Sérgio Contente
Ao entrar em um escritório de contabilidade há um pouco mais de 15 anos, observando a mesa de cada funcionário, podíamos notar um vidrinho com um líquido incolor e um pequeno pincel. Movido pela curiosidade soube que se tratava de água sanitária, o que me fez lembrar de imediato às velhas canetas tinteiro. Curioso, soube que o líquido fazia parte da rotina de cada funcionário, já que era proibido rasurar os livros fiscais. Ao qualquer descuido, era praxe, o escriturário passar o pincel embebido na tal água e consertar o erro, antes que a tinta secasse. A correção tinha de ficar perfeita, de forma que não apresentasse sinais de rasuras no livro.
Para quem estava começando na profissão, a habilidade com o antigo processo de correção, a caligrafia e a velocidade da escrita eram fatores determinantes para a contração. Depois, a principal exigência era a familiaridade com a calculadora. Nos horários vagos, para relaxar, os funcionários faziam campeonatos de velocidade nos cálculos. A disputa girava em torno de quem conseguisse somar mais parcelas em menor tempo.
Estamos falando de apenas 15 anos, cenário não muito distante. Com a inflação seguindo galopante vieram ajustes como a Unidade Fiscal de Referência (UFIR), Unidade Fiscal do Estado de São Paulo (UFESP) e Taxa Referencial Diária (TRD). Quem é que não lembra? O governo para se proteger da desvalorização encurtou ao máximo os prazos para apuração e recolhimento dos impostos. A partir desse momento vieram os impostos semanais e até os diários, para acompanhar o ritmo das informações. A decisão foi por informatizar todos os departamentos possíveis e usar a chamada tecnologia de ponta.
Os contabilistas já tinham adotado a automatização, no que se refere à confecção de diários, razão e balanços. Mas tarefas como a escrituração dos livros fiscais, emissão de Darfs, guias e cálculos dos inúmeros impostos diferentes, que são exigidos do contribuinte, ficaram por último. Com a informatização na Receita Federal, das secretarias da fazenda estaduais e das prefeituras, hoje se torna necessário que as informações sejam passadas para o Fisco por meio de arquivos magnéticos, ou seja, são exigidos processos informatizados. Fica apenas na memória, a excelente caligrafia e o vidrinho com a água sanitária.
Ao implementar os primeiros softwares para escrituração fiscal, por volta de 1986, ainda havia reações contrárias à informatização, mas com o entusiasmo e aceitação por parte dos profissionais, o governo repensou e começou a autorizar o uso do computador para esse fim. Como as obrigações eram bem menores que hoje, ainda era possível optar pelo não uso da informática, ao contrário do que ocorre atualmente. Não há como comparar o tempo que um escriturário levava para preencher manualmente os dados das notas fiscais nos livros e quanto tempo leva para digitar o mesmo documento. Aqueles que já tiveram a oportunidade de fazer sua própria declaração do imposto de renda, atualmente informatizada, devem imaginar a dificuldade e as probabilidades de erros quando a mesma era feita manualmente.
Chega então a Internet, podemos dizer que de cinco anos para cá, que de fato influenciou novamente os serviços contábeis. Hoje, o objetivo é integrar o escritório contábil às empresas clientes desse serviço. O contador pode disponibilizar relatórios pela Internet, bem como a entrada de dados. Todos os sistemas de informática vem se adaptando nesse sentido e a estratégia está no desenvolvimento de um relacionamento entre o contabilista e o contribuinte.
A previsão para um futuro bem próximo, de no máximo dez anos, é a eliminação da maioria dos papéis e dos livros, transformando-os em arquivos digitais. Prova disso, já temos em fase o projeto-piloto do uso de notas fiscais eletrônicas. E o processo é irreversível. Logo podemos dar adeus à montoeira de papéis.
A adaptação com a informatização já é unânime. Hoje fica apenas no saudosismo ao velho vidrinho. Ser contabilista é estar em adaptação diária, principalmente em relação às leis. Além dos cálculos, o profissional está assumindo um novo papel, o de conselheiro econômico e financeiro. Surge à necessidade de orientar sobre empreendorismo e em muitos casos chegando a ter uma relação extra profissional, uma vez que a vida contábil do seu cliente passa por suas mãos diariamente.
Sérgio Contente é diretor-presidente da Contmatic Phoenix Sistemas Administrativos Integrados.