Autor: André Villac Polinesio
Viver nos grandes centros urbanos hoje significa lidar cotidianamente com o trânsito caótico e, consequentemente, com imensas dificuldades de locomoção. Além do mar de carros, as cidades também não raras vezes se veem paralisadas em função de greves ou protestos, entre outros obstáculos. É nesse contexto que o sistema de trabalho home office começa a ganhar mais espaço. Afinal, muitas atividades podem ser exercidas remotamente, facilitadas pela comunicação digital, o que evita a perda de produtividade em função do transporte complicado em capitais como São Paulo ou Rio de Janeiro, apenas para citar dois exemplos.
Se a tecnologia tem esse aspecto benéfico, também coloca os empregadores diante de uma situação nova e com implicações jurídicas. Que precauções legais os gestores devem tomar ao optarem pelo home office?
Para começarmos essa reflexão, vamos observar o que diz a legislação trabalhista brasileira a respeito do tema. A Lei nº 12.551/2011 traz uma regra específica sobre o home office.
“LEI nº 12.551, DE 15 DE DEZEMBRO DE 2011
Art. 1º O art. 6º da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei nº 5.452, de 1º de maio de 1943, passa a vigorar com a seguinte redação:
Art. 6º Não se distingue entre o trabalho realizado no estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do empregado e o realizado a distância, desde que estejam caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de comando, controle e supervisão do trabalho alheio”.
Em que pese referida legislação representar efetivo avanço, já que até então inexistia regramento específico acerca do assunto, fato é que permanecem em discussão os riscos decorrentes da adoção desse sistema, em especial:
– aqueles que dizem respeito às horas extras durante a jornada de trabalho;
– horas de “sobreaviso”;
– custos com a implantação da estrutura para suporte do home office;
– risco de eventual acidente de trabalho, no exercício das atividades laborais em sua residência;
– custos com a manutenção da estrutura do home office em si.
Normalmente a empresa institui o home office sem, no entanto, ter clareza quanto aos aspectos jurídicos envolvidos. Dessa forma, é fundamental discutir esse assunto e, principalmente, estipular regras claras e expressas para minimizar riscos ao empregador.
Levando-se em conta que o home office é um modelo de gestão relativamente novo, os tribunais se pronunciaram muito pouco sobre a responsabilidade de o empregador arcar ou não com custos de estrutura por parte do empregado.
Todavia, como a questão dos custos com a implantação da estrutura necessária ao funcionamento do sistema não é regulamentada, é recomendável que esses custos sejam arcados pelo empregador, pois a ele compete assumir os riscos da atividade econômica (CLT, art. 2º).
Também há a questão dos problemas ergonômicos envolvidos, até porque, na prática, o trabalho em ambiente ergonomicamente inadequado poderá, no futuro, gerar afastamentos do empregados ou alegação de doenças. Por isso é fundamental que o posto de trabalho seja analisado e, se possível, custeado pela empregadora.
Há, ainda, a questão do risco de eventual acidente de trabalho, em razão das atividades laborais em sua residência, o que sempre poderá gerar questionamentos e dificuldades para a empregadora demonstrar a ausência de efetivo nexo de causalidade.
Relativamente ao controle da jornada, entendemos ser aplicável regra específica, prevista no artigo 62, I, da CLT, em razão da impossibilidade de controle da jornada, estando o empregado isento de controle.
Tendo em vista que não há efetivo controle da jornada, bem como em razão da maior autonomia do colaborador em relação ao tempo despendido ao trabalho – é possível haver questionamento em relação ao pagamento de “horas de sobreaviso”.
No que se refere às horas de “sobreaviso”, é importante mencionar que não deve haver, por parte da empresa, qualquer efetiva determinação e/ou impedimento do empregado se locomover.
É certo que, quando a empresa precisar que ele fique de plantão, isso será feito através de escala própria, ocasião em que lhe será devido, como contrapartida a essa restrição, uma compensação financeira por meio do pagamento do adicional de sobreaviso.
Além disso, quando, excepcionalmente, ele for acionado pelo seu celular para comparecer à empresa e/ou realizar algum tipo de trabalho fora de seu horário de trabalho, fará jus à percepção de horas extras, com o respectivo adicional, a partir do momento da chamada.
Note-se que desta forma estaremos na íntegra na súmula 428, do TST:
Súmula nº 428 do TST
SOBREAVISO APLICAÇÃO ANALÓGICA DO ART. 244, § 2º DA CLT (redação alterada na sessão do Tribunal Pleno realizada em 14.09.2012) – Res. 185/2012, DEJT divulgado em 25, 26 e 27.09.2012
I – O uso de instrumentos telemáticos ou informatizados fornecidos pela empresa ao empregado, por si só, não caracteriza o regime de sobreaviso;
II – Considera-se em sobreaviso o empregado que, a distância e submetido a controle patronal por instrumentos telemáticos ou informatizados, permanecer em regime de plantão ou equivalente, aguardando a qualquer momento o chamado para o serviço durante o período de descanso.
Em complemento, a orientação aos gestores é que, para garantir maior segurança jurídica, haja a ratificação dessa modalidade de contratação por meio de documento específico (aditivo ao contrato individual de trabalho), de forma a estabelecer as diretrizes pertinentes a essa nova modalidade de prestação de serviços, inclusive prevendo que não haverá controle de horário de trabalho, nos termos do artigo 62, da CLT.
André Villac Polinesio é sócio do escritório Peixoto e Cury Advogados e Mestre em Direito do Trabalho pela PUC-SP.