O futuro do trabalho

 Autor: Claudio Garcia
É interessante o fato de a profissão moderna de enfermeiro ter aparecido somente há 150 anos, apesar da doença ser uma condição que sempre nos acompanhou.
Cuidadores existiam até então, mas se restringiam aos familiares próximos, amigos, religiosos (freiras, por exemplos) ou, raramente, a voluntários.
Foi então que, no século 19, uma nobre britânica chamada Florence Nightingale se dedicou a cuidar de doentes, acreditando que uma boa educação e princípios científicos poderiam ajudar nessa recuperação. Sua atuação na guerra da Crimeia e consequente redução do número de mortes entre os soldados feridos foi amplamente divulgada na sociedade britânica. No final do século 19, quase toda a sociedade ocidental adotava a ideia de Florence de ter enfermeiros capacitados em hospitais.
Pela previsão de especialistas, essa profissão ainda tem muito futuro. Empurrada pelo aumento da renda e por uma população que vive mais, se espera que enfermagem seja uma das profissões que mais crescerá no setor de saúde. Estima-se de 80 a 130 milhões de novas posições até 2030, o que representa 2 a 4 vezes mais do que as relacionadas à área de tecnologia. Assim como na saúde, outros setores tradicionais também criarão mais postos do que a tecnologia, como o de varejo, construção e educação.
Todo o “buzz” relacionado à tecnologia e ao futuro do trabalho criou a falsa percepção de que as posições na área serão predominantes no futuro. Elas são uma boa opção de carreira, estão crescendo e irão crescer, mas estão longe de serem predominantes no mercado de trabalho. Pensar dessa forma reduz a ansiedade, principalmente de pais que me perguntam se deveram colocar os filhos em escolas de programação para prepará-los para a vida.
Pensar a carreira no futuro não será tão diferente do que deveria ser hoje. O mundo deverá ter muito trabalho, apesar dos prognósticos relativos à automação e à eliminação de posições. Antigas profissões continuarão a existir, várias vão sumir e outras aparecerão. Um lado positivo é que, em vez de menos teremos mais opções.
As possibilidades não são só em relação ao trabalho em si. O modelo de emprego que conhecemos ainda será predominante por muito tempo, como mostram recentes levantamentos estatísticos. Mas o trabalho do profissional autônomo qualificado, que já tem sido mais aceito por grandes corporações, assim como o trabalho temporário, deve crescer. Ambos se beneficiam das plataformas de negócio que conectam a oferta e a demanda por esses serviços.
Mas, isso não significa que todos serão bem-sucedidos. Excluindo os modelos de gestão econômica ou sistemas políticos que excluem multidões de postos de trabalho, existem tendências que contribuem para aumentar esse risco. A tecnologia tem um papel fundamental nisso. A enfermagem evoluiu muito desde os tempos de Florence. Novas tecnologias permitirão que muitas das tarefas hoje realizadas por médicos sejam transferidas para enfermeiros e realizadas com eficácia mesmo longe de hospitais.
A maioria das profissões não estará na área de tecnologia, mas ela transformará praticamente todas as formas de trabalho. Assistentes digitais, inteligência artificial e sensores inteligentes mudarão a maneira como fazemos as tarefas, como aconteceu com o e-mail na década de 90.
O legal é que não será necessário aprender a programar para isso. Será preciso apenas o mínimo de curiosidade e criatividade para aplicar a tecnologia. E essas são habilidades que temos desde criança até que o sistema de educação nos condiciona a dar as respostas certas para nos sentirmos aceitos. Passamos então a viver sempre sob a ameaça de falharmos. Esse é o fardo que a maioria carrega em suas carreiras e que é reforçado pelas organizações.
Carreiras em sua maioria não são lineares, mas desenvolvidas ao longo do tempo, seja por nossas buscas pessoais ou por influência de fatores externos. O sucesso da transição do mundo do trabalho atual para o futuro requer mais do que capacitação. Ele exige um novo modelo mental para interagimos que seja estimulado pela curiosidade e pela vontade de realizar. Características que devíamos ter à disposição, mas que somos condicionados como sociedade a esquecer.
Claudio Garcia é vice-presidente executivo de estratégia e desenvolvimento corporativo da LHH

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Rolar para cima