Cadastro Positivo não reduzirá juros

Autor: Ivo Barbiero
 
A criação do cadastro positivo, cuja lei acaba de ser sancionada pela presidente Dilma Rousseff, pode converter-se numa grande frustração nacional, pois a norma não atenderá à justificativa de sua criação, de reduzir os juros brasileiros, que continuam os mais elevados do mundo. A “novidade” trata-se de um banco de dados público sobre a adimplência dos consumidores na emissão de cheques, pagamento de prestações e das faturas dos cartões de crédito.
Em tese, a queda dos juros ocorreria devido à redução dos spreads bancários, a partir da ideia de que o cadastro reduziria os riscos de calote, permitindo subtrair o seu impacto no valor daquelas taxas. Seria fantástico, não fosse uma instigante obviedade: o sistema financeiro e todas as empresas já têm à sua disposição dados precisos sobre os solicitantes de empréstimos ou compras a prestação. 
Os bureaus de crédito e informações para negócios (pelo menos os que atuam com ética e eficácia, alinhados aos mais contemporâneos conceitos) já fornecem ao comércio, ao sistema financeiro e a quem de direito, informações muito corretas e fidedignas sobre o potencial de adimplência dos cidadãos. Nem por isso, contudo, reduziu-se em um ponto percentual sequer o spread cobrado pelos bancos. 
Ao contrário, nossa taxa de risco continua sendo uma das campeãs mundiais, apesar de os brasileiros estarem longe de serem os maiores caloteiros do Planeta. A rigor, a cada cem pessoas, temos, de fato, quatro maus pagadores natos. Os demais casos são transitórios, como perda de emprego, doença ou descontrole orçamentário em determinado período da vida, dentre outros fatores.
Por isso, a “negativação” dos nomes é algo cada vez mais anacrônico. O que a instituição financeira e o comércio precisam saber é se a pessoa que solicita crédito tem potencial para assumir o serviço da dívida. E isto já se faz há muito no Brasil. O Cadastro Positivo é mera questão semântica, pois sua existência implica a negativação dos nomes daqueles que nele não estão incluídos. Ou seja, depende do ângulo em que as informações são focadas. Ademais, não se pode entender todo esse sistema como algo estanque. Hoje, um adimplente de toda a vida pode tornar-se inadimplente e vice-versa. Ou seja, a atualização do banco de dados teria de ser diária, para não dizer horária, exigindo gerenciamento muito oneroso e complexo. A rigor, criar-se-á uma despesa para se instituir e manter algo que já existe na prática. Quem pagará a conta?
Por outro lado, não se pode agregar promessa de redução de juros a quaisquer fatores não alinhados à inexorável lei da oferta e da procura, que rege as economias capitalistas. O dinheiro é muito caro no Brasil porque a demanda é imensa. E o maior comprador desse “produto” é o próprio governo, que vai diariamente ao mercado financeiro captá-lo para a rolagem de sua gigantesca dívida pública. Se metade desses recursos ficasse à disposição do crédito aos consumidores e das empresas em busca de financiamento, os juros já seriam muito menores em nosso país.
A presidente Dilma Rousseff parece estar fazendo um esforço fiscal interessante no sentido de reduzir despesas públicas. Esta sim é a grande lição de casa para a queda dos juros, que precisa ser adotada pelos três poderes, nas instâncias federal, estadual e municipal. Importante: caso a tarefa não seja cumprida até a sanção da Lei do Cadastro Positivo, o Estado corre sério risco de ficar de fora do banco de dados.
 
Ivo Barbiero é presidente da ProScore, Bureau de Informação e Análise de Crédito.

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