Evaristo Machado Netto
No início da gestão do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua determinação de transformar o Brasil em uma nação cooperativista foi percebida como um estímulo há muito esperado para o movimento crescer no País. Acreditamos que, com o entusiasmo do presidente, seria dado o impulso necessário para ampliar o número de cooperados no Brasil – hoje são 6 milhões -, possibilitando acesso ao trabalho e melhoria da distribuição de renda, os grandes desafios nacionais.
Recebemos várias provas de que o curso da história estava caminhando a nosso favor. A primeira manifestação deu-se na comemoração do Dia Internacional do Cooperativismo, há dois anos, quando o presidente Lula, acompanhado do ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, abriu as portas do palácio do governo para receber os cooperativistas – um ato inédito na história do País. Reconhecendo o cooperativismo como instrumento de inclusão social e distribuição de renda, o governo criou um grupo de trabalho interministerial (GTI) para estudar medidas ao efetivo desenvolvimento do cooperativismo no Brasil. Em 2004, o presidente Lula deu nova demonstração de respeito e estímulo ao visitar a Casa do Cooperativismo em Brasília, na passagem do Dia do Cooperativismo, comemorado em julho.
Porém, as boas intenções ainda não saíram do papel. Pelo contrário, os obstáculos de ordem política e legal têm causado problemas para o movimento e têm dificultado a participação, principalmente das cooperativas de trabalho. Comparadas à CLT por juristas, as cooperativas de trabalho necessitam urgentemente de uma legislação própria. Só assim poderão se apresentar à sociedade como alternativa de geração de trabalho, renda e inclusão social, sem precisar, a todo momento, explicar a que vieram.
É importante deixar claro que cooperativismo não é alternativa à CLT. Também não pode ser encarado como o fim dos direitos trabalhistas. Trata-se de uma forma de combater o desemprego, abrindo oportunidades de trabalho por meio do estímulo ao empreendedorismo.
O ramo cresceu 30% nos últimos três anos. Só em São Paulo, 371 cooperativas de trabalho reúnem quase 110 mil cooperados. No Brasil, são mais de 1.894 cooperativas e 346 mil associados, segundo dados da OCB (Organização das Cooperativas Brasileiras).
Desde o ano passado, o presidente Lula tomou ciência das iniciativas realizadas pelo Sistema OCB para melhorar a credibilidade do cooperativismo de trabalho. Reunindo extenso material, fruto de reuniões e discussões realizadas nas unidades estaduais da OCB, um comitê de juristas consolidou os estudos num único documento – Os Critérios para Identificação das Cooperativas de Trabalho. Baseado nos preceitos da Organização Mundial do Trabalho, o documento é resultado de uma construção coletiva e norteia a constituição e o desempenho de uma cooperativa no que se refere à segurança do trabalho, direitos humanos, previdência social, saúde ocupacional, cuidados com as crianças e jovens, entre outros. Os critérios representam nossa contribuição ao desafio do GTI de dar o impulso que falta para que o movimento cooperativista se firme no Brasil. Mais do que isso, o documento demonstra nossa vontade de acertar.
Às vésperas da comemoração de mais um Dia Internacional do Cooperativismo, o GTI e o Ministério do Trabalho e Emprego estudam um anteprojeto de lei para regulamentar as cooperativas de trabalho. Depois de abrir as portas para o cooperativismo, chegou a hora de o governo implementar as leis necessárias para a efetiva consolidação do setor.
O momento é de definições. É preciso que seja aprovado, o mais breve possível, um projeto de lei que regulamente, sim, as cooperativas, mas também preserve os princípios essenciais do cooperativismo, como a autonomia e independência dos empreendimentos (autogestão), a adesão livre e voluntária para se associar e a gestão democrática (um homem, um voto). Só assim, o cooperativismo comprovará ser a melhor alternativa para organizar a força de trabalho e diminuir o desemprego, mantendo o espírito do empreendedorismo e da autonomia do cidadão.
Evaristo Machado Netto é presidente do Sistema Ocesp/Sescoop-SP (Organização das Cooperativas do Estado de S. Paulo e Serviço Nacional de Aprendizagem do Cooperativismo).