A incorporação da CX jurídica sinaliza uma transformação profunda na abordagem corporativa, tornando a prevenção de conflitos e a promoção de soluções amigáveis pilares fundamentais
Autor: Katsuren Machado
No cenário corporativo atual de grandes transformações, com uma crescente disputa e consumidores com expectativas em evolução, investir em uma experiência do cliente excepcional emerge como um diferencial estratégico.
A era da experiência está revolucionando a maneira como construímos relacionamentos com clientes e parceiros de negócio, inclusive em processos que envolvem a atuação jurídica.
Entre os segmentos que estão sendo impulsionados com inovação, o jurídico se reinventa com uma prestação de serviços que vai além do conhecimento e que amplia os conceitos sobre a percepção geral de justiça, transparência e acessibilidade à informação.
Basta uma rápida análise para constatar que o setor jurídico tem sido predominantemente acionado para resolver conflitos legais em um contexto de insatisfação do cliente. No entanto, ao incorporar os princípios de Customer Experience à uma abordagem que integra diversas áreas incluindo a jurídica, as organizações em todo o mundo estão trabalhando ativamente para a redução de potenciais insatisfações de forma não só reativa, mas principalmente preventiva.
A criação de canais de comunicação transparentes e eficientes, a disponibilização de informações claras sobre produtos e serviços, e o estabelecimento de protocolos de resolução de problemas de forma eficaz não apenas aprimoram a experiência do cliente, mas também abrem vias para a resolução de questões antes que se tornem processos judiciais.
Um case muito conhecido e relevante é o redesenho de cláusulas contratuais pela Shell em 2017 e que chegou a ser publicado no Financial Times após a repercussão dos resultados gerados. Os contratos eram extensos e muito complexos, onde segundo Adam Khan, consultor global da Shell, os gerentes de contas investiam tempo para a construção de relacionamento com os clientes, que eram prejudicados no momento da negociação contratual.
Os contratos foram simplificados para serem mais fiéis à representação dos relacionamentos criados com os clientes, com metas mútuas e uma estrutura de governança que garantisse o alinhamento de expectativas e interesses. Não se trata de substituir palavras por imagens, mas rever o contexto e trazer clareza para a comunicação.
Nesse sentido as partes se sentem tratadas com justiça e respeito, transformando uma abordagem transacional em um vínculo de confiança. O ciclo de negociação e assinatura de contratos é reduzido drasticamente, como nos exemplos a seguir.
O contrato acima foi criado para uma empresa que atua no segmento de contabilidade a pequenos e médios empresários. Nesta etapa da abertura de um novo negócio normalmente os clientes estão sobrecarregados com dúvidas e preocupações, pois é necessário estar em conformidade com toda a legislação vigente e construir as melhores estratégias de acordo com a disponibilidade de recursos.
Esse outro documento resolveu um desafio que implicava em garantir a compreensão das fases de execução do serviço contratado e evitar discussões após a assinatura, ou seja, as quebras contratuais. Ambos os exemplos acima mencionados, reduziu o tempo para a concretização do negócio em média 60%, otimizando custos e a experiência proporcionada.
A antecipação e a resolução proativa de possíveis problemas, muitas vezes motivadas por meio de soluções inovadoras, não apenas poupam tempo e recursos, como também preservam a reputação de empresas.
Uma estratégia sólida de Customer Experience no contexto jurídico também impulsiona a transparência e a responsabilidade. A clareza das políticas de reembolso, termos de uso e contratos não protege apenas os clientes, mas também evita mal-entendidos que podem culminar em custos operacionais e um gerenciamento de crise diante do mercado.
Em diversas pesquisas recentes foi relatado um aumento no investimento a departamentos de Customer Experience, além da intersecção de dados entre essa área a outras como marketing, vendas e atendimento. O fato curioso é ausência de menção ao jurídico, onde todas as questões da companhia recaem e com um potencial valioso para a atuação consultiva preventiva.
O ajuste e melhoria contínua de processos internos de resolução de conflitos além de uma nova forma de comunicação com o cliente, demonstram um compromisso visível com a qualidade e ética do relacionamento, que por sua vez, reforça a confiança do cliente e desenvolve um poder de marca que eleva uma organização a outro patamar.
Em resumo, a incorporação do Legal Customer Experience como aliado estratégico nos departamentos jurídicos das empresas transcende a mera redução de reclamações e processos judiciais. Ela sinaliza uma transformação profunda na abordagem corporativa, onde a prevenção de conflitos e a promoção de soluções amigáveis se tornam pilares fundamentais.
Incorporar essa perspectiva, não apenas faz com que sejam economizados recursos, mas também consolida empresas como parceiras comprometidas com o bem-estar e a satisfação do cliente, em um ecossistema onde a confiança e a credibilidade posicionam essas companhias em um espaço privilegiado.
Katsuren Machado é advogada e consultora especialista em legal customer experience.