Autor: João B. Sundfeld
A pergunta que não cala é: qual a verdadeira intensidade compreendida no CRM (Customer Relacionship Management), na sigla em inglês, ou Gerenciamento das Relações com Clientes, que determina o nível ideal do melhor relacionamento com os clientes? A melhor resposta como sempre é: depende da situação, do nível de relacionamento esperado pelas partes e do tipo de negócio que gera o relacionamento. De fato, há enormes diferenças entre as condições necessárias e suficientes para determinar o nível ótimo dos relacionamentos e o que se espera deles. Sem a pretensão de esgotarmos o assunto, consideremos três exemplos ilustrativos de negócios e de expectativas: a compra de um automóvel de luxo para cliente de classe de renda alta, a negociação com a clinica sobre uma cirurgia plástica e, por fim, o atendimento em um restaurante.
Na compra de um automóvel de luxo, presume-se que o cliente, com nível de renda alta, deseja tecnologia avançada, conforto, bom desempenho do motor, aparência moderna, cor elegante, razoável consumo de combustível, boas garantias e preço negociável. A recomendação inclui um bom vendedor ou vendedora, que tenham ótimo conhecimento do veículo, podendo responder a todas as perguntas técnicas e que demonstrem os instrumentos e novidades do carro. Sua disposição para um “test-drive” deverá ser evidenciada e é desejável que tenha autoridade e autonomia para negociar preço e condições. Adicionalmente, o vendedor precisa ter habilidade para situar o nível em que a conversa deverá se processar, sem intimidades ou distância que transmita desinteresse. Feita a venda, as boas práticas de CRM indicam que a empresa vendedora procure conhecer os dados do cliente para contatos futuros.
No caso de negociação de uma clínica, como uma paciente que deseja realizar uma cirurgia plástica embelezadora, o atendimento precisa ser feito por atendente especialmente treinada para considerar os aspectos psicológicos do caso, utilizando recomendações específicas para a preparação da paciente antes da cirurgia e detalhes sobre o período pós-cirurgia. Quando necessário, o próprio cirurgião informará à paciente sobre todos esses aspectos e quanto ao custo dos procedimentos. Os riscos de uma cirurgia desse tipo precisam ser explicados em detalhes. Atualmente, temos visto anúncios em revistas, TV’s e outdoors que vulgarizam as cirurgias plásticas ou o uso de produtos e massagens corretivas, tornando esta área alvo de críticas por lembrar a mercantilização da saúde e até charlatanismo. Também nessa área tem havido muitas reclamações de pacientes insatisfeitas com os resultados e com o atendimento no pós-operatório.
Finalmente, em nosso último exemplo, o atendimento em um restaurante. Há implicações desde o atendimento quanto à chegada dos clientes, com ou sem carro, estacionamento, reservas de lugares e espera na ante-sala ou no bar, com os respectivos serviços. Cortesia, simpatia, pronto atendimento, instalações adequadas, variedade e disponibilidade de alimentos e bebidas são itens importantes. Atualmente, um dos aspectos mais discutidos é a manutenção de áreas para fumantes separadas e fechadas. O hábito de fumar tornou-se um ato anti-social em quase todos os países, havendo até proibição de fumar por lei, como no Uruguai, em qualquer lugar público e, no Brasil, em ambientes fechados.
Há um caso famoso, uma das melhores histórias sobre atendimento, que conhecemos. Um homem está dirigindo há horas e, cansado da estrada, decidiu procurar uma pousada ou hotel para descansar e dormir. Avistou um luminoso com o nome Hotel Venetia. Quando chegou à recepção, o hall do hotel estava iluminado com luz suave. Atrás do balcão, uma moça de rosto alegre o saudou amavelmente: “Bem-vindo ao Venetia!”. Três minutos após essa saudação, o hóspede já se encontrava confortavelmente instalado no seu quarto e impressionado com os procedimentos, tudo muito rápido e prático. No quarto tinha uma cama impecavelmente limpa, uma lareira e um fósforo apropriado em posição alinhada sobre a lareira, para ser riscado. Era demais! Aquele homem que queria um quarto apenas para passar a noite, começou a pensar que estava com sorte. Mudou de roupa para o jantar (a moça da recepção fizera o pedido no momento do registro). A refeição foi tão deliciosa, como tudo o que tinha experimentado naquele local até então.
Retornou ao quarto. Fazia frio e ele estava ansioso pelo fogo da lareira. Para surpresa, alguém havia se antecipado a ele, pois havia um lindo fogo crepitante na lareira. A cama estava preparada, os travesseiros arrumados e uma bala de menta sobre cada um. Que noite agradável aquela! Na manhã seguinte, o hóspede acordou com um estranho borbulhar, vindo da copa do apartamento e descobriu uma cafeteira ligada por um timer automático, seu café e, junto um cartão que dizia: “Sua marca predileta de café. Bom apetite!” Era mesmo! Como eles podiam saber desse detalhe. De repente, lembrou-se: no jantar lhe perguntaram qual a sua marca preferida de café. Em seguida, ele ouve um leve toque na porta. Ao abrir, havia um jornal. “Mas, como pode? É o meu jornal! Como eles adivinharam?” Mais uma vez, lembrou-se de quando se registrou a recepcionista lhe perguntara qual seu jornal preferido. O cliente deixou o hotel encantando. Feliz pela sorte de ter ficado num lugar tão acolhedor. Mas, o que esse hotel fizera mesmo de especial? Apenas ofereceram um fósforo, uma bala de menta, uma xícara de café e um jornal.
Nunca se falou tanto na relação empresa-cliente como nos dias de hoje. Milhões são gastos em planos mirabolantes de marketing e, no entanto, o cliente está cada vez mais insatisfeito e desconfiado. Mudamos produtos, planejamos custosos programas de qualidade, produtividade, certificação ISO 9.001 e 14.000, mudamos o layout das lojas, pintamos as prateleiras, trocamos as embalagens, mas esquecemo-nos de cumprir acordos de entrega em datas certas e, esquecemos especialmente das pessoas. O valor das pequenas coisas conta, e muito. Os segredos do relacionamento com os clientes incluem fazer com que eles percebam que são parceiros importantes. Isto também vale para nossas relações pessoais, amizades e familiares.
Enfim, pensar no outro como ser humano é sempre uma satisfação para quem doa e para quem recebe. A verdadeira felicidade está nos gestos mais simples de nosso dia-a-dia que na maioria das vezes passam despercebidos.
João B. Sundfeld é economista, mestre e professor de planejamento estratégico, marketing e finanças na ESPM, USP e Unicsul, além de sócio-consultor da Sundfeld & Associados – Gestão Empresarial.