Autor: Frederico José Straube
Em 26 de maio do corrente, foi sancionada a lei em epígrafe, alterando a Lei 9.307/96 que regula a arbitragem no Brasil. É necessário dizer que quando o Presidente do Senado nomeou uma comissão especial para cuidar de rever a Lei de Arbitragem brasileira, houve da parte da comunidade arbitral manifestações de preocupação. Tendo em vista que a realidade demonstrava que a arbitragem estava funcionando muito bem no país. Com efeito, desde a edição da lei 9.307 este tipo de procedimento de justiça privada evoluiu muito. Em pouco mais de uma década o Brasil passou a gozar no concerto internacional de grande credibilidade no manejo da arbitragem.
O anteprojeto de lei resultante do trabalho da já referida comissão de juristas apresentou, porém, alta qualidade, na medida em que se ocupa de alterações pontuais da lei em vigor, a grande maioria delas refletindo efetivamente um avanço no tratamento da arbitragem. Felizmente, o projeto foi aprovado pelo Congresso sem qualquer alteração em relação ao texto proposto. Somente na etapa derradeira, ou seja, por ocasião da sanção presidencial sofreu três vetos.
Objetivamente, vamos passar a examinar brevemente as mudanças introduzidas pela lei e seus efeitos práticos. A primeira alteração e mais importante diz respeito à autorização para que entidades estatais, inclusive da administração direta dos três entes políticos, união, estados e municípios, possam utilizar a arbitragem para resolver conflitos em que sejam partes relativos aos chamados direitos disponíveis. Ou seja, aqueles direitos susceptíveis de transação. Com isto, se põe fim a uma celeuma doutrinária a respeito da possibilidade ou não de tais entes valerem-se da arbitragem.
Na sequência, estipula previsão de suma importância quando prescreve que a instituição da arbitragem interrompe a prescrição de direitos, retroagindo seus efeitos à data do requerimento do procedimento. Esta disposição é muito relevante, pois esclarece matéria de interpretação tumultuada na seara da preservação de direitos.
A nova lei cria um instrumento de comunicação entre os juízos arbitrais e os juízos e tribunais estatais, denominado Carta Arbitral. A providência revela-se de grande interesse prático e patenteia, por outro lado, a inserção definitiva da arbitragem no universo das alternativas de solução de conflitos aqui no país. Mencione-se o fato que instrumento semelhante já constou do novo Código de Processo Civil, lei 13.105/15. Outro aspecto relevante a ser ressaltado é que o novo diploma legal institucionaliza uma prática que já vinha sendo adotada, através de previsões nos regulamentos da grande maioria dos Centros de Arbitragens que é a possibilidade do juízo arbitral emitir sentenças parciais.
Ainda na sequência, deve ser aduzido que a nova lei vem corrigir um dos raros defeitos que se podia debitar ao texto antigamente vigente que era a disciplina da concessão de medidas cautelares. Valendo-se da boa prática que os Tribunais estatais vinham adotando, na espécie, regulou de forma clara e eficiente esta matéria de grande importância para as partes em litígio. Cuidou ainda o novo legislador de proteger o instituto da arbitragem e as respectivas decisões, pois inseriu redação (art.33) pela qual deixa de se constituir fator de nulidade da sentença arbitral o chamado julgamento “infra petita”. Significando que aquela decisão em que não se resolveu integralmente o conflito estampado e discutido na lide arbitral. Abriu, nos casos em que tal fenômeno ocorra, a possibilidade de que a parte interessada ingresse frente ao juízo estatal para requerer e obter a prolação de sentença arbitral complementar.
Ainda a nova lei apresenta solução que pacificará matéria que usualmente vinha se constituído em seara pródiga de conflitos e discussões intermináveis no campo da doutrina e da própria jurisdição arbitral ou estatal. Qual seja a da vinculação de todos os sócios de uma sociedade anônima à cláusula compromissória inserida nos estatutos da companhia. Pela alteração da redação do art.132A da Lei Federal 6.407/76 (Lei de Sociedades Anônimas) estabelece que a cláusula arbitral aprovada por quórum regular vincula todos os acionistas.
Reserva para o acionista dissidente a possibilidade de se retirar da sociedade, a menos que a inserção da cláusula no estatuto represente condição de admissão dos valores mobiliários de emissão da companhia à negociação em segmento de listagem de bolsa ou mercado de balcão que exija dispersão mínima de 25% das ações de cada espécie ou classe. Ou ainda no caso de se tratar de companhia aberta com ações dotadas de liquidez e dispersão nos termos da Lei de Sociedades Anônimas.
Por último, e em um dispositivo que nos parece inoportuno tangenciando inclusive à inconstitucionalidade, a lei busca interferir na organização das entidades que se dedicam à administração de arbitragem. Quando permite que as partes de comum acordo afastem dispositivo regulamentar que estabeleça que os árbitros ou pelo menos o presidente do Tribunal pertença à lista de árbitros aprovados pela instituição. Há de se salientar, por derradeiro, que a lei sofreu três vetos presidenciais, ao que nos parece, totalmente inadequados. Referem-se eles ao artigo que permitia a adoção da arbitragem como instrumento de solução de controvérsias em processos trabalhistas que envolvessem empregado de nível de direção ou gerência estatutárias, desde que a iniciativa de iniciar a arbitragem fosse do empregado ou então este concordasse com o inicio da arbitragem. Ademais dispositivos relacionados a disciplinar a arbitragem de consumo e contratos de adesão também foram rejeitados através de vetos.
Cumpre salientar que tais vetos ainda pendem de apreciação pelo legislativo, mas já se sabe que tanto forças favoráveis à rejeição dos vetos quanto aquelas que batalham pela manutenção já vem atuando em beneficio dos seus respectivos pontos de vista.
Frederico José Straube é fundador e sócio da Straube Advogados e Membro do Comitê Brasileiro de Arbitragem (CBAR)