Os novos desafios

Como as empresas estão vivenciando as importantes transformações digitais? Foi com essa pergunta que Rodrigo Tavares, diretor de atendimento da PagSeguro, deu o tom do último painel de debate do Congresso ClienteSA, realizado na última terça (25), no Palácio das Convenções do Anhembi. Primeira a responder, Ana Karina Quessep, presidente executiva da BprO – associação colombiana que congrega empresas de BPO -, fez questão de começar falando do que considera fulcral: operar uma transformação cultural.
Em seu país, a executiva explicou que até o Estado está empenhado em ajudar as empresas a enfrentarem esses desafios. “O governo colombiano nomeou um CIO para liderar essa parceria com organizações públicas e privadas. Entender até que ponto isso vai afetar os empregos, que tipo de legislação pode auxiliar, se há necessidade de diminuição de impostos para dar fôlego às organizações.” Ou seja, acompanhar todas as necessidades das empresas, “mais numa atitude de parceria do que de imposição”, tudo na busca do que ela chamou de “uma transformação digital responsável”.
Por sua vez, Alexandre Oliveira, head de atendimento/operações do Santander, sob a ótica de alguém que atua na área de relacionamento de uma empresa que ostenta cerca 42 milhões de clientes, alertou que, antes de colocar uma ferramenta nas mãos ou a serviço do consumidor, é preciso estar preparado para lidar com isso de forma consistente. “É necessário organizar a casa e tornar bem preparada a ponta onde ocorre o atendimento ao cliente.” Por isso, segundo ele, foi adotado no Santander o seguinte slogan: antes do digital vêm as digitais das pessoas.
Alexandre admite que as soluções digitais são um caminho sem volta. Mas ele indaga: “qual delas se adapta melhor a que tipo de cliente? Porque teremos que continuar dando a cada consumidor um tipo específico de atendimento”. Concordando com Alexandre, Rodrigo Tavares complementou: “não existe cliente offline e cliente online. Existe simplesmente o cliente”.
INCOMODE-SE A SI MESMO ANTES QUE OUTRO O FAÇA
Se os dilemas da transformação digital são desafiadores para empresas de todos os segmentos, indagou por sua vez Gabriel Drummond, CEO da Tel, “o que dizer então da área de contact center?” Nesse sentido, ele comentou que todos os setores estão sendo reformatados pela revolução tecnológica com IA e outras inovações, porém é preciso lembrar que a atividade de atendimento está sempre com suas empresas entre os 10 maiores empregadores do país. “São mais de 1,3 milhão de trabalhadores nas áreas de relacionamento com clientes.”
Assim, Gabriel foi enfático a suscitar o fato de que os desafios serão de agora em diante ininterruptos, pois não há mais qualquer setor confortável em conquistas do passado. O que gera insegurança para quem emprega e para quem é funcionário. “Sim, porque quem rege a realidade agora, o grande maestro, são as ideias. Novos negócios, totalmente inesperados, e que afetam vários setores ao mesmo tempo”, afirmou.
O executivo cita como exemplo o surgimento do Uber. Além das atividades mais óbvias, essa plataforma de tecnologia que conecta motoristas e passageiros, de forma antes impensável, atingiu em cheio também o setor de estacionamentos, entre outros. “Por isso, não há mais como ficarmos acomodados no que já foi conquistado. A realidade tem nos mostrado que, cada vez mais, fica impossível saber quem e de onde virá o seu maior concorrente no futuro próximo ou distante.” E complementa: “é melhor você ficar incomodado por si mesmo antes que alguém de fora te incomode”.
O RISCO DE TROCAR O CLIENTE PELA TECNOLOGIA
Já Fábio Toledo, diretor de gestão da base de clientes da Sky, destacou o grau de concentração e o senso de competitividade que são exigidos da empresa nesses tempos de transição. “Nós somo cotidianamente desafiados por três fatores. Emprimeiro lugar vem as especificades e dificultadoras da economia do país e de sua regionalização ampla e característica. Temos que bucar soluções todos os dias nesse âmbito.”
Em segundo lugar, mas não menos importante, Fábio cita o mercado no qual a Sky atua. “De forma incessante somos desafiados a manter nossos mercados e conquistar novos negócios com criatividade.” E, por último, o executivo chega à questão da digitalização. Como, quando e porque utilizar Inteligência Artificial e até quanto será decisivo seu papel no enfrentamento de todos os outros desafios.
Fábio abordou, ainda, um tema paralelo mas inerente ao da transformação digital: as experiências e os erros. “Motivados a incrementar tecnologia em nossos serviços e relacionamentos, criamos uma vice-presidência de digitalização. Foi um erro. O processo de transformação se fechou em si mesmo e se distanciou da fortíssima cultura da empresa: o foco no cliente.” Hoje, a empresa já corrigiu, voltando ao foco. “Utilizamos a multicanalidade no processo de relacionamento, mas concluímos que o comando disso tudo deve estar na área de Customer Experience. Os problemas nada mais são do que oportunidades para conhecer e satisfazer o cliente”, completou.
PAPEL DAS LIDERANÇAS
Já na opinião de Wellington Paes, diretor de clientes da Oi, existem três pilares que devem sustentar todo o processo de transformação digital em uma empresa. Ele menciona, em primeiro lugar, o cuidado para não realizar o que chamou de “imposição digital”. Segundo ele, essa avidez por incrementar tecnologia achando que facilitará para os públicos internos e externos pode conduzir a erros de pequeno ou amplo espectro. “Chegamos a instalar atendimento de voz de forma geral e indiscriminada. Para todos os tipos de clientes. Obviamente tivemos de recuar e corrigir.  É preciso saber antes, o que faz sentido para o meu cliente de forma individualizada”, revelou.
Outro sustentáculo, no entender de Wellington, é o rol de cuidados para digitalizar sem desestimular os colaboradores internos. De que forma aquilo, ao invés de colocar em risco o emprego, irá melhorar o trabalho e o dia-a-dia. Ou seja, transformar a operação motivando os operadores ao mesmo tempo. “Imagine-se em nossa empresa, na qual o desafio é mudar a mentalidade de mais de 10 mil agentes de atendimento.”
Como terceiro pilar, o executivo levantou uma questão que acabou se impondo como o tema hegemônico ao final dos debates: o desafio das lideranças e dos erros na empresa. De acordo com o diretor da Oi, a transformação física terá de ser precedida pela modificação do modo de pensar dos líderes. “Para esse líder entender, por exemplo, que o Whatsapp pode ser meu parceiro mais que meu meu concorrente. Compreender de forma profunda que cada cliente vai sempre preferir um tipo de atendimento. Inclusive o digital”, pontuou.
Ao encaminhar a finalização do debate, o moderador Rodrigo Tavares fez questão de salientar que o erro, antigamente algo aterrorizante numa organização, será de agora em diante, com a revolução digital e suas experiências,  a um só tempo inevitável e aceitável. Citou até, como exemplo, um site gratuito oferecido pelo Google (Think With Google) por meio do qual a mega organização tecnológica exibe detalhes dos erros que comete em seus projetos, chegando a inimagináveis (para nós) 35% dos planos e programas.
Ana Karina, da Colômbia, concordou, mas chamou a atenção para a grande diferença que há entre as empresas que nascem digitais e as tradicionais. Estas têm de digitalizar processos antigos e novos, com desafios bem maiores. “Estas acabam sendo incomodadas e motivadas por aquelas”, disse a executiva, complementando: “há que se tomar o risco de errar de forma a que a correção seja rápida. Risco e velocidade de ajuste. Para tudo isso temos que mudar a forma de os nossos líderes pensar e vencermos o maior dos desafios: como humanizar essa transformação tecnológica.”

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