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Máquinas aprendem, CEOs também

Autor: Valter Pieracciani
Tornou-se extremamente arriscado e difícil administrar empresas nos dias de hoje. Gerar resultados crescentes ao longo do tempo não é mais suficiente. Agora é preciso que o gestor assegure compliance, explicite um propósito atraente, mostre o tempo todo que a empresa é amiga do meio ambiente e dos animais, promova a diversidade e esteja pronto para lidar com todo tipo de crises imprevisíveis. As organizações estão agora diante de uma plateia de milhões de consumidores e críticos que se tornaram verdadeiros detetives-repórteres. Essas pessoas andam o dia todo com um gravador, uma câmera e uma filmadora na mão, prontas a registrar, julgar e disseminar suas sentenças.
Vocês dirão: é assim mesmo, os CEO ganham o que ganham para isso. Eles que trabalhem para assegurar empresas impecáveis; e, se for o caso, que coloquem suas cabeças na guilhotina. O problema é que nem tudo está propriamente nas mãos deles. Como conselheiro, me assusta a ideia de acordar um dia de manhã e, pelo jornal, descobrir, por exemplo, que um fornecedor de um fornecedor tenha, eventualmente, usado mão de obra irregular, ou qualquer outro desses pesadelos. Por mais que haja robustez na gestão, nenhum de nós está totalmente imune a possíveis “indiretices” capazes de destruir o valor das ações da companhia, até mesmo com consequências legais. Reconheçamos: vivemos em um país no qual a educação está longe de ser boa e com uma força de trabalho enormemente diversa. É possível, sim, que conosco trabalhem pessoas com crenças totalmente diferentes em relação ao que é tolerável.
Como solucionar isso? Uma possibilidade seria nos inspirarmos no “aprendizado das máquinas”. Explico: as máquinas aprendem registrando situações e associando soluções pré-concebidas a cada uma. Se quisermos, CEOs e conselheiros, aumentar nosso resguardo em relação às tais “indiretices” possíveis, poderíamos intensificar a captura sistemática de episódios que ensinam e, com base neles, disparar ações preventivas. Um exemplo prático aconteceu no final de novembro passado, quando o segurança terceirizado de uma rede de supermercados decidiu “livrar-se” de uma cachorrinha de rua que vivia no estacionamento, mas, curiosa e faminta, às vezes entrava na loja. Supostamente, envenenou-a e espancou-a até a morte. Trechos da barbaridade filmados foram parar na internet e imediatamente defensores dos animais e pessoas comuns lançaram uma campanha de boicote às lojas da rede. Nos dias que se seguiram ao episódio, certamente os ponteiros das vendas acusaram perdas. A empresa, uma companhia cotada em bolsa, demorou para se posicionar, e eu apostei que o valor das ações cairia. Errei. Por incrível que pareça, o abalo foi momentâneo.
Avaliemos o ocorrido: a rede, como muitas outras, tem centenas de lojas e milhares de terceirizados. No Brasil há cerca de 20 milhões de cães de rua. Esses profissionais, independentemente de usarem ou não uniformes, representam as empresas que os contratam. Estou certo de que, de agora em diante, haverá um novo conteúdo no treinamento dos terceirizados ensinando-os a lidar com animais. Espera-se também que as demais redes corram e façam o mesmo. Assim, seria possível consolidar uma dinâmica de associar a cada novo evento (não importa de que natureza ou onde aconteça) um novo treinamento e novos processos a partir de cada lição aprendida.
É provável inclusive que sejam criados bancos de dados contendo episódios que acontecem no mundo todo e que poderiam arranhar a imagem das empresas. Os dirigentes terão que estudá-los e cuidar para não venha a ocorrer algo parecido envolvendo suas marcas. Evitarão, assim, passar por dolorosas lições e uma educação compulsória e impiedosa ministrada pelas multidões.
Valter Pieracciani é sócio-diretor da Pieracciani Desenvolvimento de Empresas.

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