Ulisses Carraro
A terceirização é uma prática consagrada, amparada na legislação, e um caminho irreversível no processo de modernização das empresas e globalização da economia. Se assim é, por que existem hoje tantos entraves ao desenvolvimento desse sistema? A resposta é simples e pode ser resumida em dois tópicos: falta de conhecimento mais profundo das leis e exigências que envolvem tanto as empresas contratantes como as prestadoras e falta de vontade política para ajustar essas mesmas leis às necessidades do momento atual.
É preciso avançar tanto na esfera pública, por meio do aperfeiçoamento dos mecanismos de licitações, como na esfera privada, onde as empresas contratantes estão presas a uma série de exigências ultrapassadas e burocráticas, como limites de tempo e possibilidade de terceirizar apenas as chamadas atividades-meio.
A terceirização é uma forma ágil de garantir e gerar mais empregos, sem ferir direitos trabalhistas, ao contrário do que tentam fazer crer alguns procedimentos judiciais, ao barrar a contratação de serviços terceirizados por instituições públicas federais e estaduais, seja de empresas ou cooperativas como tais constituídas.
Há anos, a sociedade brasileira anseia por uma profunda reforma trabalhista, que alivie os custos ao longo da cadeia produtiva e de serviços. Não se trata, insisto, em reduzir direitos trabalhistas, mas de adequá-los às novas exigências. Por que cada hospital deveria se preocupar em montar e treinar sua própria equipe de limpeza se no mercado já existem empresas especializadas em fazer somente esse tipo de serviço, a um custo bem menor? Assim é com o setor de transportes, de conservação, segurança, manutenção etc., todas atividades-meio ou de suporte.
A legislação principal sobre a terceirização está reunida no Enunciado 331, de 1993, do Tribunal Superior do Trabalho. Mas há um emaranhado de outras leis com exigências específicas sobre determinados serviços. É o caso, para citar exemplo ilustrativo desse emaranhado, das atividades de vigilância. A Lei 7.102, de 20 de junho de 1983, regulamentada pelo Decreto 89.056, de 24 de novembro do mesmo ano, só permitia a contratação terceirizada de seguranças para estabelecimentos financeiros. Mais de dez anos depois, a Lei 8.863, de 28 de março de 1994, permitiu a prestação desse serviço especializado também para estabelecimentos não-financeiros.
A hora é propícia para avançar na modernização e flexibilização de nossa legislação trabalhista, onde um capítulo simples e objetivo poderia tratar do processo de terceirização, que comportaria até a inclusão da atividade-fim das empresas, uma tese já defendida por muitos juristas. O próprio presidente do TST, Francisco Fausto, sinalizou a necessidade de rediscutir o Enunciado 331.
Apesar do momento difícil que o país atravessa e da crise que abala o partido de sustentação do governo, há sinais positivos. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva acaba de convidar para o ministério do Trabalho um homem que conhece profundamente o dia-a-dia de um trabalhador e o drama do desemprego. Luiz Marinho freqüentou o chão das fábricas, comandou o Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo do Campo e chegou à presidência da CUT. Ele pode, sim, desempenhar um papel fundamental na modernização das relações de trabalho.
Há, como disse acima, uma enorme carência de conhecimento dos processos de terceirização, uma lacuna que o recém-formado Instituto Brasileiro de Terceirização (IBTe) tenta preencher.
É impossível, nesse curto espaço, enumerar tudo o que devem fazer as tomadoras de serviços antes da contratação de uma empresa, de uma cooperativa, de trabalhadores temporários ou mesmo autônomos, estes mais conhecidos hoje como Pessoas Jurídicas (PJs, em geral empresas de um único sócio). Apenas alguns conselhos: é preciso checar as contas da prestadora (política de administração), seu know-how, a qualidade de seus serviços, infra-estrutura, custos etc. Cuidado. Hoje, a Justiça está responsabilizando as tomadoras em caso de falta de pagamento ou de sentenças não cumpridas pelas prestadoras.
No sentido inverso, as empresas terceirizadas também devem cercar-se de garantias, especialmente no caso de prestação de serviços para prefeituras, Estados ou entidades públicas, onde quase sempre há inadimplência e atraso nos pagamentos.
Não há mais tempo a perder no processo de modernização de nossa legislação. Com a acelerada globalização da economia, corremos o risco de perder espaço e, pior, perder empregos. É preocupante a frase que está na página 58 da revista “Istoé Dinheiro” (13 de julho de 2005, nº 409): “Empresas brasileiras descobrem que é mais barato terceirizar a produção na China”. Fica o alerta.
Ulisses Carraro é presidente do Instituto Brasileiro de Terceirização. (www.ibte.com.br)