Autora: Flavia Pini
Enquanto a evolução tecnológica cresce na velocidade da luz, algumas áreas parecem acompanhar esse movimento a passos bem lentos aqui no Brasil. É o caso, por exemplo, do varejo nacional. O avanço da conectividade fez surgir diversos recursos que automatizam processos e, principalmente, geram insights relevantes e estratégicos para o negócio, mas, mesmo assim, a grande maioria dos empresários ainda insiste em práticas ultrapassadas de gestão – algo impensável em um cenário de intensa competitividade como o que vivemos hoje.
No relacionamento com os varejistas, percebe-se que ainda existe uma conformidade com o “achismo” e o “feeling” principalmente no mercado físico, onde o faturamento continua sendo o indicador protagonista. Ouvimos que os ambientes online e offline estão se tornando apenas um, mas essa é a realidade de poucos players do setor. O que ainda se vê são líderes diferentes para cada área, com métricas sendo analisadas de forma apartada – o e-commerce não consegue ver se o seu trabalho impacta a loja física e vice-versa. Com os dados depositados em bases diferentes, o sistema operacional nunca conseguirá ser atualizado por completo.
Falta cultura e coragem para implementar algo novo. Hoje, é imprescindível que qualquer varejista precisa razoavelmente saber sobre tecnologia, já que as empresas gradativamente estão se tornando techs. O chinês Jack Ma, fundador do Alibaba, afirma que a expressão “tech” deveria ser prefixo ao invés de sufixo na designação de novas empresas (uma vez que é a base tecnológica o motriz da companhia). Isso leva a crer que muitas mudanças não são aplicadas porque líderes não têm conhecimento, não sabem por onde começar e preferem não arriscar o que já está funcionando. Existe uma agenda de transformação digital a cumprir, mas é preciso ter ousadia para abrir o caminho ao invés de apenas seguir os rastros daqueles que chegarem primeiro.
Logo, é necessário “coletar” e “conversar” com os dados que a empresa pode trabalhar. Imagine, por exemplo, realizar uma campanha e não saber se a loja recebeu mais pessoas no período ou, pior, desconhecer o impacto no tráfego e na conversão porque o único indicador existente é o faturamento. Falta dar protagonismo a essas informações, não apenas criando apresentações de slides, mas mergulhando a fundo para saber como tirar proveito de insights que já estão disponíveis e que só precisam ser descobertos e trabalhados.
Para isso, três etapas são essenciais. Primeiro, é a necessidade contínua de coleta dessas informações – quem não tem dados, não tem matéria-prima para embasar sua estratégia. Depois, é preciso ter organização para armazená-los de forma eficiente, assim as consultas podem ser realizadas de forma dinâmica, com modelos preparados que podem ser aperfeiçoados com indicadores complementares a cada tempo e necessidade Por fim, é preciso desenvolver uma cultura interna orientada a dados, reconhecendo sua importância no dia a dia e enxergando-os como decisivos e não apenas como mais um relatório que, depois de um tempo, torna-se fundo de tela – você vê todos os dias, não presta mais atenção ou nem lembra mais que está ali.
O desafio já está lançado, estando os varejistas brasileiros preparados ou não. Agora, é necessário ter maturidade para entender o que é, de fato, prioridade para o negócio. Quando a companhia define o que é mais importante, respeitando seus próprios passos, mas equilibrando a rotina com projetos novos e eficientes, essas barreiras são quebradas. Além disso, espera-se maturidade também dos profissionais, conseguindo julgar o que é relevante para o negócio como um todo e não apenas para suas carreiras. Quando essas expectativas estão alinhadas, o varejo está pronto para crescer e, finalmente, adotar um sistema operacional que una tantos os mundos físico e online quanto as pessoas envolvidas neles.
Flávia Pini é sócia e CMO da FX Retail Analytics.