No dia 31 de dezembro, encerrou-se o primeiro Governo Lula. Como de costume, ao término de um mandato presidencial, vários balanços são feitos, tanto pelo Governo como pela imprensa. Antecipando essas análises, de forma sintética, podemos dizer que, durante esses quatro anos, houve avanços, retrocessos e manutenção da situação anterior em várias áreas da atividade governamental.
Os principais avanços ocorreram nas áreas econômica e social. No período, na área econômica, o País dobrou as exportações (de US$ 60 bilhões para US$ 120 bilhões), diminuiu sua dependência do capital estrangeiro, reduziu em três quartos a inflação (de 12% para 3%), aumentou substancialmente as reservas em moeda estrangeira (de US$ 40 bilhões para US$ 80 bilhões), zerou a dívida líquida externa do setor público, quitou as dívidas com o FMI, aprovou a nova Lei de Falências e o Estatuto da Micro e Pequena Empresa.
Além disso, amenizou a desigualdade de renda da população (medida pelo coeficiente de GINI), reduziu a mortalidade infantil, aumentou a expectativa de vida da população, elevou a renda média real do trabalhador e reduziu o índice de analfabetismo (indicadores contemplados no cálculo do índice de desenvolvimento humano – IDH). Implantou o Fundo de Desenvolvimento do Ensino Básico (Fundeb), expandiu o Bolsa-Família, reduziu ligeiramente o desemprego e aumentou a formalização do emprego. Houve também avanços nos setores de petróleo, mineração, produção de álcool combustível e fabricação de automóveis.
Os maiores retrocessos ocorreram na área política/institucional e na administração pública. Na área política, a relação entre o Congresso e o Governo se deteriorou, a composição da base de apoio do Governo foi instável e marcada pelos escândalos do mensalão. O partido do Presidente da República gerou mais estragos do que apoio ao Governo. Os principais ministros foram substituídos.
No que tange às instituições, houve tentativa de controle da imprensa por parte do Governo, as agências de regulação se desfiguraram, a relação entre os entes federativos foi tumultuada e o relacionamento com a OAB, a ABI, a CNBB, sindicatos e outros órgãos representativos da sociedade civil também sofreram desgastes. Na órbita da administração pública, cresceu o aparelhamento partidário nos cargos em comissão, o planejamento plurianual foi menosprezado, os gastos públicos correntes cresceram aceleradamente e a política externa foi marcada por opções de cunho ideológico.
Na área econômica, devido à valorização do real frente ao dólar, setores como os de calçados, brinquedos e têxteis foram prejudicados. O setor agroexportador também sentiu os efeitos da valorização do real.
A dívida líquida do setor público manteve-se na casa dos 50%, os juros nominais demoraram muito a cair e os juros reais continuam em torno dos 10% ao ano. O crescimento do PIB foi pífio (inferior a 3% ao ano), a carga tributária continuou excessivamente elevada (cerca de 40% do PIB) e injusta, prejudicando, sobretudo a classe média. Os investimentos públicos estão parados, a infra-estrutura continua deteriorada (encarecendo o custo-país), as parcerias público-privadas – PPPs – ainda não saíram do papel, as reformas política e trabalhista não aconteceram, a segurança pública continua caótica e o crime organizado mantém-se, alimentado pelo contrabando, pelo tráfico de drogas e de armas, devido à falta de policiamento nas fronteiras.
Muitos outros pontos poderiam ser analisados, coisa que a imprensa certamente fará com bastante precisão. A última eleição mostrou que o povo brasileiro, a seu modo, soube avaliar o Governo, de forma bem mais qualificada do que supõem as elites. Com o instituto da reeleição e a possibilidade de um mandato de oito anos, a eleição presidencial, após o primeiro mandato, tornou-se uma espécie de plebiscito. Ao levar a eleição para o segundo turno, o eleitor deu o recado: Lula deve ser reeleito, porém, com ressalvas. No segundo mandato, o Governo precisa melhorar. Cabe ao Presidente entender o recado das urnas.
Alcides Leite é professor do Centro de Conhecimento Equifax e especialista em Políticas Públicas e Gestão Governamental.