Deborah Fagundes, líder de vendas da Kyndryl Brasil

A escuta como potência para a diversidade

A troca de ideias, conversas e histórias em comum entre mulheres nos levam a repensar medos e angústias, podendo lidar melhor com nossa vulnerabilidade

Autora: Deborah Fagundes 

Neste mês, em que se comemora o Dia Internacional das Mulheres (8 de março), aproveito para falar de um assunto importante. Embora ache que não precisemos de uma data para refletir sobre alguns temas, essa celebração sempre abre o debate entre pessoas que não costumam pensar sobre pontos importantes e sob a ótica da mulher. Com isso, podemos ampliar a nossa escuta e a da sociedade, vivenciando, ainda mais, a importância do escutar para repensar conceitos.

Minha reflexão sobre muitos aspectos desse “ser mulher” é constante, principalmente no mercado de trabalho. O que leva uma turma de Engenharia ser formada, muitas vezes majoritariamente, por homens? Por que as meninas não têm interesse por disciplinas como matemática e ciências? Se olharmos os dados da Organização das Nações Unidas (ONU), as mulheres representam apenas 35% dos estudantes matriculados em STEM (termo em inglês para as áreas de ciência, tecnologia, engenharia e matemática) nas universidades. No mundo corporativo, este número é ainda mais baixo. Isso é uma questão preocupante porque sabemos o quanto a diversidade gera inovação e, essas áreas, além de terem ótimas oportunidades de trabalho, são excelentes ambientes para inovação.

No meu caso, a escolha pela Engenharia não foi fácil. Eu fiz testes vocacionais que me mostraram com características equilibradas entre exatas, biológicas e humanas! Um verdadeiro stress para quem tinha 17 anos de idade. Acho que a minha mente foi capturada pela Engenharia por eu gostar muito de física e matemática, e meu coração foi capturado quando eu vi o quanto essa era uma profissão abrangente e que prepara os profissionais para a resolução de problemas. Essa formação é muito focada em ensinar a pensar, planejar, priorizar e executar. E isso me encantou!

Acho que muitas meninas não têm ideia desse leque de possibilidades, elas apenas torcem o nariz para as disciplinas de exatas por acharem que é “chato”, que não é algo para elas ou que não darão conta. Por isso, é muito necessário escutar de alguém que vive as profissões para perceber que não é bem assim.  Eu, particularmente, faço o meu papel, falando da minha formação e do quanto ela me ajudou a trilhar os caminhos profissionais que escolhi.

Mas acredito que as empresas de tecnologia também têm um papel importante em despertar esta curiosidade nos jovens. Aqui na Kyndryl, acabamos de anunciar uma parceria com a United Way em uma iniciativa de voluntariado para apresentar conceitos STEM a estudantes e professores da América Latina. Só no Brasil 460 voluntários trabalharão com mais de mil estudantes para inspirar a sua curiosidade nas carreiras STEM e ajudá-los a desenvolverem as habilidades necessárias para entrar no mercado de trabalho na área de tecnologia.

Mas um aspecto que faz diferença no caminho dessas jovens mulheres, quando estão na encruzilhada de qual profissão escolher, é o apoio da família, com conversas que deveriam começar com uma escuta atenta, muito antes de dar conselhos com opiniões fechadas ou, por vezes, enviesadas com conceitos machistas. O maior incentivo que tive dos meus pais foi me valorizar pelo meu esforço, independentemente do resultado, o que me leva a ter segurança para fazer o que eu acho certo.

Meus pais sempre me apoiaram para alcançar o que me faria feliz, simples assim! Meu pai é economista e minha mãe é professora e, até hoje, conversamos sobre decisões de vida e as contrapartidas que cada escolha envolve. Não foi diferente no momento da minha decisão de cursar Engenharia…eles foram os primeiros “coaches” da minha vida! Hoje tento passar o mesmo para as minhas filhas de 12 e 15 anos.

Tecnologia e preconceito

Um tema recorrente quando converso sobre liderança no mercado de tecnologia é o preconceito. Sempre me perguntam se sofro ou sofri preconceito e eu digo que sim, pois ele é inerente num mercado que sempre foi muito masculino. No meu caso, além de trabalhar em TI, eu atuei por muito tempo com o segmento financeiro que também tem um perfil similar. Certamente, demorei mais tempo do que deveria para ter a confiança e a aceitação de diversos interlocutores e interlocutoras (pasmem!) durante a minha carreira.

Mas o que fez a diferença foi, apesar disso, ter seguido trabalhando, mostrando o valor do meu trabalho com os resultados dos projetos que entregava, com o engajamento de meus times e pares e com a satisfação de meus clientes. Tem uma frase que eu levo sempre comigo que é: “tenha o coração no lugar certo”. Eu acho que o coração, nessa frase, significa meus valores, o que eu realmente acredito, o que me faz acordar todos os dias motivada… E isso sempre me deu o impulso para seguir, mesmo enfrentando preconceitos ou julgamentos parciais. 



Algo que nos ajuda a seguir e a confiar é contar com outras mulheres. Sempre contei com mulheres que me inspiraram e me ajudaram. A “troca”, as conversas, as histórias em comum nos levam a repensar medos, angústias e aceitar a nossa vulnerabilidade. Hoje eu amo ser mentora de mulheres. Acho que a bagagem de anos na indústria acumula histórias que, quando compartilhadas, podem apresentar caminhos para que as mulheres alcancem o que desejam alcançar! Sem fórmulas mágicas…com reflexões, autoconhecimento, planejamento e networking (sim amigas…networking é necessário, além do esforço!!). Trabalho também com grupos de mulheres, proporcionando essas conexões e trazendo temas de reflexão que nos provoquem a seguir em frente e buscar cada vez mais o espaço que devemos e queremos ter!

Por três anos, fui líder de uma rede de inclusão de mulheres e aprendi muito com todas elas! Dessa época, sempre me lembro de uma discussão que eu tive sobre termos homens nas nossas reuniões, ponto que eu defendi desde o primeiro dia. Eu acredito que um olhar masculino no debate faz muita diferença em dois aspectos. O primeiro é poder educá-los para que eles entendam os dilemas das mulheres e possam ser porta-vozes nas suas “rodinhas profissionais e pessoais”, ajudando na transformação que precisamos. O segundo é poder escutar a opinião deles sobre os temas para entendermos um modelo mental diferente do nosso e exercitar a empatia para buscar a transformação. Essa é uma troca rica na qual todos saem fortalecidos! 

Hoje, sou executiva “sponsor” do grupo de inclusão de LGBTQIA+ e conseguimos tocar em um tema de extrema importância que é a interseccionalidade. Eu vejo nitidamente histórias da potencialização do viés e do preconceito quando estamos tratando de uma mulher lésbica, por exemplo. Mas eu só consegui ter ideia disso porque me sentei com as pessoas e escutei. De novo, trago a importância da escuta! Participamos do que chamamos de mentoria reversa, ou seja, eu escuto sobre uma realidade totalmente diferente da minha, eu pergunto, tiro dúvidas e aprendo!

Isso é riquíssimo e essencial na nossa sociedade. Escutar e procurar entender quem é diferente de nós e saber aproveitar, ao máximo, a beleza da junção de bagagens tão diversas. Convido a todas e todos a praticar a escuta neste mês em que se comemora o Dia Internacional da Mulher, e que levem esse hábito para todos os outros dias de suas vidas.

Deborah Fagundes é líder de vendas da Kyndryl Brasil.

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