Criar hoje um produto do futuro

Autor: Flavio Augusto Picchi
Quando se fala em negócios na internet, o mais curioso é a criação de novos mercados inexistentes ou de reinvenção do modo de organização de mercados existentes. Dez anos atrás, seria quase impossível imaginar que um site, que apresenta páginas de pessoas contando seu dia a dia se tornasse uma das plataformas mais eficientes do mercado publicitário mundial e é isso que o Facebook faz. É um modo de organização de informações totalmente novo que, com a ajuda de algoritmos e tecnologias inéditas, permitiu o direcionamento de mensagens publicitárias mais eficientemente do que nunca. Por outro lado, quem diria que cooperativas de táxis ou pequenas livrarias teriam sua própria existência ameaçada pela entrada de empresas como Easy Taxi ou Amazon? Sempre houve uma maneira de chamar um táxi ou comprar um livro e a internet permitiu que ideias inovadoras reestruturassem o jeito de viver essas experiências. E as startups provaram que são capazes de unir grandes ideias e mudar a forma como a sociedade hoje vive.
As grandes características de startups de base tecnológica são a possibilidade de ganhos de escala na veiculação de um serviço ou um produto e a inerente incerteza de que esses serviços ou produtos tenham efetivamente um mercado. Escala e incerteza são típicas características da própria internet, que permitiu um avanço comunicacional sem precedentes. Avanço esse que foi de difícil planejamento, dada a própria natureza de atuação em rede que a internet apresenta. O mercado atual será o mercado antigo de amanhã e, portanto, as estruturas empresariais que não estiverem no compasso das novidades de mercado vão se enrijecer e perder o bonde. Uma prova disso é a quantidade crescente de grandes empresas que buscam inovar e empreender não apenas por seus departamentos de pesquisa e desenvolvimento, mas também favorecendo startups que tragam essas novidades de fora. O número cada vez maior no Brasil de programas voltados ao Corporate Venture, que é o investimento de capital feito por grandes empresas, é uma prova robusta.
Sem dúvida o aumento de interesse das empresas tradicionais por estarem presentes nos diversos canais de comunicação também foi um fator influenciador para a criação de muitas startups, pois esses novos canais de comunicação são novos canais de consumo. O que é o e-commerce, senão uma roupagem nova das vendas por catálogo? É isso e muito mais, claro, pois a incorporação dessas novidades e da tecnologia trouxe mais eficiência e mais entendimento do cliente. E não só vendas. Quase todo mundo com uma conta no Twitter, por exemplo, já resolveu problemas de consumo por aquele meio, o atendimento pós-venda via redes sociais é brutalmente mais rápido e eficaz. E agora a tendência vem sendo usar esse acúmulo imenso de informações para conhecer melhor o cliente e melhorar os produtos e serviços. Startups que trabalham com o chamado “big data” têm uma perspectiva sólida de sucesso ao trabalhar esses dados e transformá-los em inteligência empresarial estratégica.
Justamente, pelo fato de essas tendências serem muito atomizadas, difíceis de serem identificadas em grandes estruturas, que as startups saem na frente, porque são flexíveis e enxutas. Isso dá agilidade e poder de visualização de tendências e caminhos e, portanto, de oportunidades de mercado e de negócios. O resultado, então, é essa inversão do senso comum, de que empresas gigantescas lideram o processo de produção de tecnologias de ponta e a linha de frente, agora, é de startups que farejam com bastante antecedência o que pode vir a acontecer. O caso da Apple é paradigmático, Steve Jobs era um cara que dizia que fazia produtos que seus clientes não sabiam que iriam precisar. É uma maneira de ver o mundo. Novamente a gente pode pensar nos exemplos do Facebook e do Twitter, quem é que imaginaria que um carômetro de universitários ou uma ferramenta de recadinhos curtos iam se tornar negócios multibilionários? A resposta é simples: seus criadores, antes de todo mundo, já tinham pelo menos intuição de que suas criações iriam ser máquinas de geração de receita. E trabalharam nesse sentido, surpreendendo muita gente com um pensamento mais conservador, mais dentro da caixinha. E tudo faz parte de um processo extremamente dinâmico, em que os modelos de negócio vão evoluindo, causando uma ampliação do próprio público consumidor, ou uma reversão completa desse público. 
Claro que muitas acabam indo por caminhos que se revelam errados, mas esse tipo de erro é também comum nesse ambiente. É outra quebra de paradigma: aprender com o erro é um sinal positivo e de fortalecimento, erros que seriam muito mais custosos em ambientes mais tradicionais. Se a gente está tratando de tecnologia e inovação, necessariamente a gente está falando de pensar à frente, bem à frente. As regras clássicas do marketing ainda valem, mas vão passando por uma reinterpretação. Transformar a experiência de compra numa experiência sempre foi uma necessidade, mas apresentar essa visão é algo mais recente. Uma startup deve se preocupar em não abraçar o mundo com uma ampla gama de soluções, mas fazer muito bem pelo menos uma coisa melhor do que todo mundo. Claro que não se pode parar por aí, senão o produto envelhece e o mercado consumidor migra para concorrentes ou se desinteressa pela forma como a solução foi adotada. Uma evolução contínua e sólida vai ser sempre necessária, o que pode levar à completa transformação do próprio produto. Quem diria que o YouTube se transformaria na maior plataforma de compartilhamento de vídeos a partir de um site em que você votava nas fotos de uma pessoa avaliando se eram ou não atraentes?
Flavio Augusto Picchi é advogado e fundador do Picchi Estúdio Jurídico.

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