Canal de vendas diretas: um formato sob mudança?



No universo das vendas diretas emerge uma importante questão: será que, numa empresa apoiada no sistema de vendas diretas, mais do que apenas executar vendas suas representantes conseguem desempenhar outras funções também almejadas pela empresa?


Para responder a esta pergunta, conjuntamente com a professora de Marketing Irene Raguenet Troccoli, do Mestrado em Administração e Desenvolvimento Empresarial da Universidade Estácio de Sá, realizei pesquisa na cidade do Rio de Janeiro em meados de 2012. Usei o caso da Natura, que investe alto para se diferenciar no mercado de cosméticos como empresa ambiental e socialmente responsável, e que treina suas consultoras quanto ao foco ambiental para vender a linha Ekos. Investiguei se as consultoras, no momento da venda, também se preocupam em divulgar este posicionamento da empresa, já que, embora de modo limitado, a empresa se esforça em prepará-las para lidarem com este assunto.


O resultado surpreendente foi que os clientes entrevistados não reconheceram nenhum esforço deliberado das consultoras para frisarem qualquer benefício do produto que está sendo comprado, nem no que diz respeito à relação com o comportamento ecologicamente responsável da Natura, nem no que tange a seus aspectos funcionais. 


Então, de onde vem esta lacuna?


A conclusão foi que ela advém de uma distorção amplamente praticada no sistema de vendas diretas da Natura: a terceirização, prática já consolidada, entre suas consultoras oficiais, de construírem uma rede de vendedoras informais (sem ligação direta com a Natura) para as quais repassam os catálogos, assim como parte de sua remuneração, a título de “pagamento”. As terceirizadas passam a “vender Natura” sem terem tido nenhum tipo de treinamento por parte da empresa – e muito menos das “terceirizadoras” – recebendo uma remuneração acordada com a consultora.


A pesquisa também apontou três motivos para esta terceirização: o desejo das consultoras de incrementar sua performance de vendas, o fato de elas saberem que a empresa na prática não inibe esta iniciativa, e a percepção dos clientes de que lhes é conveniente esta prática de a vendedora de apenas “deixar a revista e pegar depois”.


Isto significaria que o formato original das vendas diretas estaria sendo forçado à mudança para uma venda por catálogo, por uma questão tanto do lado da empresa vendedora, quanto do lado dos clientes?
Não obrigatoriamente. A pesquisa mostrou que o que pode estar havendo é apenas uma nova forma de arranjo na concepção da venda direta: vários dos clientes entrevistados afirmaram conhecer a postura responsável da Natura, refletida na linha de produtos Ekos, a partir de informações das mídias televisiva e impressa.


Ou seja, a Natura teria encontrado uma forma de aliar o melhor de dois mundos: ela “libera” oficiosamente as consultoras para terceirzarem (o que implica maior volume de vendas e maior receita para a empresa), e, por meio de mídias de elevada penetração, garante e controla perfeitamente a disseminação de todo e qualquer recado mercadológico a seu respeito que queira passar ao público.  

Marcos Nahmias é jornalista, mestre em Administração de Empresas pelo MADE da Universidade Estácio de Sá, e professor do Centro Universitário do Pará – CESUPA.

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