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O mundo dá muitas voltas

Autor: Edilson Menezes
A vida, às vezes, acorda de ótimo humor e abre um belíssimo sorriso sob o formato esplendoroso do sol. Em outras ocasiões, um pouco mais irritada, acorda com nuvens carregadíssimas, disparando raios e ecoando poderosos trovões. A brincadeira do relógio começa e o ponteiro que registra um momento feliz aqui, testemunha também um instante de tristeza acolá.
Rogerio saiu de casa muito disposto para uma entrevista de emprego. Pesquisou a história da empresa, procurou reclamações de clientes a fim de sugerir sua contribuição para melhorias e saiu de casa com tempo suficiente para chegar. Subitamente, viu-se parado no trânsito desencadeado por uma manifestação que protestava contra o desemprego.
Os manifestantes tinham acabado de fechar a via pública. Com rapidez cinematográfica, a barricada de pneus foi estruturada e não tardou mais que alguns minutos para que o fogo fosse ateado. Rogerio decidiu sair do carro para conversar com aquela que parecia ser a líder do evento.
– Moça, posso entender que vocês têm uma causa justa. Eu também estou desempregado e a caminho de uma entrevista que pode ser minha grande chance. Pode falar com seus amigos e liberar a passagem do meu carro?
A moça pensou um instante e foi conversar com um rapaz cabeludo. De longe, Rogerio a viu argumentando e apontando em sua direção. Retornou no momento seguinte, com a expressão desanimada.
– Tentei negociar, mas se eu abrir pra você passar, os outros motoristas vão querer furar nosso bloqueio. Dá não, camarada!
– Moça, por favor me entenda. Eu saí cedo de casa, me preparei um tempão pra ser aprovado. Tenho dois filhos e preciso do emprego.
A manifestante não cedeu. Rogerio perdeu a entrevista. Ligou na empresa e pediu remarcação.
– Espero que me entenda, Cinthia. Eu me organizei para chegar à entrevista no mínimo com uma hora de antecedência, mas esta manifestação…
Cinthia disse que entendia, afirmou que entrevistaria os candidatos agendados e prometeu ver a possibilidade de remarcar. Isso não aconteceu. Horas depois, um candidato foi contratado. Suas qualificações não superavam o que Rogerio tinha a oferecer, porém Cinthia não tinha tempo a perder. A lista de contratações para aquela semana era imensa.
Alguns dias depois, Rogerio aceitou um emprego. Não era o trabalho dos sonhos. Contudo, levaria dinheiro para o lar.  Seu novo líder imediatamente percebeu que Rogerio era qualificado demais, uma verdadeira ameaça e cedo ou tarde tomaria sua vaga.
Começou uma silenciosa e discreta perseguição. Três meses se passaram e depois de muito assédio moral, boicote e humilhações de toda sorte, Rogerio entrou em depressão. Foi procurar a psiquiatra indicada pelo primo, a quem confidenciou tudo que vinha acontecendo. Quando chegou ao consultório, sua surpresa não poderia ter sido maior. A moça que liderava a manifestação estava diante dele. Era a recepcionista. Reconheceram-se imediatamente.
– Bom dia. Tenho consulta marcada com a Dra. Silvia!
– Bom dia! Olha, eu sei que você me reconheceu. Ontem foi meu primeiro dia neste trabalho. Se pudesse ser discreto em relação ao nosso encontro naquelas circunstâncias, eu agradeceria.
Rogerio sorriu. Disse que ficasse despreocupada. Entrou para a consulta e deixou a sala sentindo-se mais leve. No momento de deixar o consultório, a recepcionista o abordou.
– Naquele dia, você tinha um emprego a disputar e eu tinha uma causa. Eu perdi. Espero que tenha conseguido o trabalho e se não conseguiu por nossa causa, espero que possa nos perdoar.
– Eu não consegui. Acabei arranjando outro trabalho muito ruim e o resultado foi um processo de depressão que inclusive me trouxe aqui hoje. Quanto a vocês, nada a perdoar…
A recepcionista disse algo que mudaria para sempre a vida de Rogerio.
– Não sei se isso serve de alguma coisa. Eu me arrependo. Se fosse hoje, abriria o bloqueio para você passar, mesmo a contragosto do líder.
Rogério viu a oportunidade de sua vida naquela frase. Agradeceu, abraçou a moça e saiu correndo dali. A recepcionista pensou:
Eu hein? Não é à toa que veio ao psiquiatra. Não entendi nada!
Rogério pediu demissão e inspirado pela frase da recepcionista, abriu um negócio inédito no Brasil: uma consultoria especializada em negociação de conflitos envolvendo manifestações. Sua empresa foi contratada por governos, empresas, movimentos, ONG’s, sindicatos e fazendeiros. O negócio consistia em negociar com os manifestantes, evitando o conflito armado com a polícia, o derramamento de sangue entre aqueles que tinham os ânimos mais exaltados e a resolução do impasse através de uma reunião por Skype que ele fazia bem ali, no calor da manifestação, entre o líder do protesto e a outra parte.
A imprensa noticiava a intervenção de sua empresa em conflitos internacionais envolvendo o Greenpeace, entre trabalhadores rurais e seus patrões, entre sindicalistas e operários, entre organizações e governos. Onde quer que houvesse um conflito, sua empresa estava lá. Em tempo recorde, alcançou patamares invejáveis de faturamento e foi capa de uma série de revistas e jornais. Por aqueles dias, o primo perguntou a Rogério sobre a depressão e sua resposta o fez rir.
– Que depressão?
Seis meses se passaram até que um dia a recepcionista chegou ao consultório e encontrou belíssimas flores. Correu para ler o bilhete, pensando que era de seu namorado. Não era…
– Você disse que tinha perdido a causa por mais empregos pela qual lutava naquela manhã. Pode até ter perdido, mas você me inspirou. Estruturei uma empresa especializada em resolução de conflitos envolvendo manifestações e com apenas seis meses de existência, já operamos em todo território e até fora do Brasil. Preciso contratar uma vice-presidente para assumir os trabalhos no país enquanto desenvolvo nosso negócio pelo mundo. O salário é de 35 mil reais com todos os benefícios pertinentes à vaga executiva. Se aceitar, o processo seletivo que ainda nem foi iniciado será encerrado e a vaga é sua!
Obviamente, ela aceitou.
O mundo dá mesmo voltas tão intrigantes e interessantes que se focarmos somente naquilo que aparentemente é negativo, quebraremos a dinâmica positiva que nos é reservada por direito universal.
Antes de lamentar, dê uma chance a três personagens: o mundo, o tempo e você. Os dois primeiros escondem os melhores tesouros atrás das cortinas negativas e fechadas que parecem impedir o espetáculo da vida, mas assim que você permite, estas cortinas se abrem e revelam a merecida plenitude para a qual todos fomos criados.
A escolha, como sempre, é apenas sua!
Edilson Menezes é treinador comportamental e consultor literário. Atua nas áreas de vendas, motivação, liderança e coesão de equipes. ([email protected])

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