Autor: João Luís Almeida Machado
Fui demitido. Perdi o emprego em que estava trabalhando há 6 anos. Especialista numa área em que poucos profissionais possuem conhecimento e preparo para atuar, definitivamente não esperava que isso viesse a acontecer. Nem meus colegas de trabalho entenderam os motivos que levaram a instituição a tomar essa providência.
Mas, como sabemos o quanto o mundo é competitivo (ou pelo menos deveríamos estar a par disso), e como a globalização tem redirecionado as energias e exigido custos mínimos e máxima produtividade, penso até que isso demorou a acontecer. Já havia ocorrido idêntica situação com outros profissionais de qualidade que, da noite para o dia, foram simplesmente desligados de suas funções, demitidos sumariamente.
Não que isso seja uma particularidade dessa instituição. Nem tampouco é possível encarar os acontecimentos como sendo derivados de alguma perseguição ou diferença pessoal. Tudo, a propósito, ocorre da forma mais impessoal possível. A despeito de todo o trabalho feito, do reconhecimento do público-alvo (no caso dos professores, os próprios alunos), da disponibilidade para reuniões e atividades extras, o que é avaliado não é a sua capacidade profissional e sim, o quanto você custa para a empresa.
O trabalho existe, mas a forma como as empresas estão contratando profissionais modificou-se. Você já entendeu como isso está acontecendo? Prepare-se.
Num mercado altamente competitivo, onde os custos com publicidade são cada vez mais exorbitantes (para garantir visibilidade e retorno), em que é necessário dispor de infra-estrutura e recursos materiais de ponta, a mão-de-obra mais qualificada e de alto custo deixou de ser um diferencial no qual seja prioritário investir. Se for possível contratar outro profissional que faça o mesmo serviço, mesmo que sem a qualidade, especialização e profundidade da pessoa que o realizava anteriormente, por que pagar mais?
E essas conclusões todas são minhas? Não. E nem tampouco são fruto de mágoa com a instituição e as pessoas que continuam a trabalhar por lá. As idéias que estou comentando quanto ao fim do emprego fazem parte do portfólio de estudos de pesquisadores e estudiosos da questão do trabalho. São economistas, sociólogos, jornalistas, historiadores, educadores e muitos outros profissionais que estão se debruçando sobre o tema e que chegaram a conclusões para lá de interessantes, como as que apresentamos a seguir:
– O fim do emprego como concebido ao longo dos últimos 50 ou60 anos é uma realidade. Poucos serão aqueles que ficarão por mais de 5 ou 8 anos numa mesma empresa. Carreiras duradouras, daquelas em que o sujeito trabalhava ao longo de toda a sua existência num mesmo emprego, serão raríssimas.
– A rotatividade profissional de qualquer trabalhador, que até recentemente era vista como um sinal de imaturidade, falta de seriedade ou mesmo de problema para uma empresa contratante, passou a ser encarada como acúmulo de experiências e de diversidade de habilidades e possibilidades funcionais.
– A alfabetização digital não é mais um pré-requisito obrigatório, tornou-se uma ferramenta básica, que se não fizer parte dos conhecimentos e instrumentos de trabalho de um profissional, irá condená-lo ao ostracismo.
– A disponibilidade para aprender novas funções e adaptar-se a situações de constante mudança do mercado, oriundas da disputa global em que estamos inseridos nos dias de hoje, também é critério importantíssimo para quem pretende trabalhar.
De acordo com o consultor Ricardo Neves, em seu livro “O Novo Mundo Digital” (Editora Relume Dumará), mergulhamos em um mundo em que o emprego, aquele vínculo entre empresa e empregado, que dá ao funcionário uma forte sensação de estabilidade, associada a fatores como os benefícios trabalhistas e principalmente o salário mensal, está dando lugar ao conceito de trabalho. E o que seria então trabalho? Seria, no caso, a vinculação a projetos e planos, ações e realizações de prazo variável (curto, médio ou longo), para os quais os profissionais seriam contratados enquanto terceiros para realizarem tais intentos, enquanto durassem essas empreitadas. E as garantias trabalhistas? São suprimidas, pois representam custos altos que as empresas precisam cortar. E os salários? São substituídos por honorários pagos aos profissionais que atuam como empresas, ou seja, que são identificados como pessoas jurídicas. O que se estabelece a partir de agora passa a ser o vínculo profissional free-lancer, bastante conhecido dos profissionais que atuam na imprensa.
Também é uma prerrogativa dos novos tempos que a tecnologia esteja cada vez mais incorporada ao cotidiano e que, em alguns casos, como já ocorreu em vários segmentos profissionais (em particular na indústria, na agricultura e até mesmo nos serviços), máquinas como computadores, robôs e sistemas sofisticados substituam trabalhadores.
O setor bancário, conforme dados apresentados na obra “O Novo Mundo Digital”, tinha cerca de 900 mil empregados no início da década de 1980, número reduzido para 300 mil nos dias de hoje em virtude da utilização das novas tecnologias, cujo custo é muito mais reduzido para os bancos.
Outra situação bastante comum e que já está em vigor nos Estados Unidos e em países desenvolvidos é a transferência dos setores de produção mais pesada para países em que a mão-de-obra e os custos governamentais são mais baixos. E não pensem que isso significa a busca pelo trabalho desqualificado como outrora. Os profissionais do novo milênio precisam ter boa formação (domínio da tecnologia, conhecimento de línguas estrangeiras, curso universitário etc.). Os maiores exemplos de locais onde isso já está efetivado são a Índia e a China, que absorveram grande parte dos investimentos que se deslocaram do Primeiro Mundo em busca de custos mais baixos.
É por isso que, mesmo tendo perdido o emprego, não acreditei que fosse vítima de alguma perseguição interna da instituição. Entendi, desde o princípio, que os custos que significava para a empresa eram um pouco mais altos do que a média local e que, em virtude disso, fui mais uma vítima da competição globalizada.
O que fazer? Se preparar para o futuro – que não será tenebroso e sim diferente – estudando, se preparando, buscando novos espaços, virando a página e, dando a volta por cima.
João Luís Almeida Machado é editor do Portal Planeta Educação.