Autor: Marcos Nunes
A transformação digital dos bancos, impulsionada pelas novas tecnologias disruptivas que abalaram a estrutura tradicional do sistema financeiro no Brasil e no mundo, está obrigando as instituições financeiras a promoverem debates calorosos sobre como regulamentar a atuação das novas startups financeiras, as fintechs, e a sua própria relevância de mercado.
Como essas fintechs se baseiam na oferta de novos serviços mais fáceis de serem contratados e com menor custo, o modelo como os serviços bancários tradicionais são oferecidos entra em xeque e impulsiona o surgimento da necessidade de uma nova regulamentação das atividades financeiras. Com o surgimento das fintechs, outros termos entraram para o glossário do mercado financeiro: bitcoins, pagamentos peer-to-peer, crowdfunding, blockchain.
O impacto disso é tão grande que na edição do CIAB Febraban deste ano os organizadores deste evento reservaram um pavilhão e espaço na grade do congresso para tratar do assunto. Em junho, Comissão de Valores Mobiliários constituiu um Núcleo de Inovação em Tecnologias Financeiras para acompanhar o desenvolvimento e a aplicação de novas tecnologias financeiras no âmbito do mercado de valores mobiliários. Estamos avançando.
Não é à toa que isso ocorra, porque já existem quase 1.500 fintechs no mundo, segundo a empresa de pesquisa Venture Scanner, sendo que uma estimativa do Goldman Sachs sinaliza que 20% do mercado pode ficar nas mãos das fintechs. O que provocará perdas anuais na ordem de US$ 4,7 trilhões aos bancos. Mesmo que os bancos venham a adquirir participação parcial ou total nestas novas empresas, a mudança já está em andamento. Também a consultoria PwC ouviu 176 presidentes-executivos de instituições financeiras de vários países, relevando que 81% deles afirmam que a velocidade das mudanças tecnológicas ameaça o crescimento de suas companhias.
Já aqui no Brasil, o presidente de um dos maiores bancos confessou: “temos que correr”, mas resta saber como realmente os bancos podem se comportar diante deste desafio: combater ou unir-se aos inovadores, aliando suas expertises de negócios e de segurança com as fintechs. Se, por sua vez, a tecnologia da informação levou os bancos e instituições financeiras a levaram seus serviços para a Internet, a partir da criação do Internet Banking e Mobile Banking, as fintechs foram além.
Este cenário também é o tema central do seminário internacional promovido pela UL do Brasil em setembro deste ano, com a finalidade de reunir executivos de instituições financeiras e de meios de pagamento para a troca de experiências, para aprender e debater como dar os próximos passos rumo à inovação com foco no cliente. Aliás, falando em cliente, temos outro assunto a ser tratado: a guarda segura dos dados dos usuários e como eles serão compartilhados com as novas empresas financeiras. A questão que se coloca aqui é: de quem são os dados do cliente? Quem tem a responsabilidade de sua guarda? Como eles devem ser compartilhados? Quem irá regulamentar isso?
A resposta já está sendo dada pela evolução do mercado. Já não vivemos mais no tempo das pedras e não há como não aceitar a evolução tecnológica. O usuário – ciente dos serviços financeiros – quer realizar suas transações e compras online de qualquer lugar, em qualquer dispositivo conectado à Internet, e de modo seguro, sem riscos. Este é o Norte que o mercado de bancos e meios de pagamento do mundo inteiro está seguindo. Na Europa, por exemplo, o Conselho de Estabilidade Financeira do continente concordou com uma estrutura para categorizar as novas tecnologias financeiras, além de analisar seus riscos e benefícios para o seu mercado e clientes. E assim tem caminhado esta história no Brasil. Não poderia ser diferente.
Aqui em terras tupiniquins, desde 2013 já está definido o papel dos agentes financeiros ou não, que participam deste novo mercado impulsionado pelas fintechs, com o Conselho Monetário Nacional definindo as regras para as atividades de empresas que estão fora da definição regulatória do mercado financeiro. Agora, é a vez dos bancos avançarem para se aliarem à nova realidade. O futuro não é amanhã. É agora.
Os dados do usuário: o desafio da confidencialidade compartilhada
Para entender boa parte do impacto desta inovação sobre o mercado financeiro, basta levar em conta que aplicativos gratuitos permitem o controle financeiro onde o usuário cadastra as suas contas e senhas de acesso às suas contas bancárias. Uma API permite o app se conectar aos serviços bancários do cliente e o aplicativo entrega uma planilha com suas informações. Simples assim, mas é através de uma API (Application Programming Interface) que isso acontece, sendo que os dados do cliente – antes inacessíveis a terceiros, passam agora a serem compartilhados pela nova revolução tecnológica. Aqui entra o papel da regulamentação: os bancos guardam os dados, mas é o usuário que é dono deles. E é somente o usuário que dá autorização para que as informações sejam compartilhadas com o app que ele escolher. Basta ao banco respeitar esta vontade inequívoca do seu cliente.
Marcos Nunes é managing director da MSc – UL do Brasil