Autor: Edson Vismona
Na faculdade de Direito do Largo de São Francisco, uma das primeiras lições que tive foi que o direito é a “disciplina da convivência humana e do amor de uns pelos outros”, nas palavras do emérito e saudoso professor Goffredo da Silva Telles Jr. Hoje, ao analisarmos o nosso entorno, parece que esse precioso ensinamento é utópico. A civilidade perde espaço, autoridades adotam comportamentos agressivos, desrespeitosos e no afã de defender suas posições, agridem, contaminando muitos que passam a também assim agir.
Esse afastamento da civilidade deve ser contido. Na ABO – Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman, há mais de 25 anos, no exercício da representação dos legítimos interesses do cidadão, defendemos princípios de convivência e de respeito à dignidade das pessoas. Esse é o nosso dever em respeito ao nosso Código de Ética.
Dentre as inúmeras situações que lidamos no relacionamento das instituições públicas e privadas com os cidadãos e internamente com os colaboradores, temos identificado o crescimento da prática dos assédios (moral e sexual): agressões verbais ou físicas; atos reiterados por palavras ou atos ocasionando humilhação e constrangimento, violando a dignidade e integridade psíquica do trabalhador; exigências descabidas e desproporcionais; ação vexatória; intimidação sexual; cyberbullying; práticas e posturas discriminatórias.
Esses comportamentos despertam repulsa, causando sérios danos à saúde dos trabalhadores, estimulando o desenvolvimento de síndrome do pânico, depressão e até suicídios, e são um vetor de deterioração das relações internas que por vezes se reflete no desempenho das organizações e até mesmo em judicialização, com graves consequências econômicas e reputacionais. Portanto, temos que falar desses desvios de conduta.
Compreendemos que, nesse contexto, devemos estimular o alerta para coibir a continuidade dessa verdadeira perversão e oferecer não só uma campanha, mas um movimento que agregue empresas, órgãos públicos, associações com a sugestão de uma autorregulação, com iniciativas que fortaleçam a convivência sadia e a segurança psicológica, encorajando a colaboração e o aprimoramento da comunicação corporativa.
Nesses termos foi desenvolvida a “Carta Compromisso para a Prevenção e Combate aos Assédios” com pontos aqui apresentados, e um selo que ateste a adesão das instituições a esse proceder ético, prevenindo a ocorrência dessas práticas e acolhendo, dando apoio aos que silenciosamente são envolvidos nesse contínuo sofrer.
O lema que assumimos e conclamamos às instituições públicas e privadas para que participem é: “Aqui Não #Movimento Contra os Assédios”. Em verdade, na segunda década do século XXI não podemos mais aceitar a continuidade de ações que contrariem o sentido de dignidade e valorização do ser humano no ambiente de trabalho, sufocando as pessoas, plantando o medo e o sentido de insegurança que degenera a autoestima.
Voltando ao tema da preservação da civilidade e valorização da convivência, ao responder a pergunta título desse texto, para quem pratica assédios você não tem importância, mas em verdade você é uma pessoa que merece todo o respeito. E, como está expresso no artigo 1º. da Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948: “Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e em direitos. Dotados de razão e de consciência, devem agir uns para com os outros em espírito de fraternidade”. Esse é o valor supremo que temos a obrigação de relembrar em todos os momentos, especialmente para demonstrar que o desvio de condutas, que os assédios tão bem representam, não pode ser aceito.
Edson Vismona é Advogado, fundador e atual presidente do Conselho Deliberativo da ABO – Associação Brasileira de Ouvidores/Ombudsman, foi secretário da justiça e da defesa da cidadania do Estado de São Paulo (2000/2002).