Qual o melhor técnico?

Autor: Marcos Morita

O assunto desta semana é a escolha de Dunga como técnico que dirigirá a outrora gloriosa seleção canarinho. Não obstante os duzentos milhões de técnicos que em pesquisas oficiais ou oficiosas fizeram suas apostas em nomes como Tite, Zico, Pepe Guardiola ou Muricy, o fato é que o bom filho à casa torna. Costumo trazer meus exemplos para o mundo corporativo e desta maneira, vejamos como seria um anúncio para a posição, assim como uma análise sobre sua eleição.

Oportunidade única de emprego: empresa líder em seu mercado de atuação procura gestor para sua principal unidade de negócios, com o objetivo de desenvolver trabalho de longo prazo, visando o ano de 2018. Atrativo pacote de benefícios composto por remuneração fixa e variável atrelada a resultados da equipe. Face à alta visibilidade da posição, terá oportunidade de firmar contratos publicitários, ministrar palestras e prestar eventuais consultorias. Se reportará diretamente ao presidente do conselho.

Perfil desejado: conciliador, deverá agregar os colaboradores assim como harmonizar os interesses de dirigentes, conselheiros e patrocinadores. Bom comunicador, será o porta-voz da instituição com a imprensa por meio de coletivas e entrevistas. É requerido que possua larga experiência no setor, com comprovado sucesso em empresas de primeiro escalão no Brasil e no exterior, preferencialmente no continente europeu. Viagens constantes e longos períodos de concentração completam o perfil do cargo.

Desafio: a unidade de negócios passa por um momento crítico, devido aos resultados pífios apresentados no último trimestre, derrubando sua posição no ranking internacional do setor. Sua imensa e apaixonada base de clientes solicita mudanças imediatas na empresa, as quais deverão ocorrer em diversos níveis nos próximos meses.  O grande desafio está em colocar em prática um projeto modernizante, consistente e de longo prazo em uma instituição centenária, burocrática e política.

Uma vez no cargo, os primeiros dias serão cruciais para que o novo gestor possa entender sua estrutura interna e implementar seu novo estilo de gestão. Para ajudá-lo nesta missão, conjecturemos que tenha contratado uma consultoria que o ajude a analisar o ambiente e seus concorrentes, equipe, estrutura organizacional, força da marca e organograma, traçando um panorama corrente da situação. Imagine como seria a reunião de apresentação dos resultados.

Ambiente externo e concorrência: a globalização ocorrida nos últimos tempos fez com que empresas do setor compartilhassem experiências e melhores práticas por meio da transferência de colaboradores e gestores, reduzindo a vantagem competitiva sustentável da empresa brasileira. Como consequência, novos concorrentes emergiram no cenário mundial, com resultados importantes. Vale salientar que nas últimas décadas o continente europeu sobressaiu-se como celeiro de inovações e competitividade.

Equipe e clima organizacional: o clima organizacional da equipe não poderia ser pior. O resultado do ultimo trimestre, considerado o pior da história, aliado a cortes e reestruturações da cúpula à base, abateram a moral e a motivação dos colaboradores. O novo gestor precisará resgatar a moral de maneira dura e disciplinada, uma vez que o perfil do ultimo ocupante do cargo foi considerado democrático e deveras paternalista, sendo considerado um dos responsáveis pelo fracasso.

Força da marca: um pouco arranhada e desgastada na última temporada, sofreu certa pressão dos patrocinadores oficiais, os quais ansiavam por melhores resultados. Seja pela paixão de seus consumidores ou pela pura falta de concorrentes internos, é liquido e certo que a marca continuará forte e sólida, apesar dos críticos de plantão. Considerada como um caso único, com penetração em todas as regiões do país, idades, classes sociais, faixa de renda e sexo.

Organograma: conforme o professor Ichak Adizes, as empresas, assim como os seres humanos, nascem, crescem, envelhecem e morrem à medida em que se tornam engessadas, rígidas, burocráticas, internalizadas e políticas. Será este cenário que o gestor encontrará ao seu redor. Politicagem, toma lá dá cá, mesquinharia, briga de poder e conflito de interesse são as noticias que emanam de sua alta cúpula. Seu poder infelizmente será reduzido neste sentido e seu alinhamento, testado a todo momento.

Colocado esse cenário, a possível escolha de Dunga está muito mais para organograma e alinhamento com os dirigentes, considerando-se as características exigidas para o cargo. Currículo magro, pouca experiência no Brasil e nenhuma no exterior, durão, turrão e avesso a entrevistas. Voltando ao mundo corporativo, sua escolha causaria queda nas ações, as quais tendem a refletir a expectativa dos acionistas com o futuro da corporação. Como já dizia o ditado: “não há nada tão ruim que não possa piorar”.

Marcos Morita é mestre em Administração de Empresas, professor da Universidade Mackenzie e professor tutor da FGV-RJ. 

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