Entre todas as vantagens que a Lei de Arbitragem trouxe ao País, o maior reconhecimento é sua evolução aos processos e sua aplicação efetiva. Contudo, as mudanças que ocorreram em 2015 geraram preocupações quanto ao uso para relações de consumo. Afinal, era um método eficaz para resoluções de litígio por ser mais rápido e menos dispendioso. Agora, não só as empresas se preocuparam, mas os clientes também. Segundo Adriana Braghetta, sócia do L.O Baptista – SVMFA, esse último ainda terá respaldo não somente pelo Código de Defesa do Consumidor, como poderá fazer uso da técnica quando previamente estabelecida em contrato com a organização. “Decidiu-se que a arbitragem envolvendo relação de consumo seria permitida quando o consumidor a iniciasse ou consentisse com o seu prosseguimento”, afirma. Em entrevista exclusiva à ClienteSA, a advogada aprofunda mais sobre a situação de empresa e cliente.
ClienteSA: Em sua opinião, o que mudou nesses 20 anos da Lei de Arbitragem no Brasil?
Adriana: O atual nível de desenvolvimento da prática da arbitragem no Brasil teve início em 1996. A arbitragem ganhou grande impulso no Brasil, sobretudo em razão do amplo apoio dado pelo Poder Judiciário à sua implementação. A moldura normativa delineada na Lei de Arbitragem, ao longo de todos esses anos, mostrou-se muito bem-sucedida, tanto que sua primeira alteração ocorreu apenas em 2015 e teve o objetivo de ampliar ainda mais o uso do instituto. Assim foi que, na reforma, mantiveram-se os avanços já obtidos e ampliaram-se as hipóteses de arbitrabilidade. Ou seja, os conflitos passíveis de serem resolvidos pela via arbitral. Duas grandes vertentes da mudança: o tratamento da validade da cláusula arbitral em companhias e a validade da cláusula envolvendo entes públicos.
Como a Lei pode ser vista como aliada às empresas na gestão de clientes?
Na gestão de clientes, arbitragem se revela como um método altamente eficiente para a solução de controvérsias. Decorrem disso duas principais consequências no relacionamento com os clientes: as partes que aceitam a utilização da arbitragem demonstram sua disposição para uma solução técnica e neutra para eventual litígio que surgir, o que aumenta a confiança entre elas; e a maior rapidez da solução mitiga os efeitos nefastos da perpetuação de litígios no tempo e, algumas vezes, mantém a possibilidade da continuidade do relacionamento entre as partes. Durante a discussão do projeto que resultou na reforma da Lei, tentou-se separar a previsão das cláusulas compromissórias dos contratos de adesão daquelas envolvendo contratos de adesão em relações de consumo. Na hipótese do consumidor, a ideia era ter uma eficácia contida: havendo cláusula compromissória no contrato, o consumidor poderia iniciar a arbitragem, se assim quisesse. Ou, sendo esta iniciada pela outra parte, o consumidor posteriormente poderia expressar seu consentimento ou não com o procedimento arbitral. A previsão incluída, contudo, foi vetada e não constou no texto final. Recentemente, porém, o STJ proferiu decisão unânime que adota entendimento semelhante ao da proposta vetada. Decidiu-se que a arbitragem envolvendo relação de consumo seria permitida quando o consumidor a iniciasse ou quando iniciada pela empresa e o consumidor posteriormente consentisse com o seu prosseguimento. As empresas, portanto, podem desenhar uma oferta de arbitragem aos seus consumidores. Mas vejam que o judiciário funciona bem para as pequenas causas.
Como melhorar as soluções de disputas com os clientes?
Tenho para mim que a evolução na solução dos conflitos consumeristas passa por uma mudança cultural mais ampla, a respeito da relação entre os métodos de solução de litígios e os interesses do consumidor. Nesse sentido, um alto grau de desenvolvimento apenas será atingido se também for implementada a cultura da mediação, na qual as partes chegam a uma solução de consenso. Assim, com a nova Lei de Mediação, o prognóstico é muito positivo para a relação com os consumidores.
Como o consumidor pode se sentir seguro com a Lei de Arbitragem?
Antes de o consumidor optar pela arbitragem (o que entendo que tenha mais sentido quando o valor econômico é relativamente alto, na medida em que o judiciário funciona adequadamente para pequenas causas), ele tem que entender adequadamente o seu funcionamento. Tem que avaliar os custos do procedimento (incluindo honorários de árbitro e os da instituição), quem os adiantará, a credibilidade da instituição, como se dá sua possibilidade de escolher árbitro, entre outros temas. Como de costume, a assessoria de um advogado pode ser decisiva para avaliar adequadamente o uso da arbitragem, na medida em que, optando pela arbitragem, não é mais possível recorrer ao judiciário.