o Aprender a aprender;o Comunicação e colaboração;
o Raciocínio criativo e resolução de problemas;
o Conhecimento tecnológico;
o Conhecimento de negócios globais;
o Desenvolvimento de lideranças;
o Autogerenciamento da carreira.
 
 Qualificações híbridas – Essas qualificações combinam as competências básicas do ambiente de negócios com uma profunda experiência empresarial em diferentes áreas funcionais. Em outras palavras, o atendente também precisa de fundamentos de marketing e vendas assim como economia, geografia e finanças para trabalhar em uma equipe multifuncional. O atendente de uma operação de empresa aérea deve entender tanto de vendas quanto de geografia, pois não adianta saber técnicas de atendimento e confundir as capitais dos estados. A imagem para o cliente é uma só.
Conseqüentemente, precisam ser versados em várias habilidades híbridas e polivalentes, que se sobrepõem. Só pelo currículo já é possível notar que boa parte do dever deve ser feito em casa, ou seja, dentro da empresa.
 
Quem são os educadores da UC? – Mais do que educadores, são parceiros de aprendizagem, que variam desde instrutores, gerentes de unidades de negócios, docentes de universidades, consultores, com freqüência, a alta cúpula, inclusive o presidente, que, em média, dedica 2 dias do mês à UC, segundo estudo feito pela Corporate University Exchange, maior instituto de pesquisa no tema.
 
Qual a diferença entre a UC e um Centro de Treinamento? – Resumidamente, podemos perceber na tabela abaixo a mudança de paradigma entre um Centro de Treinamento e uma UC, desde o objetivo até o resultado.
 
Outro ponto fundamental é medir resultados. Qual o ROI dos programas de desenvolvimento? – Possuir uma Universidade Corporativa não significa extinguir a área de treinamento. Ambos subsistemas podem coexistir. No modelo tradicional, a avaliação dos cursos está relacionada à satisfação dos alunos, às opções de cursos e às cargas horárias. Hoje, o novo diretor de aprendizagem precisa criar experiências de aprendizagem incorporadas ao trabalho, que atendam as necessidades empresariais vitais e resulte em melhor desempenho no trabalho. Esse novo diretor é o dirigente da Universidade Corporativa. Para que se possa avaliar a efetividade de qualquer programa da UC, deve-se, segundo Donald Kirkpatrick, avaliá-lo em 4 níveis, são eles:
 
Nivel 1 – Avaliação do participante ou avaliação de reação: o participante gostou do programa?
 
Nível 2 – Aquisição de conhecimento/qualificações: o participante consegue passar por uma avaliação sobre o assunto?
 
Nível 3 – Transferência para o trabalho: ele aplicou o que aprendeu?
 
Nível 4 – Retorno sobre o investimento: a nova qualificação está economizando ou gerando receita para a organização?
 
Já se fala em um quinto nível, em que se compara o impacto gerado pelo treinamento versus o investimento realizado para se obter esse impacto. Esse seria o ROI de qualquer programa de desenvolvimento, seja na UC ou em um Centro de Treinamento.
 
Esses são apenas alguns dos elementos de um programa de educação corporativa, conhecido como Universidade Corporativa. Apesar desses conceitos estarem disponíveis há algum tempo, reduzir a Universidade Corporativa  a um mero incentivo à elevação de escolaridade dos empregados é, no mínimo, desconhecer os conceitos básicos de educação corporativa.
 
A partir dessas premissas, o setor de serviços ao cliente como um todo possui uma oportunidade ímpar de conciliar lucro com desenvolvimento social, agregando – muito mais do que um benefício à elevação de escolaridade – crescimento sustentável a um dos setores que mais empregam aquele que poderá mudar a sociedade, o jovem. Não adianta elevar a escolaridade, sem elevar a empregabilidade de forma ampla. A esperança é que o setor de serviços ao cliente perceba, com maturidade, a oportunidade estrutural que se configura e como transformar um problema num modelo sustentável assentado sobre três vértices: pessoas, empresas e sociedade, onde toda a cadeia ganhe.
 
Gualtiero Schlichting Piccoli é vice-presidente da Associação Horizontes e Diretor Executivo do Instituto Habilitare, formado em administração pela UDESC-ESAG, com mestrado sobre o “Impacto de uma Universidade Corporativa em uma Central de Atendimento a Clientes”, pela UFSC.  E-mail: [email protected]
 
Bibliografia :
 
MEISTER, J. C. Educação Corporativa. São Paulo: Pearson Makron Books, 1999.
TEIXEIRA, A. Universidades Corporativas X Educação Corporativa. Rio de Janeiro: Qualitymark, 2001
EBOLI, M. A educação corporativa no Brasil: mitos e verdades. São Paulo: Gente, 2004.
GDIKIAN, E, A.; SILVA. M. C. da. Educação estratégica nas organizações. Rio de Janeiro: Qualitymark. 2001.

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