Reter é não reter



Autor: José Augusto Figueiredo

 

Um desejo comum a todas as empresas e que ganha cada vez mais atenção nos últimos tempos é a chamada retenção de talentos. O tema tem sido o sonho de consumo e, ao mesmo tempo, o pesadelo de muitos gestores desde o início do apagão de talentos. E, agora, com as perspectivas positivas de crescimento para o Brasil, intensifica-se a disputa pelos melhores profissionais do mercado. Pensar em retenção de pessoas é mais complexo do que se julga e talvez represente um dos maiores desafios para questão da sustentabilidade humana nas organizações.

 

Antes de desenhar manuais de melhores práticas ou definir estratégias sobre este tema, é importante avaliar de uma forma mais humana e observar que a retenção de profissionais pode ser um grande paradoxo. Isso porque é uma utopia quando tratamos de pessoas que sentem, se emocionam e aspiram de forma consciente e, muitas vezes, inconscientemente. Como assim? Pode soar estranha a afirmação, mas observamos que um dos principais valores dos talentos no cotidiano profissional é a liberdade. E como reter alguém que preza tanto a liberdade? De uma forma simplificada, quem busca tanto permanecer nos quadros da empresa tende a ser avesso à própria retenção.

 

Isso prova como a questão exige reflexão. O quadro fica mais óbvio quando lembramos que ser percebido como talento é algo diretamente ligado a um contexto. Alterado minimamente o contexto, alguém que outrora era preterido pode vir a ser percebido como um novo membro do seleto hall de talentos, o que pode alterar a decisão de permanecer ou querer ser parte de uma determinada organização. Afinal, para ter satisfação no trabalho, as pessoas precisam necessariamente ser reconhecidas pelo desempenho profissional. Muitas vezes elas precisam ser reconhecidas pelo não-desempenho e, mesmo que isso doa, pelo conhecimento da possibilidade de aprendizado e de melhora. Sem reconhecimento, é fácil chegar à conclusão de que as tarefas do dia a dia não têm significado e não condizem com os objetivos pessoais.

 

Sabendo destas premissas, as empresas devem refletir e estabelecer como prioridade alguns pontos na relação com seus talentos. Em primeiro lugar, é importante comunicar com clareza os valores adotados, para que o profissional tenha a possibilidade de compreendê-los e de avaliar se a visão da organização, da área ou do seu líder está alinhada ao seu projeto ou aspiração pessoal. Tem que fazer sentido! Por isso, é possível afirmar que as companhias que transmitem claramente sua identidade estratégica e garantem ao seu time meios para refletir sobre ela são as que maximizam a parceria com seus talentos. Elas não os retêm, elas os atraem. É importante ainda que exista atitude de comunicação aberta para criar um ambiente favorável à expressão, pois talentos adoram e precisam se expressar.

 

Dar ao time esta abertura, assim como perspectivas sobre o futuro dos negócios e projetos, viabiliza a mobilização das pessoas dentro e fora da organização, de forma que os sonhos de indivíduos e organização se misturem. É isso que se busca: a parceria de empresas com seus talentos não pode mais ser pensada somente dentro das fronteiras da organização!

 

A empresa, antes de sinalizar quais são as oportunidades e desafios que o profissional tem à disposição, deve procurar perguntar aos seus talentos quais os sonhos que já os mobilizam e que eles querem realizar. Um ponto crucial nesta parceria entre profissionais e companhias é a famigerada sucessão. É fundamental que o tema seja tratado com transparência. Deve ser mostrado ao profissional quais competências deve desenvolver a fim de estar pronto para assumir novos papéis no futuro.

 

Algumas ações práticas são eficazes na gestão da parceria entre talentos e empresas. Promover trabalho por projetos, por exemplo, é uma forma de dar energia e desafios ao time, principalmente para as gerações mais jovens, com altas expectativas. Dessa forma é possível ter claro o começo, meio e fim de um trabalho e consequente resultado. Esta forma ainda faz com que a equipe possa transitar em diversas áreas da empresa, o que proporciona entusiasmo e também expertise em diferentes frentes.

 

Algumas organizações já sabem o tamanho do problema, mas ainda não têm ações consistentes e sistêmicas para a parceria com talentos. Muito da incapacidade para solucionar este problema pode estar ligada à própria falta de preparação dos atuais executivos e líderes que, em sua maioria, cresceram dentro de um modelo mental pré-estabelecido, no qual a parceria com talentos não era necessária, uma vez que acreditavam que o matrimônio com a empresa era para vida toda. O grande desafio é preparar os atuais líderes para a importância da flexibilidade que a parceria com talentos exige.

 

José Augusto Figueiredo é COO da DBM América Latina e presidente do International Coaching Federation – ICF Brasil.

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