Rafael Bicalho
Há dez anos, debatíamos sobre os problemas que assolavam o Poder Judiciário Brasileiro, preocupados que estávamos com o crescimento do volume de processos, a falta de infra-estrutura para atender à nova demanda e o tempo de duração cada vez maior das ações judiciais. Naquela época, já se podia sentir nos fóruns os efeitos da popularização do acesso à Justiça, como conseqüência direta da Constituição Federal de 1988 e do Código de Defesa do Consumidor (1990), que, dentre outros avanços sociais, ampliaram o rol de direitos e garantias, incentivando as pessoas a buscarem socorro no Poder Judiciário, em especial para a reparação de danos materiais e morais.
Com o advento do Juizado Especial de Pequenas Causas, anos mais tarde (1995), as portas do Judiciário abriram-se ainda mais, proliferando de vez o número de conflitos confiados ao Estado, que, sem ter conseguido adaptar-se a tais mudanças, permitiu que a prestação jurisdicional se tornasse mais morosa e ineficaz.
Ao nos depararmos com a realidade atual, percebemos que os problemas e preocupações de outrora apenas se agravaram com o tempo, não sendo exagero, e nem tampouco novidade, dizer que grande parte do sistema judiciário brasileiro, sobretudo no Estado de São Paulo, enfrenta sérias dificuldades para atender ao mencionado aumento do volume de demandas, em razão de uma legislação processual complexa, e da carência de juízes, infra-estrutura adequada e de um modelo de gestão moderno.
Nesse contexto, em que o Poder Judiciário tem-se revelado incapaz de atender, com exclusividade, aos conflitos saídos das diversas relações sociais, ganham cada vez mais espaço os denominados Métodos Extrajudiciais de Solução de Controvérsias, dentre os quais destacamos a mediação e a arbitragem. Podemos definir mediação como sendo o método pelo qual um terceiro neutro, o mediador, valendo-se de técnicas especializadas, facilita a comunicação entre as partes em conflito, os mediandos, criando condições favoráveis para que estes cheguem a um acordo. É um procedimento ao qual as pessoas submetem-se voluntariamente, elegendo em conjunto o mediador, que se compromete, assim como os mediandos, a manter em sigilo tudo o quanto dito na sessão ou nas sessões de mediação. O objetivo é a pacificação das partes, solucionando o conflito existente entre elas e, quando possível, recuperando e até mesmo melhorando a qualidade da relação original, seja ela de consumo, comercial, societária e familiar, dentre outras.
Diferentemente do que ocorre no Judiciário, no qual a decisão é imposta aos litigantes, a mediação devolve aos titulares dos direitos e deveres a autonomia para decidirem sobre suas próprias vidas, havendo, por esta razão, maior comprometimento com o acordo que criaram do que com a sentença judicial, normalmente descumprida pela parte derrotada. Este comprometimento com o acordo é fruto do espírito cooperativo que deve nortear a mediação, em contrapartida à cultura adversarial praticada nos tribunais, por vezes incapaz de contentar até a própria parte vencedora, seja porque a vitória chegou tarde demais, porque o processo não pôde abranger todos os atritos da relação, ou ainda porque, na prática, a decisão judicial não surtiu o efeito esperado.
A arbitragem, mais difundida do que a mediação, já foi inclusive recepcionada pela legislação brasileira, tendo sido disciplinada pela Lei nº 9.307/96. Consiste em outro meio eficaz de se solucionar conflitos fora do Poder Judiciário, permitindo que as partes elejam um ou mais especialistas na matéria, que decidirão o impasse com base nos critérios pré-determinados pelas próprias partes. A arbitragem pode ser prevista desde o início da relação, mediante cláusula contratual, denominada compromisso arbitral. Nesta hipótese, havendo qualquer divergência entre as partes contratantes, uma poderá exigir da outra que a questão seja resolvida pelo árbitro ou árbitros escolhidos, excluindo-se o Judiciário.
Nada impede que as partes, ainda que não tenham previsto no contrato o procedimento arbitral, optem por esta alternativa de solução no momento em que surge o conflito, até porque nem todas as questões levadas à arbitragem têm natureza contratual. O procedimento desenvolve-se com a manifestação das partes e a produção de provas e culmina com a sentença arbitral dada pelo árbitro ou pelos árbitros, ficando as partes obrigadas a cumprir o quanto decidido, tal como ocorre numa ação judicial.
Muito seria possível dizer acerca da arbitragem, mas, em linhas gerais, enumeramos a seguir algumas das suas vantagens em relação ao processo judicial: curto prazo de duração, menor custo ao longo do tempo, sigilo, especialização do árbitro, possibilidade das partes elegerem os critérios a serem levados em consideração pela decisão, não se limitando à letra da lei, entre outros.
Assim, a tendência atual é que cada vez mais as pessoas físicas e jurídicas busquem resolver seus conflitos por meios alternativos, fora do Judiciário, procurando uma das crescentes Câmaras de Mediação, Tribunais Arbitrais ou especialistas autônomos, a fim de obterem uma resposta rápida, segura e convincente para o problema jurídico que estejam enfrentando, independentemente se estão na posição de credor, devedor ou de ambos, consistindo a mediação e a arbitragem, ao nosso ver, em excelentes opções ao mercado securitário.
Rafael Bicalho, advogado do Tubino Veloso & Vitale advogados, é especialista em arbitragem, conciliação e mediação.