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Você era feliz e não sabia… – Memórias de um sargento, parte IV


Duas coisas que aprendi na vida sobre retenção de clientes. A primeira é que ninguém gosta de se sentir abandonado, enganado ou, para ser bem explícito, um otário. E quando você se torna cliente de uma empresa, de uma loja, de uma marca, significa que você foi mais do que convencido racionalmente a adquirir um produto ou um serviço, você foi conquistado, de alguma forma trocou o bem da empresa ou da loja ou da marca por uma quantidade de emoção que possuía anteriormente. E que certamente prezava.

Na minha época de Gradiente, quando entre outras milhões de responsabilidades cuidava do relacionamento com os clientes, dava um trabalho enorme impedir os técnicos que trabalhavam diretamente comigo tratar como idiota o consumidor que acabara de comprar um Esotech, que era o topo da linha de áudio na época, e não conseguia colocar os cabos nos plugues certos. E, na maioria das vezes, bastava ser polido, simpático, atencioso… e claro. Até porque parte da culpa é daqueles infernais manuais, escritos por técnicos, para técnicos.

A segunda coisa que aprendi foi que é possível recuperar aquela emoção da compra e dos usos iniciais de um produto. Mais uma vez, basta ser polido, simpático, atencioso… e franco. A primeira vez que coloquei esse raciocínio em prática ainda estava na Ogilvy, ou seja, lá pelos inícios dos anos 80. O cliente era o Jornal do Brasil. Eles estavam mudando o sistema de logística de jornal e, por conta de alguma bobagem, passaram sistematicamente a deixar de entregar milhares de jornais aos assinantes. Que reclamaram, e nada. Que espernearam, e nada. Até que finalmente cancelaram a assinatura. Aí, o desespero bateu e a empresa correu em busca de ajuda.

O desafio era considerável: os ex-assinantes estavam não exatamente com raiva, estavam possessos. Em compensação, os problemas, garantiram-nos o pessoal do JB, já havia sido completamente sanado, isto é, podíamos prometer, assegurar, garantir, jurar até, que os jornais voltariam a ser entregues todo dia, sem falta, antes do café da manhã do leitor. Isso era bom, o ruim é que o ex-assinante certamente não acreditaria, pois a empresa passara semanas enrolando-o com promessas semelhantes.

A solução foi voltar a entregar os jornais, durante uma semana, sem custo para o ex-assinante. Mandaríamos antes uma carta, anunciando aquela entrega sem compromisso, e durante a semana enviaríamos outras comunicações, reforçando a volta da qualidade do serviço e sugerindo a volta da assinatura.

Havia um obstáculo adicional: as pessoas estavam tão irritadas que poderiam simplesmente se recusar a receber o jornal, pondo a perder todo o esforço. A carta inicial, portanto, tinha um papel crucial. E realmente fez a diferença. O texto começava assim: “Prezado ex-assinante, Em primeiro lugar, permita-me dizer que, no seu lugar, eu faria a mesma coisa: cancelaria minha assinatura do Jornal do Brasil.” O tom da carta foi esse do início ao fim: havíamos errado, compreendíamos a reação dele, mas já havíamos consertado o problema (que era explicado em detalhes – a carta tinha 4 páginas), e não queríamos que ele simplesmente acreditasse nisso, tanto assim que a partir do dia seguinte ele voltaria a receber seu JB em casa. A carta não tinha nenhum apelo comercial, nenhum call-to-action, incitando-o a voltar a assinar o jornal. Para nossa surpresa, entretanto, mal a carta chegou aos destinatários, eles começaram a ligar e renovar sua assinatura. No final da campanha, o JB havia conseguido recuperar quase todos esses ex-assinantes. E pesquisas demonstraram que o dano à imagem havia sido praticamente eliminado.

Até a próxima.

Fernando Guimarães é consultor especializado em marketing de relacionamento e marketing direto, e sócio-diretor de planejamento e criação de programas de relacionamento da M4R/AGS BRASIL. Seu e-mail é [email protected]

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