Autora: Solange Mata Machado
Imagine a cena: Você é um jovem adulto chegando à universidade para a sua aula favorita. Hoje será o dia da entrega da prova final. A sua expectativa é alta, pois tanto o professor quanto o conteúdo da disciplina têm sido muito motivadores. O professor está entregando o resultado do exame final e a sua nota foi um pouco acima da média para passar. Desanimador! Ao sair da escola, descobre que para não chegar atrasado a sua aula preferida, você estacionou em local não permitido e acabou levando uma multa. No caminho de casa, querendo desabafar com seu melhor amigo, faz uma ligação e recebe como resposta “cara, agora não dá, me liga mais tarde!”. Como você se sentiria depois destes episódios acumulados em um mesmo período? Frustrado? Rejeitado? A vida não está sendo generosa, seu professor querido e admirado parece não gostar de você. Ou, olharia esta mesma situação como um ponto de interrogação. Quem sabe precisa ter mais atenção, estudar mais, ser mais cuidadoso na hora de estacionar o carro, entender que seus amigos não estão disponíveis 24 por 7. Qual das duas reações seria mais compatível com você?
A professora da Universidade de Standford, Carol Dweck, define, em seu livro “Mindset: A nova psicologia do sucesso”, o mindset como crenças que as pessoas têm sobre a natureza das características humanas. Especificamente, o conceito de mindset está centrado na crença de poder ou não alterar os traços ou as características pessoais. Se as pessoas acreditam que os traços – como inteligência, personalidade, habilidade esportiva, musical etc. – não são controláveis e por isso não podem ser mudados, elas endossam o mindset fixo. Se, por outro lado, as pessoas acreditam que essas características são controláveis e mutáveis com esforço, elas fazem parte do mindset de crescimento.
As pessoas que acreditam que nasceram inteligentes e que essa capacidade inata é definitiva, usam preferencialmente o mindset fixo. Elas sabem que são capazes, gostam de ser admiradas pelo que sabem, e se sentem frustradas com o erro, além de entenderem as críticas como ofensas pessoais. No caso do jovem adulto que teve um dia ruim, se ele tiver mindset fixo, a sua reação é uma sucessão de pensamentos negativos. Se sentirá frustrado, perdido, traído pelo melhor amigo que não o atendeu, acha que o professor da sua matéria preferida é um sacana. Olha para o mundo como se fosse uma enorme conspiração contra ele.
Por outro lado, existem pessoas que sabem analisar os fatos reais de uma maneira mais positiva. E entendem que podem mudar drasticamente a maneira como pensam. E, com isso, podem alterar suas crenças. “Não é o mundo que está conspirando contra mim. Sou eu mesmo que preciso mudar. Ser mais atento e cuidadoso!” Estas são pessoas que ficam no extremo oposto do espectro do mindset. São entituladas de mindset de crescimento. São pessoas que sabem trabalhar com seu grau de atenção e comprometimento para fazer uma mudança deliberada. Ao contrário das pessoas de mindset fixo, essas pessoas entendem que as críticas e os erros são essenciais e representam um alerta para que aprendam mais, esforcem-se mais e se comprometam mais para chegar ao objetivo traçado. Além de se inspirarem no sucesso de outras pessoas que estão em patamares de excelência superior aos seus. Na verdade, somos uma combinação dos dois tipos de mindset. O que precisamos perceber é qual deles é mais predominante, pois, será ele que determinará a maneira como penso e reajo frente aos desafios do dia-a-dia. O mindset praticamente permeia em todos os momentos da nossa vida. Quer seja na escolha de palavras e atitudes, quer seja na interpretação de como eu leio um anúncio ou um artigo e me posiciono com relação ao que li.
Um estudo de 2015, publicado na revista Science, mostrou que existe um desbalanceamento de gênero entre mulheres e homens nas disciplinas relacionadas com as áreas das ciências, tecnologia, engenharia e matemática. Uma das causas apontadas neste estudo são os estereótipos criados de que as mulheres não possuem este tipo de talento. Será que talento é uma capacidade nata ou pode ser desenvolvido? No estudo, Sarah-Jane Leslie e seus colegas, descobriram que em alguns campos técnicos, talentos são natos e pertencentes ao gênero masculino. Este tipo de comportamento retrata o mindset fixo que privilegia gênero e não capacidade de aprendizado.
O X da questão é como as empresas estão se posicionando. Quando se observa anúncios de contratação ou a busca desenfreada por talentos é nítida a obsessão pelo candidato mais inteligente, brilhante e com currículo exemplar. Em termos de mindset de crescimento, seria mais adequado buscar candidatos que estão abertos ao aprendizado contínuo e que busca desafios novos. Em uma pesquisa de empresas de contratação americana, foram analisados o texto dos anúncios colocados pelas empresas, para ver se a construção da frase na oferta de admissão tinha um sentido de mindset de crescimento ou fixo. E, se por causa desta frase, haveria ou não um viés de contratação pendendo para o gênero masculino. O resultado da pesquisa mostrou que, em média, as posições preenchidas por mulheres, tendem a ter duas vezes mais palavras ou sentenças que remetem ao mindset de crescimento como: busca pelo desenvolvimento, altamente motivacional, comprometimento e aprendizado. Outra constatação da pesquisa foi que os postos com alta densidade de palavras que remetem ao mindset fixo são preenchidos 11 vezes mais lentamente.
Este exemplo comprova que, o que pensamos e como nos comunicamos é um reflexo das nossas crenças, e tem um impacto direto na construção da nossa realidade. Dói profundamente fazer mudanças na forma como pensamos. Se as crenças que temos sobre nós mesmos e sobre o mundo não forem alteradas, não conseguiremos mudar capacidades e comportamentos. Pois, são as crenças que motivam ou inibem as nossas capacidades e nossos comportamentos. Como neurologicamente as nossas crenças estão ligadas ao sistema límbico, que é inconsciente, temos um desafio grande. Podemos perceber o sentimento decorrente da nossa emoção, porém não temos controle sobre elas. Para mudar o nosso mindset, temos que ter consciência sobre as nossas crenças. que não é fácil! Para isso, precisamos nos autoconhecer, perceber como pensamos, como nos comportamos e como reagimos a determinados estímulos externos e internos. O passo seguinte é criar novos hábitos e, para isso, é preciso ter disciplina e esforço. A repetição de novos hábitos gera novos comportamentos, novas capacidades que formarão novos caminhos neurais que, ao se sedimentarem, se tornarão novas crenças. Um mesmo cérebro, mas com opções de caminhos neurais, que geram dois tipos de mindset.
Solange Mata Machado é diretora-executiva da Imaginar Solutions.