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De olho na qualidade do teleatendimento



Autora: Rosa Maria C. Costa

 

Falar sobre pessoas que atuam no segmento do teleatendimento é algo estimulante e novo para mim. O mercado de trabalho brasileiro está voltando seu olhar para essa óbvia realidade porque percebem que não há tecnologia que garanta o crescimento dos lucros e a expansão das empresas se esquecermos as pessoas que a compõem.


O teleatendimento é um segmento do relacionamento empresa-cliente que surge a partir da necessidade das empresas chegarem mais rapidamente ao cliente ou então de escutar-lhe mais rapidamente as queixas. A empresa se virtualiza e com ela as pessoas. O atendimento se transforma no paradigma do virtual e, os operadores se transformam em uma voz por detrás da ligação.


As empresas crescem estrutural e economicamente. Mas, enfrentam um grande problema, os operadores que trabalham nesse setor não estão preparadas para atuarem da forma como se espera. Bem, e o que realmente se espera deles? Que vendam cada vez mais, que diminuam os indicadores de ações judiciais, que respondam com qualidade às dúvidas dos clientes e assim, garantam mais e mais vendas? Que escutem carinhosa e cuidadosamente o problema do cliente e o encaminhe para a melhor solução? Que, por detrás do telefone aquela voz mágica resolva os problemas e dúvidas e venda os sonhos que querem comprar?


A grande questão inicial, pelo menos para mim, psicóloga e educadora é, essas pessoas foram preparadas para esse trabalho? Culturalmente nosso povo foi preparado para ser assertivo e ousado? Quem são as pessoas que buscam esse trabalho?


Algumas respostas. Os indicadores principais do segmento apontam que esse é o tipo de trabalho escolhido por jovens em busca do primeiro emprego e dentre esses, que estimulante, a maioria são mulheres. Esse detalhe me chamou a atenção tão logo entrei em contato com esse universo maravilhoso na cidade de São Paulo.


Sim, em São Paulo fui despertada para essa área. Pelas características do trabalhador e também pelas características do próprio trabalho. Jovens e ainda, mulheres são minhas áreas de estudo. Sou uma pesquisadora curiosa por essas duas segmentações da organização social. Assim, fui provocada a olhar e buscar entender para depois, contribuir.


O setor divide-se em função das características diferenciadas de atendimento: call center ou contact center, telemarketing, help desc, SAC, e assim vai. Os primeiros têm como objetivo o atendimento ativo ou passivo para vendas, os últimos estão na modalidade esclarecimentos de dúvidas ou escuta de reclamações e problemas do consumidor.


Entre o call center e telemarketing aumenta o número de empresas privadas que, ou terceirizam o serviço ou criam os seus próprios. Os bancos são grandes clientes desse segmento, assim como dos SAC, com a característica de que os bancos costumam terceirizar o serviço.


Então, temos ai uma característica interessante ainda, são operadores contratadas para tocarem o imaginário, em sua grande maioria sequer são trabalhadores da empresa que representam. São funcionários contratados por uma empresa terceirizada que tem como objetivo principal servir o melhor possível ao seu cliente e isso se quantifica por meio das metas que o contratante define, e que a empresa que contrata deve conseguir atingir, sob pena de perder a conta e, por vezes, transformar em desempregados um grande número trabalhadores.


Situação estranha essa não? Mas, ainda acrescenta-se a esse cenário outro dado bastante interessante: esse é um segmento do mundo do trabalho que oferece muito mais vagas do que há procura. Não se extingue a oferta, as empresas estão sempre com as portas abertas para quem quer trabalhar. Veja só, que maravilha! Então, o que acontece?


Mais dados, por que existe tanta oferta e ao mesmo tempo um turn-over tão alto? Será que, nesse segmento, o turn-over deixa de ser um ponto negativo da empresa e passa a ser característica natural? Será que as empresas devem se habituar às constantes trocas de colaboradores e se prepararem para a rotatividade? Será que, o adequado seria termos outros níveis de educação para o trabalho que preparassem essas pessoas para entrarem e se manterem?


Colhendo dados consigo entender que, apesar de haverem sempre vagas abertas as pessoas estão sempre sendo demitidas e o principal motivo é não estão preparadas! Essa é a resposta dada pelos empregadores, mas o que pensam e sentem os trabalhadores? Entendo que precisamos buscar essas respostas para pensar estratégias que diminuam no bolso do empregador os gastos com constantes demissões e contratações, pois, não se iludam, esse problema gera gastos e de altos valores para a empresa. Outra questão séria são os indicadores de qualidade. Trocando pessoal a toda hora a empresa não consegue atingir um patamar de excelência.


Fico me perguntando, mas o que significa estar preparado? Pelo que já entendi significa conseguir aprender rápido e bem as técnicas do setor, mas, mais importante, possuir características de personalidade e comportamento que sejam as esperadas para o trabalho. Dentre essas, qualidade no poder de persuasão, assertividade, voz clara e que tenha o dom de convencer. Pontualidade, compromisso com as metas e com a empresa em que trabalham, capacidade de receber ordens, de responder prontamente ao cliente se utilizando das informações que possui sobre o produto e também da sua capacidade interna de informações e de persuasão. Isso, para falar de algumas e ainda, para falar daquela pessoa que está no atendimento direto.


Sim, porque tem mais, muito mais. Esse é um trabalho estratificado, possui várias hierarquias no processo de atendimento. Existem funcionários que controlam, orientam, fiscalizam e monitoram. Os que não estão com o fone no ouvido, geralmente, já estiveram nesse lugar. É comum, no segmento, que monitores e supervisores já tenham sido operadores. Outra coisa interessante: relações de poder. Que tipo de relação essas pessoas que já foram operadores estabelecem com os que o são atualmente? Outra grande questão!


Sabemos que essa relação é muito conturbada. Que os que controlam também não são preparados e em algumas situações, são os responsáveis pelas constantes perdas de pessoal. E de onde vem o monitor e o supervisor? A empresa promove o bom operador para esses cargos e depois, algumas vezes, têm que lidar com o fato de que, um ótimo operador se apresenta um péssimo supervisor. Despreparado para exercer cargo de gestão acaba sofrendo do que, em psicologia e administração, chamamos efeito Halo, o selecionador contamina a escolha e treinamento dos operadores a seu cargo sentindo-se ameaçado pelo potencial do outro e o medo de ser trocado. Ou ainda, contrata sendo contaminado por características pessoais, beleza, conhecimento prévio, gerando rotatividade.


Não param de aparecer temas interessantes de pesquisa. Estou com uma cesta repleta de frutas suculentas e preciso escolher quais as que vou conseguir comer e em que ordem. Difícil né! Agruras da pesquisa temos que definir o objeto e o foco, senão corremos o risco de nos perdermos pelo caminho e não obter nenhuma resposta que seja realmente contribuidora para a coletividade.


Sim, pesquisa é isso, pelo menos em minha opinião. Vou debruçar meu olhar sobre esse segmento do trabalho humano, fazer perguntas e encontrar respostas que sejam úteis e possam contribuir com a mudança para melhor do universo vivencial, empregadores e empregados. Esse é o meu desejo e a minha responsabilidade social.


Tenho a impressão que nesse segmento, assim como todos os segmentos de trabalho humano, vou encontrar uma situação de que sempre falo nas salas de aula e nos espaços de políticas públicas. O país não preparou pessoas para atuarem de forma independente, ousada, assertiva, criativa. Não preparou lideres. E agora, globalizado, necessita urgentemente desses. Todos dizem que o trabalhador tem que melhorar o desempenho, deve trabalhar com a inteligência, deve ser ousado. Acontece que ninguém ensina como. Ninguém se dispõe a ajudá-los a se conhecerem e aprenderem a reconhecer e mudar seus padrões mentais. Mas, como diz o meu amigo Sérgio, o mundo não evolui aos saltos.


Rosa Maria é psicóloga, mestre em educação com especialização em atendimento de família e casais do trabalhador. ([email protected])

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