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A cultura em favor do cliente

“Um dia quase surtei de tanta informação!” A lembrança é de Nadir Moreno, nesta Entrevsita Exclusiva, ao falar dos tempos em que trabalhava no callcenter da UPS, quando a informatização era mínima e a maioria dos dados devia ser decorada para informar aos clientes sobre a situação dos pacotes enviados. Lá se vão 17 anos, marcados pela passagem por praticamente todas as áreas da empresa – um processo longo de preparação profissional dentro do projeto de carreira, com trabalhos internacionais na América Latina e Estados Unidos – e Nadir chegou à presidência da subsidiária brasileira da centenária UPS, em 2007, de forma até surpreendente. “Estava sendo preparada para subir na área de gestão de pessoal, mas veio o convite e acabei aceitando o desafio”, lembra. Principal executiva da subsidiária brasileira da companhia de 102 anos, presente em 200 países, com 425 mil funcionários e faturamento anual global de US$ 51,5 bilhões, tem alguns bons desafios como fazer a subsidiária brasileira brilhar aos olhos da matriz. Para isso, precisa crescer internamente (atualmente ocupa a terceira posição no mercado de logística no País, segundo dados internos da UPS) de forma rentável, superando a crise. O caminho para o crescimento está no cliente. “Atendimento ao cliente, para nós, é foco número zero de prioridade!”, brinca.
Quando foi sua chegada na UPS?
Foi há 17 anos. A subsidiária brasileira foi criada há 14 anos, no dia 26 de maio de 1995. Eu comecei na UPS em 1992, que ainda representada por uma agente, a Jet Services, no departamento de atendimento ao cliente. Fui a nona funcionária no Brasil. A primeira operação era pequena. Na época não tinha importação, apenas exportação, por isso a operação era em Guarulhos. Eu era um pouco de tudo, pois a empresa era pequena, com 25 funcionários. Hoje são 650 funcionários diretos e 1.500 indiretos. Nestes anos, trabalhei em todas as áreas do departamento financeiro.
Como foi o processo de preparação de sua carreira?
Quando comecei na UPS, já era formada em Línguas, mas como não agregava para a atividade na qual estava trabalhando decidi fazer Direito, pois ganharia visão jurídica na área trabalhista, para administrar pessoas. Queria ser da área de recursos humanos, sempre gostei de lidar com pessoas. Em 1999, um ano antes da minha formação, a UPS me promoveu a supervisora de recursos humanos e jurídicos e em 2001, já advogada, cheguei a gerente. Em 2003, a UPS começou a me considerar como potencial candidata para ser aproveitada também fora do País, dentro do programa Career Development. Ele define que o funcionário tem de preparar três sucessores, o que cria estabilidade e estrutura segura para que a empresa não tenha nenhuma perda.
E essa perda pode ser maior ainda se for na presidência!
Sim, algumas cadeiras são mais delicadas. Mas qualquer cadeira é importante, por sermos uma empresa de logística, com busca de produtividade 24 horas por dia. Não existe desmembramento na UPS, pois é uma cadeia de suprimentos. Se eu não cumpro com a minha responsabilidade e obrigação, todo esse fluxo de informação será afetado, chegando ao cliente, que é o motivador de toda a atividade. Com isso, a empresa cria segurança de rotatividade mundial e garante a política de carreira.
Como é esse processo?
Toda mundo busca crescimento profissional, com estabilidade, estrutura e futuro garantido. Fazer cursos fora gera autoconfiança e segurança. Fui para várias localidades, a começar pelos países da América Latina e o Canadá, além de Miami, onde está nossa sede administrativa.
Como foram suas experiências fora do Brasil?
Em 2003, fui para Venezuela, Equador, Chile e Argentina. Em 2005, fui fazer um special assignment em Miami, um projeto com o qual todo mundo sonha dentro do plano de carreira, porque se trata de uma imersão na cultura da empresa, na região que administra todos os países. Como a empresa é americana e todos os processos, projetos e programas são próprios, eu era responsável pela adaptação desses processos nos diferentes países, respeitando a cultura, idioma, linguajar e hábitos locais. Muitas vezes, certos procedimentos acabam sendo recepcionados de forma negativa, pela maneira como foram implementados. É o que acontece na América Latina. Somos muito receptivos e hospitaleiros, mas não necessariamente práticos e objetivos. A UPS se preocupa muito com isso.
Quais foram as principais transformações da empresa nestes 17 anos?
Todas as vezes que um funcionário diz que está com problema no computador ou que o headset ficou um segundo sem comunicação, conto a história do Telex, de quando um cliente pedia uma prova de entrega, o POD (Proof of Delivery). Hoje, é crucial comprovar a entrega do pacote e a coleta. Mas, na minha época, o cliente pedia a confirmação e eu pedia para ele retornar depois de quatro dias, porque tinha de contatar o destino ou a origem, que geralmente era internacional. Hoje, este processo pode ser rastreado e acompanhado pela internet em minutos.
Qual a posição do Brasil frente as outras subsidiárias da UPS?
Depois dos Estados Unidos, a ordem é Canadá, México e Brasil – com o Brasil perto dos outros. O Canadá é uma operação muito grande e foi iniciada em 1975; o México, em 1990, e depois o Brasil. O tempo também conta para definir o tamanho, ganhar experiência e mercado.
Quando surgiu o convide para a presidência?
Em 2005, voltei de Miami respondendo pelo RH e jurídico para a América do Sul. Como englobava Argentina e Chile, passava uma semana na Agentina, uma no Chile e duas no Brasil, durante dois anos e meio. Essa fase foi muito boa, porque aprendi bastante sobre as similaridades que existem entre as leis trabalhistas destes países. Em fevereiro de 2007, me ligaram de Miami questionando sobre interesse pela posição de presidente, não necessariamente no Brasil. Até então, a minha carreira já estava pré-definida para as áreas jurídica e de recursos humanos, a meu pedido, podendo chegar a VP de RH em Atlanta. Ainda que, um ano antes, eu tinha sido entrevistada para country manager da República Dominicana. Em 2007, aceitei o desafio, por ser uma oportunidade. Era um pouco assustador, pois eu não havia me preparado. A empresa me enviou, para treinamentos específicos, ao México, Canadá e Miami. Eu precisava ter visão de pelo menos mais 80% do negócio. Retornei em abril e em junho fui promovida.
E o seu antecessor?
Ele aceitou uma proposta para ser presidente de outra empresa. Até então, todos os ex-presidentes não eram brasileiros. Sou a primeira mulher, brasileira, do RH, jurídico e presidente. A quebra de paradigma é total.
É tradição da UPS ter mulheres na presidência?
Não. Normalmente, vemos mulheres nas posições principais quando são as donas do próprio negócio. Na UPS também não era comum, o que é normal, até porque a natureza da atividade é masculina. Estamos falando de transporte, carga aérea, carga pesada. E hoje a empresa fomenta programas para colocar mulheres em posições executivas. Só na América Latina, quatro países são presididos por mulheres: México, Peru, Equador e Brasil.
Você assumiu todas as operações?
Assumi a presidência das divisões Small Pocket e Air Cargo. São quatro divisões, mais o braço financeiro, a UPS Capital, gerida pelo Flávio Amaral. Em fevereiro de 2008, quando achei que a minha agenda se ajustaria dentro das minhas responsabilidades, eles me promoveram mais uma vez e me deram a Supply Chain Solutions, que tinha o dobro da minha operação na época: eram 200 funcionários e me deram mais 400.
E o que você construiu como experiência com o cliente?
Em tudo que você faz, o fator final é o cliente. Se tem um ativo, vai ter um passivo. Temos os clientes interno e externo. Passei praticamente toda a minha carreira cuidando de clientes internos, dentro do RH e jurídico. Ao mesmo tempo, minha estratégia era fazer com que os clientes internos tivessem a visão e a preocupação com os externos, porque um cliente a menos ou a mais fora da empresa está diretamente relacionado ao resultado positivo e aos benefícios dos clientes internos. Se uma empresa me contrata para que eu preste serviços, e ela está me pagando para isso, o mínimo que eu devo oferecer é excelência. Menos que isso, a parte contratante estará sendo lesada. Sempre que vivencio situações problemáticas como cliente, fico atenta para que isso não aconteça na UPS. Se me afetou e irritou, imagino que vá acontecer a mesma coisa com o meu cliente.
Há uma cultura de relacionamento na UPS?
A UPS é praticamente uma religião e eu sou uma súdita. Nós temos um Policy Book, que é composto por quatro pilares: o pilar número um é associado ao cliente, o dois se refere às pessoas para lidar com ele, o três é a comunidade (a UPS tem uma política super forte com instituições, organizações e ONGs) e o quarto está ligado aos acionistas. O livro dita uma política de como agir frente ao cliente. Mais que isso: existem milhões de procedimentos e programas internos voltados para o cliente, sobre como o executivo deve agir, se vestir, como o meu courrier deve estar: de cabelo cortado, com barba feita, botas engraxadas e carro lavado.
Como surgiu essa política?
Para Jim Casey, que é o grande fundador da UPS, a imagem é tudo. O prestador de serviços é representado por pessoas, como os nossos vendedores e courriers, que foram o foco principal de Cassey em 1907, já que já que entregas terrestres eram o core business da empresa quanfo foi fundada.
Como é a sua relação com os clientes?
Se você entrar no site da UPS e localizar o Brasil, encontrará meu nome e meus dados. O mundo inteiro tem o meu e-mail e o meu telefone. Não é nada privado. Todos os dias, eu abro o e-mail e vejo mensagens questionando o pacote que veio ou o pacote que vai. Transmito para o departamento, cobrando e depois faço follow-up. Não posso nem pensar que o cliente não teve a resposta. A nossa estratégia número um é manter os clientes, porque conquistar já faz parte de qualquer estratégia de vendas, mas manter é difícil. Se você perder um cliente, terá o dobro de trabalho para reconquistá-lo. Por conta disso, temos vários departamentos focados em reter clientes. Temos programas para clientes preferenciais e de serviços ao cliente, independentes do callcenter. São vários diferenciais que dividem as carteiras de clientes (pequenos, médios e grandes), especificando quem cuidará. Além claro do executivo de contas ou do courrier, que passa todos os dias e tem todo o relacionamento. Há também o programa de sponsorship, no qual os gerentes, independente da área, têm uma carteira de clientes significativos e atuam como se fossem padrinho, para dar suporte.
Como é posicionado o callcenter nesta estratégia de relacionamento?
O callcenter é o principal meio de atendimento, detendo 100% das informações sobre as operações. É difícil ser um callcenter da UPS. Aliás, eu já trabalhei lá e até surtei de tanta informação. São muitos callcenters, muitas pessoas trabalhando, todos esses recursos foram desenvolvidos para absorver a informação e responder. Na época, eu decorava. Se um cliente ligava para uma coleta, eu já sabia o endereço, o horário. E era manuscrito, enquanto, hoje, está tudo automatizado. Ainda assim, um funcionário de callcenter precisa ter 100% das informações sobre as operações do Brasil e do mundo. Antes de começar o atendimento, ele passa por um mês de treinamento, mais três de imersão e, ainda assim, tem um acompanhamento próximo, porque qualquer lugar do mundo pode ligar e pedir uma informação, de uma cotação, entrega ou coleta. Ou a instrução de como liberá-lo na Receita. O atendente deve conhecer todas as particularidades e peculiaridades das receitas federais do mundo. Está nos sistemas, mas é preciso treinamento e conhecimento. E os funcionários são avaliados em todos os aspectos.
Como as informações são disponibilizadas para o cliente que liga para o callcenter?
Temos um sistema que registra todo o processo, desde o momento em que o courrier coleta o pacote com um leitor. Quando chega à base, o leitor alimenta as informações sobre a coleta. E o cliente pode acompanhar automaticamente a sua entrega pela internet ou pelo callcenter. Caso haja falta de algum documento de alfândega, essa informação estará no sistema. No caso de clientes assíduos, instalamos o sistema na empresa, que permite controle de faturamento. Permite uma radiografia completa, inclusive de quem enviou a encomenda. Esse é um dos diferenciais da UPS.
A inadimplência é grande?
No Brasil, a cobrança é grande. É uma característica bem particular, quando comparada a outros países. E a matriz da UPS nos questiona muito. Há dois principais motivos: primeiro, é a dificuldade em acompanhar a cobrança no Brasil e, segundo, é que a cultura do cliente para a atividade ainda está em fase de transição. Os consumidores estão se acostumando a recepcionar um pacote que não pediram, que vem com uma nota de débito automático. A UPS pré-paga os impostos e o cliente tem de ir ao banco pagar, mas não há essa cultura. Ele diz: “Se eu não pedi esse pacote, por que vou pagar os impostos?”. Em outros casos, o cliente nem recepciona. Devolve. Esse é um dos desafios.
Este serviço, como o callcenter, é interno?
A cobrança de primeira fase é interna. A segunda é terceirizada. A partir daí, vai até a fase de execução.
Quais são os desafios de hoje?
Há seis meses os desafios eram outros. Agora são aqueles mais a crise. Quer dizer: fazer com que a operação no Brasil seja mais representativa e que a UPS cresça no País.
Quais os principais desafios para o crescimento?
O bom é ter espaço para crescer. Mas o crescimento precisa ser rentável. Obviamente são dois desafios, porque crescer já é difícil, com rentabilidade, ainda mais. Hoje, tenho de proteger o negócio, os postos de trabalho e ultrapassar essa curva. Apesar de estar crescendo com um produto específico, o Service Parts Logistics (SPL), não compensa os demais. Mas seguramos operação sem demissão. Ao contrário, contratamos 81 funcionários de dezembro para cá.
E nos Estados Unidos, houve demissões?
Também não, pois houve um programa intenso para estruturar e consolidar os distritos, associado à redução de benefícios. A UPS tem uma política muito forte de proteger o posto de trabalho, para dar estabilidade ao trabalhador. Cada funcionário é visto como investimento, desde a análise para contratar, treinar e depois demitir, pois representa custo, além de recontratar. Esse ciclo é desgastante, custoso para a operação e pode afetar o cliente, a nossa maior preocupação.
Como uma empresa do porte da UPS conseguiu ter agilidade para tomar essas decisões em relação à crise?
A UPS é uma formadora de executivos. Quem trabalha aqui pode trabalhar em qualquer lugar, pois o desafio é muito grande. Independente da crise, a matriz sempre faz com que se trabalhe com redução de custos e alta produtividade. É preciso apresentar resultados com muita saúde, até por ser uma empresa composta por engenheiros, de logística. Geralmente, a empresa se antecipa e prepara projetos e ações antes que as coisas aconteçam, porque, pelo seu tamanho e participação econômica, a empresa participa de vários órgãos, inclusive nos Estados Unidos. Se os EUA decidem mudar uma Lei, a UPS é convidada a participar da discussão, afinal emprega 330 mil funcionários. Com isso, ela sabe antecipadamente de algo que vai afetar o mundo e se prepara, repassando as informações para todas as subsidiárias. A crise ainda não tinha chegado ao Brasil, mas a matriz já exigia que eu tomasse ações para me precaver. Outro exemplo é a gripe suína. Sabemos que não foram comprovados muitos casos no Brasil, mas todos os dias eles me ligam para saber se eu exigi que os funcionários usem máscaras. Tive de explicar que a própria Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa, não deixou que eu usasse, porque não queriam transparecer grande preocupação.
Qual é o próximo passo da Nadir?
Alcançar todas as metas que tenho no Brasil, dentro da minha área, para poder realmente crescer e posicionar o País com uma importância merecedora e relevante, na qual eu e todos os funcionários acreditamos. E transformar meus funcionários com esse mesmo foco, com visão macro do negócio. Se for falar de outra posição ou ainda dentro do meu plano de carreira, diria que eu gostaria de permanecer nessa posição pelos próximos cinco anos para poder colher os frutos de todas as ações que estou fazendo em conjunto com o meu time.

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