Estudo investiga como jovens brasileiros enxergam o futuro

Quase 70% dos jovens apontam seus professores como fonte de informação mais confiável e 33% não confia no sistema político

O British Council lançou hoje o relatório “Next Generation Brasil 2025”, um estudo que traz a percepção de mais de 3 mil jovens de 16 a 35 anos de todas as regiões do Brasil. A pesquisa investiga como os jovens brasileiros enxergam o futuro  e aborda temas que vão desde identidade e resiliência até educação, empregabilidade, cultura e ação climática.

O estudo destaca as disparidades de renda – jovens brancos recebem cerca de 19% a mais do que a média nacional neste levantamento, enquanto jovens pretos ganham 31% a menos. Mais da metade dos jovens pretos relataram que vivem com menos de um salário mínimo e meio por mês e, ainda que 56% sejam os principais provedores de renda em suas casas, quatro em cada dez não conseguem cobrir suas despesas básicas. 

Educação

A educação continua sendo um dos desafios mais urgentes. Metade dos jovens de 19 a 24 anos não possui diploma universitário nem está estudando atualmente. Entre os que não concluíram o ensino médio, quase dois terços são pretos ou pardos, em comparação com um terço dos jovens brancos. O acesso à educação também reflete desigualdades territoriais: enquanto 55% dos jovens em grandes centros urbanos possuem ensino superior, esse número cai para 14% nas favelas e apenas 10% em áreas rurais.

Os professores surgem como figuras altamente confiáveis: 69% dos entrevistados os apontaram como sua principal fonte de informação confiável, superando outras fontes como jornais, família, sites de notícia e redes sociais. Ainda assim, as principais demandas dos jovens para a melhoria da educação são melhores salários e condições de trabalho para os professores, melhoria na formação e melhores instalações nas escolas.

O sonho de empreender

A pesquisa detectou também os principais desafios identificados pelos jovens no mercado de trabalho, sendo que 66% afirmou que os salários abaixo das expectativas e de suas necessidades básicas, somados a longas jornadas de trabalho (56%) como pontos de atenção. Emerge junto aos jovens consultados na pesquisa o desejo de empreender como alternativa a este cenário e como caminho para o futuro: embora 70% dos jovens tenham o sonho de empreender, 40% indicou que a falta de acesso ao crédito torna-se a principal barreira para concretizar este sonho. 

Desigualdade e identidade

A pesquisa revela ainda um retrato alarmante da desigualdade racial no Brasil. Entre os entrevistados, 86% dos jovens pretos relataram ter vivenciado episódios pessoais de racismo, enquanto 71% entre jovens pardos disseram o mesmo. A discriminação também se estende ao mercado de trabalho: um em cada cinco jovens pretos afirmou já ter sido negado em uma vaga de emprego por causa da cor da pele.

Povos indígenas: exclusão e resiliência

Para a juventude indígena, as barreiras ao acesso à educação e a condições de vida dignas permanecem persistentes, impulsionadas por desigualdades estruturais e exclusão histórica. Apesar desses desafios, muitos jovens indígenas exercem papéis de liderança em suas comunidades, defendendo seus territórios, o meio ambiente e o direito à educação de qualidade. Um dos respondentes indígenas afirmou: “As políticas públicas para garantir nossa permanência nas universidades, como bolsas, moradia e apoio psicossocial, são essenciais. Também precisamos investir em escolas indígenas com infraestrutura adequada e materiais didáticos produzidos por nós”.

Gênero e orientação sexual

As desigualdades também permanecem evidentes. Para 78% dos jovens brasileiros, o país ainda possui uma cultura profundamente machista, e 73% reconhecem que as mulheres enfrentam discriminação no ambiente de trabalho. Quase todos os entrevistados (83%) concordam que as responsabilidades domésticas e de cuidado recaem mais fortemente sobre as mulheres. Mesmo com níveis mais altos de escolaridade, as disparidades salariais persistem: mulheres negras cisgênero com diploma universitário ganham 70% menos do que homens brancos cisgênero com a mesma qualificação.

Larissa Fontana, do Conjuve, Conselho Nacional de Juventude, observou que “o Brasil continua a reforçar estereótipos raciais e de gênero que raramente são enfrentados pelo Estado. Isso sustenta narrativas que rotulam jovens negros como ‘naturalmente’ suspeitos ou perigosos e mulheres negras como hipersexualizadas e desumanizadas, valorizadas apenas pelo trabalho ou pela exploração”.

Dentro da comunidade LGBTQIAPN+, 64% afirmaram ter sido tratados de forma diferente por causa de sua orientação sexual. Os principais desafios relatados incluem rejeição familiar, violência e discursos de ódio.

Olhando para o futuro

A relação dos jovens brasileiros com a política é marcada pelo distanciamento: 33% dizem não confiar em nenhuma instituição pública. Ainda assim, esse afastamento não é sinônimo de apatia: 22% afirmaram que se engajariam mais se tivessem contato direto com líderes políticos, 23% se as plataformas políticas fossem mais claras e 24% se as escolas incentivassem a participação cívica. Como acrescenta Larissa: “Não é por desinteresse. Os jovens se importam profundamente com as questões que afetam suas vidas, mas a linguagem e os espaços da política muitas vezes são inacessíveis ou pouco acolhedores.”

Apesar desses desafios, os jovens continuam a expressar fortes vínculos com seu país. As principais fontes de orgulho citadas foram a cultura brasileira (48%), a culinária (46%) e a família (45%), vistas como pilares centrais de pertencimento.

Quando questionados sobre o que esperam dos governos para um futuro melhor, as respostas foram concretas e pragmáticas: ampliar as oportunidades de emprego e estágio (29%), reduzir a desigualdade social e a discriminação (28%), oferecer uma educação mais prática e voltada ao mercado de trabalho (26%) e criar programas de apoio à saúde mental nas escolas (23%).

Apesar das desigualdades e barreiras que enfrentam, a nova geração do Brasil permanece esperançosa e resiliente. O estudo revela uma geração orgulhosa de sua cultura, criatividade e diversidade, ansiosa por construir um país mais justo, inclusivo e sustentável, em que suas vozes são efetivamente ouvidas e incorporadas na formulação de políticas públicas e  na construção de seu próprio futuro.

“A incrível diversidade do Brasil torna-o complexo. Para realmente compreender o que os jovens pensam e sentem precisamos de mais do que números, precisamos conversar com eles e ouvir com atenção. É isso que o ‘Next Generation Brasil’ propõe: entender a juventude a partir da sua própria perspectiva, e não apenas de uma visão externa. Esse tipo de percepção genuína é essencial para formular políticas e projetos que reflitam verdadeiramente a vida e os sonhos dos jovens brasileiros e gerar resultados melhores. O papel do British Council é reunir todos os envolvidos nesses temas — governos, sociedade civil, pesquisadores e empresas — para refletir sobre o que pode ser feito para construir um futuro melhor para todos”, comentou Tom Birtwistle, diretor do British Council no Brasil.

Metodologia da pesquisa

O estudo Next Generation Brasil, conduzido pela SOS Education, utilizou uma abordagem de métodos mistos para captar uma visão inclusiva dos brasileiros de 16 a 35 anos. A pesquisa quantitativa envolveu 3.248 participantes em todo o país (nível de confiança de 95%, margem de erro de ±2%), complementada por grupos focais e dezenas de entrevistas individuais com jovens de grupos sub-representados e líderes comunitários.

Adaptado do modelo global Next Generation do British Council, o questionário abordou temas como educação, trabalho, bem-estar, engajamento cívico e clima, incorporando categorias inclusivas de raça, gênero e identidade. Um Grupo Consultivo (Youth Task Force), composto por dez jovens líderes de diferentes regiões do Brasil, colaborou voluntariamente em todas as etapas, desde a adaptação do questionário até às recomendações de políticas públicas. A campanha de divulgação envolveu mais de 1.000 ONGs, escolas e universidades, com parcerias que incluíram as redes de Metrô de São Paulo, Brasília, Recife e Fortaleza.

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