Paulo Ancona Lopez
A máxima de que “o cliente sempre tem razão” já não é mais tão verdadeira. O que se percebe hoje é que certos cuidados como tapetes vermelhos e atendimentos cordiais ficaram para trás. Evidentemente não para todas as empresas, é claro, mas para grande parte. Atravessamos uma fase em que muitas companhias fazem questão absoluta de deixar marcado seu “conceito de negócio” a qualquer custo, mesmo que essa prática represente incomodar e irritar os clientes. Cada marca, varejista ou prestadora de serviços, criou um estereótipo próprio, do qual de certo modo ficou prisioneira.
É justo ponderar que o conceito de cada negócio é o que o identifica perante o público, motivo pelo qual é importante que seja bem resolvido, de fácil leitura e bastante divulgado. Ocorre, no entanto, que muitos desses padrões têm se fixado de maneira impositiva, quase ditatorial. É uma postura equivocada, pois não permite à empresa saber o quanto aquilo agrada (ou não) ao seu público. Temos então o ponto de partida para uma “ditadura dos vendedores”, que se torna hegemônica a ponto de inverter os princípios básicos do marketing e da qualidade.
Neste cenário, o cliente deixa de interessar como indivíduo. Não é mais o centro das atenções e torna-se apenas um número na contabilidade. Agora é ele quem deve se adequar aos novos paradigmas e à forma de atendimento que vêm ´de fábrica´.
No varejo, principalmente em shoppings, é comum que o cliente seja recebido por funcionários vestidos como andarilhos, dizendo coisas inteligíveis, sugerindo algo que a pessoa não quer ou perguntando algo que ela não tem interesse em responder. O incômodo é ainda maior em lojas que subverteram a idéia do que é música-ambiente. Algumas parecem mais uma danceteria, tal o tipo de música e o volume, não importando qual seja o perfil dos freqüentadores. Está dado o recado: cabe ao freguês se adaptar àquilo que a marca julga ser o melhor.
Há ainda exemplos pontuais. São os casos de lojas de roupas que, preocupadas apenas em vender, deixam de prestar a assistência necessária no pós-venda; o comprador que se vire para fazer a barra da calça ou para reparar eventuais defeitos na peça. Ou de redes de supermercados cujos programas de fidelidade oferecem benefícios e descontos irrisórios, que mais irritam do que agradam tal é a insignificância dos valores. Ainda no caso dos mercados, é forçoso constatar que, em nome de folhas de pagamento mais enxutas, foi abolida a figura do empacotador, um diferencial considerável no atendimento.
O caso deste último personagem, por sinal, é emblemático. Cada vez mais despenca o investimento com recursos humanos ou materiais para prestar uma melhor assistência aos freqüentadores de qualquer ambiente. Seja no cinema, onde não mais existe o lanterninha, em lojas de varejo, em que a quantidade de caixas costuma ser insuficiente para evitar filas, ou em eventos esportivos ou culturais, onde o conforto e a segurança do público são artigos de luxo.
Igualmente importantes seriam os esforços para determinar a satisfação de quem consome um produto ou utiliza determinado serviço. Mas nem isso acontece. Muitas marcas resolveram não mais pedir a opinião de seus clientes, essencial para aprimorar o que é oferecido. Em alguns casos, o freguês sente-se até constrangido quando pensa em fazer qualquer tipo de reclamação.
Estes são apenas alguns elementos que traduzem a nova realidade imposta ao cliente. Ainda há empresas que resistem à tendência de impor seus padrões ou considerar como um custo dispensável o que deve ser investido em atendimento. Mas infelizmente são poucas. A situação só vai mudar quando o consumidor exigir seus direitos. Só então o mercado vai perceber que chegou o momento de deixar de lado o que cada marca ´acha´ para novamente respeitar o cliente.
Paulo Ancona Lopez é sócio da Vecchi & Ancona Estratégia e Gestão. ([email protected])