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Até quando ser fiel a uma marca?

Todos nós sabemos que criar e consolidar relacionamentos com clientes é extremamente positivo. É o cerne das iniciativas CRM. Mas, como as empresas tem organização, cultura, métricas, estratégias de marketing e sistemas baseados na visão de produtos, cria-se uma barreira quase intransponível. Está claro que não é apenas implementando tecnologia que se transforma uma empresa focada em produtos em outra focada em clientes.

As mudanças por trás de uma transformação desta envergadura não são simples. Alguns conceitos básicos não estão perfeitamente compreendidos e mesmo quando compreendidos nem sempre estão suficientemente internalizados nas mentes e corações dos executivos e funcionários da empresa. Mudar conceitos arraigados não é uma tarefa fácil. Se os executivos não mudarem seu pensamento, a empresa não mudará.

O impacto do valor do cliente é um dos principais conceitos que precisam ser apreendidos. O valor do cliente é o total dos valores de consumo deste cliente ao longo de sua relação com a empresa. E o próprio valor de mercado da empresa é, em grande parte, influenciado pelo valor do relacionamento da empresa com seus clientes, que é a garantia de suas receitas futuras. Portanto, a criação de relacionamentos estáveis e sólidos com clientes significa muito mais que apenas aumento de vendas.

Outro conceito é que a rentabilidade do negócio nem sempre pode ser creditado à lucratividades dos seus produtos. Um mix de produtos lucrativos não é garantia que a empresa seja ou continue lucrativa. De maneira geral as empresas baseiam suas decisões de campanhas de marketing nas análises de lucratividade de seus produtos, procurando incentivar os mais lucrativos e descartar os menos rentáveis. Mas esta visão pode ser questionada. Ela não nos permite ter uma visão de longo prazo sobre clientes. Um exemplo típico é o correntista que abre uma conta corrente de pouco valor em uma instituição financeira.

Na ótica da visão de produtos, é um produto com baixa lucratividade e pouco incentivado nas campanhas de marketing. Mas na visão de clientes, se soubermos que este novo correntista é jovem, está no início de sua carreira e que à medida que constrói um relacionamento sólido com o banco provavelmente comprará novos serviços e produtos, como poupança, fundos, seguros e financiamentos, com certeza o quadro será outro. Uma estratégia de marketing que desestimule a captação destes correntistas pode gerar um problema de lucratividade a longo prazo, não criando uma futura base de clientes rentáveis.

Em supermercados também ocorrem casos similares. As cadeias de varejo, de maneira geral, focalizam-se nos produtos mais rentáveis para as lojas, e até mesmo a organização e layout das lojas é voltado a produtos, com suas divisões especializadas em laticínios, mercearia, bebidas, enlatados, carnes e assim por diante. Os segmentos de clientes simplesmente não são considerados na maioria dos layouts atuais. Desprezar o conceito de valor do cliente em detrimento de produtos pode gerar baixas significativas. Eliminação de produtos deficitários pode levar a perda de clientes valiosos. Um exemplo simples: a eliminação das gôndolas de produtos naturais pode implicar na perda de um determinado segmento de clientes, que além destes produtos, compram outros.

Mas, conhecer estes conceitos não é suficiente. As empresas tem estratégias de negócio diferenciadas e conseqüentemente estratégias de marketing que enfatizam determinados aspectos em detrimento de outros. Algumas, como fabricantes de produtos alimentícios, podem enfatizar o valor da marca, enquanto outras, como bancos e cartões de crédito, enfatizam criar e consolidar relacionamentos mais estreitos com seus clientes. Outras, adotam uma estratégia alternativa, buscando criar um valor diferenciado na percepção de seus clientes, baseado em preço e/ou conveniência. Um supermercado com slogan tipo “mais barato todo dia” e que busca abrir lojas na maioria dos bairros de uma grande cidade (conveniência de acesso) é emblemático desta estratégia. CRM não pode ser dissociado das estratégias do negócio.

Entretanto, para todas, é importantíssimo conscientizar-se do valor do cliente. O cliente pode ser fiel à marca. Mas, uma ênfase concentrada no valor da marca manterá o cliente por toda a sua vida de consumidor? Se a empresa não compreender porque o cliente compra sua marca, poderá futuramente enfrentar um novo concorrente que identifique melhor estas variáveis e ofereça maior valor, na percepção do cliente. A lógica é simples: o cliente só se mantém fiel a uma marca enquanto isto lhe for conveniente.

Uma estratégia de preço baixo também não impede que futuros concorrentes entrem no mercado com organizações mais enxutas, adotando novas tecnologias e processos, e com uma estratégia agressiva roubem seus clientes mais valiosos. As dificuldades no caminho são inúmeras. Os sistemas de informação não capturam informações que mostrem há quanto tempo o cliente está comprando com a empresa e como suas necessidades de consumo mudaram durante este tempo. As métricas e organização de muitas empresas também não adotam conceitos fundamentados em clientes.

Um exemplo típico é uma empresa de telefonia que mede o desempenho de seus atendentes de call center por produtividade, medidos por ligações atendidas por hora, fazendo-as repassarem as reclamações dos clientes o mais rápido possível, mesmo sem ter todas as informações necessárias; os chefes de equipe de manutenção medidos pela produtividade de suas equipes e com isso ele busca minimizar os deslocamentos entre atendimentos, concentrando atendimentos por proximidade geográfica; e técnicos de manutenção medidos por tempo de atendimento e portanto colocando em segundo plano a qualidade destes atendimentos. As métricas apontarão alta produtividade e atendimentos rápidos, mas o nível de satisfação do cliente, medido pela sua percepção, provavelmente será muito abaixo do esperado.

A conclusão é lógica. Para competir no futuro as empresas precisam ser redefinidas com foco em clientes. Para isso ocorrer, não é suficiente chamar um vendedor de tecnologia e adquirir a ferramenta mais poderosa e flexível. Se os conceitos básicos não estiverem perfeitamente compreendidos e internalizados; se estratégia CRM não estiver totalmente alinhada com as estratégias de negócio; e as transformações necessárias, sejam em processos, organização, métricas e cultura não forem adequadamente considerados, os resultados serão frustrantes. Será mais uma tecnologia comprada e colocada em desuso rapidamente, mas a um custo muito grande.

Cezar Taurion – IT strategist director da PwC Consulting

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