As seis faces do Cubo do varejo

Autor: Marcos Gouvêa de Souza
 
Lembra daquele cubo mágico de seis faces com outras nove partes em cada face que devem ser combinadas para resolver o enigma?
 
É o Cubo de Rubik, inventado em 1974 e que nos anos 80 se tornou febre mundial, e é sempre lembrado como um quebra-cabeças e desafio ao raciocínio rápido e interessante para várias gerações. Estima-se que apenas 5,8% da população mundial possa encontrar a solução.
 
Criou-se inclusive um campeonato mundial envolvendo a velocidade na solução do problema, recentemente rebatizado para Red Bull Rubik’s World Championship, vencido no ano passado por um chinês com o tempo de 3,47 segundos.
 
Mas o nosso tema é outro e só emprestamos a curiosidade sobre o cubo para propor uma releitura dos elementos fundamentais da equação estratégica do varejo nos dias atuais.
 
De fato, poderíamos usar o conceito básico das seis faces e suas inúmeras possíveis combinações se considerarmos as outras nove divisões coloridas em cada face para entendermos e avaliarmos as diferentes visões dos desafios e oportunidades no varejo atual.
 
As seis faces consideradas estratégicas, Globalização, Concentração, Competição, Digitalização, Polarização e Solução são as que determinam os principais vetores de transformação do setor e permitem leituras distintas para cada uma das nove divisões possíveis em cada face. Essas poderiam ser Segmento, Canal, Geografia, Marca, Negócio, Economia, Formato, Maturidade do Consumidor e Legislação.
 
A combinação de todos esses elementos, como aprendemos do conceito de Rubik, permite uma quantidade absurda, perfeitamente calculável, de alternativas possíveis, tal qual ocorre quando tentamos entender a realidade do varejo em cada situação, momento, segmento ou mercado.
 
Os seis vetores de transformação do varejo:
 
Globalização: É o movimento dinâmico que envolve a expansão, contração e reposicionamento do varejo no mundo, nos dois vetores de oferta e demanda. Inclui a expansão, ou a contração, de grandes redes, especialmente as de origem em economias mais desenvolvidas, em busca de novos mercados e oportunidades orientados para áreas menos competitivas e/ou com maior potencial de crescimento.
 
Mas também envolve os movimentos de busca de produtos com melhor combinação de preço e qualidade onde quer que possam ser produzidos e disponibilizados, situações que se alteram a cada momento por conta de custos envolvidos, legislação, estímulos e muito mais elementos.
 
O nível de globalização de um mercado, ou região, pode ser medido e avaliado pela participação dos players controlados por conglomerados globais nas vendas de uma região, canal ou segmento, por exemplo;
 
Concentração: É um processo, quase irreversível, envolvendo o aumento do poder estratégico e financeiro de alguns conglomerados globais ou locais, mas também, e cada vez mais, aqueles que passaram a atuar nos diversos setores do varejo, oriundos das novas fronteiras tecnológicas, como as Plataformas Exponenciais do Ocidente, como Google, Amazon, etc e os Ecossistemas de Negócios nascidos na China, exemplo de Tencent, Alibaba, JD e outros.
 
Mas o produto final é similar. Os maiores conglomerados tendem a crescer sua participação em cada mercado e a maturidade pode ser medida e avaliada pelo grau de concentração existente. Considera-se concentrado um mercado onde os cinco principais players detenham mais do que 40% do mercado total;
 
Digitalização: Dos fenômenos observados é o mais recente, mas também o de crescimento mais exponencial. Envolve toda a incorporação de tecnologia nos negócios dos próprios varejistas e de seus fornecedores de produtos, serviços e soluções.
 
Mas também, e principalmente, a incorporação da tecnologia e a digitalização na vida dos consumidores, precipitando profundas mudanças nas relações de consumo envolvendo todos os elementos do varejo.
 
É onde as mudanças são mais velozes e dramáticas porque o processo é complementado pelo barateamento das soluções tecnológicas, tornando-as mais acessíveis a todos os agentes de mercado, inclusive os consumidores;
 
Competição: É, em parte, resultado da combinação dos três primeiros – Globalização, Concentração e Digitalização -, potencializada pelo uso cada vez mais intenso pelos consumidores dos recursos que permitem comparar em tempo real as ofertas, propostas e conceitos oferecidos pelo mercado e optarem pelas alternativas que maximizem a relação Mais por Menos, onde o Mais é amplo suficiente para envolver Satisfação, Conveniência, Gratificação, Prestígio, etc.
 
Mas o resultado final é um crescimento consistente e constante do nível de competição no mercado ainda ampliado pelo aumento da oferta de alternativas disputando a preferência dos omniconsumidores;
 
Polarização: É o fenômeno que vem macro segmentando o varejo globalmente. Envolve a separação entre os varejos de Valor, Diferenciação e Solução.
 
O varejo de Valor é aquele que mais tem crescido em sua proposta, simples e singela, de oferecer o Mais por Menos de forma despojada, objetiva e direta, tendo no preço baixo seu apelo fundamental. É de todos os vetores o que mais crescido no mundo nos diversos setores, por conta de um consumidor mais racional e equipado para decidir de forma pragmática.
 
O varejo da Diferenciação é aquele que aposta na combinação do Prestígio das Marcas associado com a componente Experiência para gerar a diferenciação que permita margens brutas mais elevadas.
 
O varejo da Solução é aquele que combina Produtos com Serviços, entregando e integrando Soluções para resolver de forma mais direta os problemas de um consumidor com cada vez com menos tempo. Esse vetor é cada vez mais característico de mercados e economias mais maduros;
Customização: De forma ampla é a busca de alternativas que maximizem a satisfação individual de consumidores pela oferta de soluções exatamente adequadas aos desejos e possibilidades de cada um.
 
É a volta ao passado dos produtos feitos sob encomenda trazida ao momento presente pelas inúmeras possibilidades geradas pela tecnologia, criando a customização massificada.
 
Ele se expressa nas mais diversas formas e alternativas e tem tudo a ver com a busca de caminhos para melhoria da atratividade, diferenciação e melhoria da rentabilidade.
 
Como dissemos, é a releitura da realidade, conceito importado do mundo das artes, a partir de uma combinação nova de elementos e permitindo especular sobre outras perspectivas na análise dos mesmos fenômenos.
 
Mas serve principalmente para perceber a complexidade e dinâmica que domina cada atividade, negócio ou iniciativa e permitir uma reflexão ainda maior e mais ampla do mundo que nos cerca.
 
Marcos Gouvêa de Souza é fundador e diretor-geral do Grupo GS& Gouvêa de Souza, membro do IDV – Instituto para o Desenvolvimento do Varejo, do IFB – Instituto Foodservice Brasil, presidente do LIDE Comércio e membro do Ebeltoft Group. 

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima