Priscilla Adaime, sócia fundadora da Markle Comunicação e Marketing Jurídico

Quando muitos opinam o marketing perde força

É comum ver projetos se arrastarem por semanas, com cada versão de um conteúdo passando por revisões intermináveis

Autora: Priscilla Adaime

Nos últimos anos, os comitês de marketing têm se tornado comuns nos escritórios de advocacia brasileiros. Inspirada em uma prática já consolidada nos Estados Unidos, a ideia é nobre e busca reunir sócios de diferentes áreas e gestores internos para contribuir com a estratégia de marketing e facilitar a interlocução com as agências especializadas. Na teoria, esse grupo multidisciplinar deveria dar agilidade, alinhar expectativas e centralizar decisões, mas, na prática, muitas vezes acontece o oposto.

Quando o comitê se transforma em um espaço com excesso de opiniões, sem clareza de papéis e responsabilidades, o resultado é paralisante. Cada integrante faz alterações em um texto, um post ou uma campanha, tentando adequar o tom ao próprio ponto de vista. A versão original, que tinha voz, energia e conexão com o público, desaparece em meio a dezenas de edições. O conteúdo final torna-se burocrático. O que era estratégico e criativo fica apenas “seguro” e, portanto, invisível.

Não se pode negar que comitês podem trazer benefícios. Eles centralizam as informações do escritório, evitam duplicidade de esforços e ajudam a alinhar a comunicação de diferentes áreas. Quando bem estruturados, também podem ser um espaço de troca de ideias estratégicas, contribuindo para o desenvolvimento de novas ações e fortalecendo a cultura interna de marketing.

O problema surge quando todos os integrantes têm poder de veto. “Muito cacique para pouco índio” costuma resultar em decisões lentas e desgastantes. Em vez de acelerar o trabalho das agências de marketing jurídico, os comitês acabam atrasando aprovações e esvaziando a proposta inicial. Essa cultura do consenso pode matar a ousadia, justamente em um mercado que precisa ser mais claro, humano e relevante em sua comunicação.

Não por acaso, profissionais de marketing jurídico relatam frustração ao lidar com comitês pouco objetivos. É comum ver projetos se arrastarem por semanas, com cada versão de um conteúdo passando por revisões intermináveis. Ao final, o que chega ao público é uma mensagem tão “politicamente correta” que não desperta engajamento algum.

A solução não é eliminar os comitês, mas repensar sua estrutura. É essencial definir quem toma a decisão final, quais são os critérios de aprovação e qual o real objetivo do grupo. Um comitê eficiente precisa ser estratégico, não operacional. Ele deve olhar para o “grande quadro”, deixando que especialistas, internos ou externos, executem o que sabem fazer.

Outro ponto é a representatividade. Quanto mais enxuto e diverso o comitê for, maiores as chances de que ele funcione. Cinco pessoas com foco estratégico tendem a ser mais produtivas do que quinze sócios tentando aprovar cada vírgula. Além disso, é importante estabelecer prazos claros e evitar que o comitê se torne um gargalo para a agência e para o time interno de marketing.

Os escritórios brasileiros podem aprender com a experiência norte-americana. Lá, após anos de tentativas e erros, percebeu-se que marketing por comitê não funciona quando cada decisão precisa ser consensual. Conteúdo seguro demais é conteúdo irrelevante. Por isso, a máxima deve ser clareza acima do excesso de cautela.

Afinal, o público-alvo quer ser informado e sentir confiança, não ler um texto que parece ter sido escrito para agradar a todos internamente. O marketing jurídico precisa ser assertivo, vivo e conectado. E isso só é possível quando há espaço para que as agências e profissionais especializados executem o trabalho com autonomia.

Enquanto os comitês de marketing não entenderem que sua função é direcionar e não controlar cada detalhe, corremos o risco de ver bons projetos naufragarem antes mesmo de ganhar visibilidade.

Priscilla Adaime é sócia fundadora da Markle Comunicação e Marketing Jurídico.

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