Autor: Airton Cicchetto
Futebol não tem lógica, diz o ditado. Será? Nenhuma seleção esteve no Brasil para brincar irresponsavelmente, sem se importar com seu desempenho e resultados dentro e fora do campo. O futebol foi levado a sério e provou ter sua lógica. Aliás, diga-se, uma lógica empresarial, que tem como primeiro objetivo a satisfação de seus públicos de interesse, seus stakeholders. Lembrando que stakeholders são, por definição, os interessados, indivíduos ou entidades que tem interesse na organização, que podem afetá-la ou ser afetados por ela. Quem seriam, então, os principais stakeholders de cada selecionado?
Vejamos, no grupo dos financiadores, ou fornecedores de capital, estão as empresas ou entidades patrocinadoras, que cobram resultados na forma de exposição à mídia. É preciso que a seleção avance nas fases do torneio para se manter no foco das atenções e, assim, satisfazer seus patrocinadores. No grupo do mercado, os principais stakeholders são os clientes, no caso, as torcidas, representadas pela quase totalidade da população de seus países que, obviamente, tem como expectativa as vitórias. No grupo organizacional, os públicos de interesse são os próprios atletas, a comissão técnica e membros da delegação que também precisam ser satisfeitos com vitórias e recompensas pelo trabalho.
Pois bem, satisfazer a estes diferentes públicos requer talento e gestão. Somente uma gestão eficaz pode promover a interação do talento com competência dentro de campo e fora dele. A competência dentro das quatro linhas se origina pelo monitoramento e estudo do adversário e definição de um padrão de jogo dinâmico que se alterna entre defesa e ataque durante a partida. Este é o processo e, assim como nas empresas, a capacidade de cumpri-lo, requer um trabalho eficiente de orientação técnica, competência individual e trabalho em equipe que, juntas, compõem as condições sine-qua-non para chegar as vitórias e satisfazer a todos os stakeholders, no caso: os patrocinadores, torcida, atletas e demais membros da delegação.
O que se pôde notar na seleção da Alemanha foi um competente trabalho de gestão, embasado em fundamentos como os que seguem: 1-Metas: a Alemanha almejava este mundial. Definiu claramente sua meta, fez seu planejamento estratégico, traçou e cumpriu planos de ações para viabilizar a conquista do título. 2-Metodologia: o selecionado alemão desenvolveu um trabalho de longo prazo com a mesma equipe e mesmo técnico. O resultado é que todos se conhecem, entendem um ao outro, conhecem as regras e processos de dentro e fora de campo e cumprem seu papel sem improvisações. Tudo conforme, previamente, definido no padrão de jogo, isto é, no seu sólido processo.
Metas e metodologia já parecem suficientes, não obstante, outros fundamentos foram também observados. 3-Excelência: todos, sem exceção, atletas e componentes da delegação, tinham muito claras quais as expectativas de seus públicos e buscaram se diferenciar pela excelência, para atender a tais expectativas. Trabalharam em conjunto e lutaram individualmente para cumprir sua tarefa, certos de que assim o fazendo, estariam contribuindo para fortalecer a equipe, cumprir o padrão definido para a partida e suplantar seus adversários. 4-Monitoramento: com ajuda da tecnologia, foi surpreendente o nível do controle de desempenho dos atletas. Vários indicadores de performance simultaneamente controlados: indicadores individuais, da própria equipe e também dos adversários.
A grande diferenciação alemã, foi melhor utilizar as informações para estudar seus adversários, analisar suas forças e fraquezas, analisar também as próprias forças e fraquezas, identificar de onde viriam as principais ameaças e onde estariam as melhores oportunidades de jogo. Tudo como num perfeito exercício de análise SWOT. 5-Ambiente: este pareceu ser também o ponto alto da equipe alemã. Nas entrevistas e declarações do técnico e de seus jogadores, após os jogos, todos se referiram ao trabalho da equipe, enalteceram o conjunto em relação aos valores individuais, demonstrando serem uma equipe unida e participativa.
A copa surpreendeu. Os atletas deram um show de talento. A Alemanha deu show de gestão, integrando talento e competência dentro e fora de campo. Executivos, gestores de negócios e empresários brasileiros, de todo e qualquer segmento de negócios, deveriam refletir mais e buscar lições sobre o que viram nas delegações em geral, em especial na da Alemanha, além da contagiante exibição dos astros do futebol.
Airton Cicchetto é consultor, palestrante empresarial e idealizador do modelo SCG – Simples Complexo Gerencial – Simplificando a Gestão.