Leonardo Ferraz, diretor de pessoas da ClearSale

Diversidade e inclusão versus oportunidade e capacitação

Mais do que um dever social, promover cultura diversa enriquece debates e torna as tomadas de decisões cada vez mais assertivas

Autor: Leonardo Ferraz

Não é de hoje que debates relacionados à diversidade e inclusão ganham forma no mercado de tecnologia, sobretudo com o apelo voltado para a valorização das pessoas, respeitando quem elas são. No entanto, candidatos dessa área, por vezes, se veem diante de uma contradição: ao mesmo tempo em que muitas vagas estão disponíveis, boa parte exige qualificação técnica quase sempre inacessível aos profissionais que pertencem a grupos sociais sub-representados.

Em razão do contexto histórico na área de Tecnologia da Informação (TI), a discriminação começa no acesso à oportunidade de estudo e entrada nos cursos de graduação, em que a maior parte das turmas tem pouco ou nenhum universitário pertencente a grupos minoritários. O problema se torna mais evidente quando as empresas exigem uma qualificação técnica que muitas pessoas de grupos sub-representados não têm, valorizando mais a qualificação técnica – que poderia ser aprendida – do que habilidades comportamentais como proatividade, trabalho em equipe, maturidade psicoemocional, entre outras.

Por todo esse descompasso, em que a escassez de mão de obra especializada esbarra na falta de oportunidades de emprego para grupos mais diversos, cabe às empresas contratantes a criação de políticas internas consistentes, não só para reduzir obstáculos no ingresso desses profissionais no mercado de tecnologia, mas, também, para fomentar programas de aceleração e assegurar sua permanência nas posições já conquistadas.

De acordo com a pesquisa da Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom), o mercado precisará até o ano de 2025 de 797 mil profissionais. Porém, a mesma pesquisa revela um déficit no número de recém-formados na comparação com a quantidade de posições disponíveis no mercado de tecnologia. Anualmente, o ensino técnico brasileiro forma somente 53 mil pessoas enquanto a demanda média é de 159 mil profissionais de TI no País. Segundo a Brasscom, do ponto de vista de diversidade, ainda há um longo caminho pela frente, já que 85,2% do total de alunos da área são homens; mulheres correspondem a apenas 14,8% de profissionais dessa área.

Embora desafiador, esses dados revelam que as organizações precisam construir uma cultura organizacional sólida com iniciativas voltadas aos temas de diversidade e inclusão, contribuindo também para despertar o interesse nos jovens pela formação em tecnologia. Neste ponto, chamo atenção para retornamos à necessidade de entender o tema como problema estrutural e abordar a diversidade e inclusão para além do discurso. Afinal, mais do que um dever social, promover uma cultura diversa enriquece debates e torna as tomadas de decisões cada vez mais assertivas, trazendo, claro, retorno para a empresa, especialmente porque eleva o capital humano, contribuindo com soluções inovadoras.

Não à toa, de acordo com um estudo sobre o impacto da diversidade no mercado de trabalho, do ID_BR (Instituto Identidades do Brasil), para cada 10% de aumento na diversidade étnico-racial nas empresas, soma-se uma alta de 4% na produtividade dos colaboradores. O levantamento ainda revela que para cada 10% de alta na taxa diversidade de gênero há um acréscimo de quase 5% na produtividade das empresas. Mais do que a garantia de lucro, incluir populações que sofrem com a exclusão, seja por conta de sua raça, orientação sexual, gênero ou nacionalidade, significa corrigir uma injustiça social que ainda persiste no país.

A solução para essa equação, novamente, se sustenta na implementação de políticas de inclusão consistentes nas empresas de tecnologia. E isso começa na contratação e retenção de grupos minorizados, que, muitas vezes, até compõem o quadro de colaboradores nas empresas, mas restritos em áreas muito especificas. Nessa direção, é importante observar se a cultura interna valoriza a diversidade ou se tende a buscar sempre o mesmo tipo de perfil profissional. Além de promover programas de formação e aceleração, internos ou externos, é importante avaliar o nível de inclusão por meio de uma pesquisa de clima organizacional, com foco em melhorias para implementar medidas para um ambiente mais diverso, de respeito e inclusão.

É importante olhar para o todo e considerar que vivemos em uma sociedade multicultural, as empresas que entendem as diferentes interseccionalidades e incorporam esse conceito se diferenciam no mercado. Mesmo que os dados evidenciem a força de equipes mais diversas e que acolhem e incluem as pessoas, com certeza ainda temos um longo caminho pela frente, especialmente no mercado de tecnologia.

Leonardo Ferraz é diretor de pessoas da ClearSale.

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