Brasil tem consumidores conscientes?

Com o objetivo de acompanhar as mudanças nos hábitos de compra e outras ações cotidianas e também compreender se os brasileiros caminham em direção ao consumo sustentável, o Serviço de Proteção ao Crédito (SPC Brasil) e a Confederação Nacional de Dirigentes Lojistas (CNDL), calcularam, pelo segundo ano, consecutivo o Indicador de Consumo Consciente (ICC). Ele atingiu 72,7%, permanecendo estável em relação a 2015, quando estava em 69,3%. O ICC pode variar de 0% a 100%: quanto maior o índice, maior é o nível de consumo consciente. Em uma escala de 1 a 10, os entrevistados dão nota média de 8,9 para a importância do tema consumo consciente. Mas apenas três em cada dez brasileiros podem ser considerados consumidores conscientes de fato – um aumento de 10,2 pontos percentuais em relação a 2015, quando esse percentual era de 21,8%.
Apesar de ter apresentado melhora, o aumento do indicador foi discreto em relação a 2015. “O consumidor brasileiro ainda possui desempenho abaixo do que é considerado ideal, representando um consumidor em transição. Assim como em 2015, os entrevistados associam mais frequentemente o consumo consciente com atitudes relacionadas apenas a aspectos financeiros, ficando em um segundo plano as esferas ambientais e sociais”, explica a economista-chefe do SPC Brasil, Marcela Kawauti. O principal benefício percebido pelos entrevistados continua a ser o de economizar e fazer o dinheiro render mais (37,1%), prevalecendo a dimensão financeira do consumo consciente.
O estudo do SPC Brasil segmentou os consumidores em três categorias, de acordo com a intensidade da prática dos comportamentos considerados adequados: “consumidores conscientes”, que apresentam frequência de atitudes corretas acima de 80%;  “consumidores em transição”, cuja frequência varia entre 60% e 80% de atitudes adequadas; e “consumidores nada ou pouco conscientes”, quando a incidência de comportamentos apropriados não atinge 60%.
Para elaborar o indicador, foi realizada uma pesquisa com uma série de perguntas para investigar os hábitos, atitudes e comportamentos que fazem parte da rotina dos brasileiros. As questões permearam as três dimensões que compõem o conceito de consumo consciente, e todas elas obtiveram resultados abaixo do desempenho ideal de 80%: práticas ambientais (72,5%), práticas financeiras (73,8%) e práticas sociais (70,6%). Apesar de apresentarem pequenos aumentos quando comparados a 2015, apenas a diferença percentual no subindicador relacionado às finanças é estatisticamente superior.
Análise no impacto do orçamento
O subindicador de Práticas Financeiras foi o único a apresentar um crescimento significativo, de 5,8 pontos percentuais em relação a 2015. Este crescimento está possivelmente associado não a uma maior consciência dos consumidores, mas a restrições financeiras e receio do futuro, gerados pela crise econômica que o país atravessa. “À primeira vista, este poderia ser um sinal de que o brasileiro está caminhando em direção a hábitos de consumo mais racionais, mas não se pode deixar de relacionar esses dados ao contexto econômico recessivo atual do país”, afirma Marcela. “O crescimento dos níveis de desemprego, inflação alta e as incertezas em relação ao futuro do país fazem com que o consumidor adote uma postura mais precavida em relação a suas finanças”. 
Se por um lado o consumidor age com maior cautela nas compras e toma mais atitudes para economizar, no sentido de fazer seu orçamento render mais. Por outro, ele parece mais pressionado a resistir às compras sem planejamento, pois entende que esse comportamento se torna ainda mais arriscado em tempos de crise. Tanto que das 18 atitudes investigadas desse subindicador, 11 apresentaram crescimento significativo em 2016, quando comparado ao ano passado. Sendo as mais praticadas: avaliação do impacto de compras no orçamento antes de realizá-las (90,2%); não ter vontade de fazer compras por ver os amigos com coisas novas que estão na moda (87,7%); sempre pesquisar preços (86,9%); priorizar a qualidade dos produtos e não as marcas (86,6%); e preferir consertar um produto que ainda pode ser utilizado a comprar um novo (86%).
Frear o impulso de realizar compras desnecessárias também tem sido um hábito comum do consumidor brasileiro: 82,9% garantem que geralmente quando sentem vontade de comprar um produto perguntam a si mesmos se realmente precisam e, caso contrário, preferem não comprar. Já as atividades menos praticadas pelos entrevistados são: alugar ou pegar emprestado produtos que usa com pouca frequência em vez de comprar um novo (43,2%) e não arrepender de compras desnecessárias feitas (21,4%).
 
É melhor doar do que jogar fora
O subindicador de práticas ambientais atingiu 72,5%, sem alteração estatística em relação a 2015 (71,7%). Entre as atitudes mais praticadas estão a de doar ou trocar produtos que não precisa mais antes de jogar fora (87,1%), não usar carro para ir a qualquer lugar (76,3%) e evitar imprimir papéis para evitar gastos e cuidar do meio ambiente (75,6%). A preferência pelo álcool em detrimento da gasolina, além de ser a prática menos frequente, foi a única a apresentar queda significativa – de 41,4% em 2015 para 32,6% em 2016.
Em relação às práticas que abordam o uso da água, a maioria apresentou crescimento significativo na variação anual, sendo as mais adotadas fechar a torneira enquanto escova os dentes (94,3%), ensaboar a louça com a torneira da pia fechada (89,1%), controlar o valor mensal da conta visando economizar (88,4%). Por outro lado, algumas práticas ainda encontram resistência, como ligar a máquina de lavar com a capacidade máxima (42,8%), fechar a torneira do chuveiro enquanto se ensaboa durante o banho (61,5%) e não lavar o carro com mangueira ou em lava a jatos (67,2%).
Já as práticas mais adotadas em relação ao uso de energia elétrica são apagar as luzes de ambientes não utilizados (96,2%), controlar o valor da conta mensalmente para economizar (89,2%) e ter a maioria das lâmpadas na residência fluorescentes (87,9%). Já a menos adotada é tirar da tomada os eletrônicos que não estão sendo utilizados (54,9%).
 
Compra de produtos piratas
A prática de engajamento social foi calculado em 70,6%, também sem alteração estatística em relação a 2015 (68,1%). As práticas sociais mais adotadas são: incentivar as pessoas da casa a economizarem água e luz (90,9%); preferir passar o tempo livre com família e amigos a fazer compras (85,9%); e apoiar o controle da propaganda (77,4%). Já as práticas menos adotadas são relacionadas à compra de produtos falsificados: 47,3% afirmam que não compram esses itens mesmo se o preço for muito atrativo. Enquanto 59,3% não o fazem porque não querem financiar o crime organizado. Apenas dois dos nove comportamentos testados na pesquisa tiveram aumento significativo em 2016 em relação a 2015. Que foi o incentivo às pessoas da casa a pechincharem nas compras (de 67,8% para 76,5%) e a reutilização de peças de roupas antigas (de 52,6% para 59,9%).
 
Esquecimento e falta de tempo 
Para os entrevistados, o principal motivador para o consumo consciente de água e luz é o não desperdício (35,5%), porém o esquecimento (31,5%) e a falta de tempo (29,8%) são as principais barreiras encontradas pelos consumidores. 
Considerando os tipos de consumidores conscientes, em transição ou nada ou pouco conscientes, percebe-se que não há diferenças entre os grupos com relação ao sexo ou classe social. No entanto, percebe-se que os consumidores conscientes são relativamente mais jovens, com uma média de 38 anos, enquanto a média de idade dos nada ou pouco conscientes é de 45 anos.

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