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A relação com cliente não pode virar um faz-de-conta

A visão de cliente é irreversível. Começou com o discurso bombástico do então presidente Fernando Collor, em 1991, chamando os carros brasileiros de carroça, e não parou mais, com a abertura do mercado nacional. Foi o primeiro grande marco para a indústria nacional dar a guinada de pensar produto para atender a demanda do mercado, com foco do cliente. Mas essa é apenas uma das avaliações do empresário e executivo Antônio Carlos Romanoski, que esteve na Copel, a companhia paranaense de eletricidade, e ocupou o principal cargo executivo de várias empresas como Prosdócimo (onde acompanhou a transformação para Electrolux), Eletros, Atlas Eletrodomésticos e hoje é acionista do Centro de Excelência em Finanças (CEFI), da Planner Corretora de Valores e membro do Conselho de Administração da Teka. A propósito, ele deixou o cargo na Atlas para não acumular com o da Companhia Brasileira de Bicicletas (CBB), que trouxe para o Brasil as bicicletas Sundown e agora as motos da mesma marca.

Mas, para ele, o processo foi acelerado nos últimos quatro a cinco anos, com o marketing assumindo a dianteira do conceito cliente, mapeando oportunidades e guiando o processo de geração de produtos, de acordo com a demanda do mercado. Não é só isso. Romanoski prega uma profunda revisão de processo, aliada a uma comunicação fidedigna para o relacionamento não virar um faz-de-conta e a fidelização ser efetiva, real. “A comunicação, nesse relacionamento, além dos mecanismos usuais mais comunicação como televendas, telemarketing, linha direta e tal, o que vale para ser consistente é a empresa ter consciência da importância de se comunicar, da integridade para conseguir credibilidade e estar com todo o processo organizado”, avalia. A falta de integridade, na visão de Romanoski, é até aceita entre as partes, mas a integridade gera credibilidade. “Se não houver integridade, as duas partes se aceitam, se toleram. Vira um faz-de-contas. Faz de conta que eu estou entendendo que você faz isso e você faz de conta que eu estou comunicando a verdade”.

Ele defende que o presidente eficiente precisa ficar fora da empresa 15 dias, um grande desafio para avaliar seus processos. Mas não apenas isso. Ele precisa estar no mercado com toda a equipe. O maior exemplo que Romanoski passa é o de seu diretor financeiro, que, apesar de teoricamente ter a função de cuidar das contas, também visita clientes. “Todos precisam formar opinião sobre o produto e saber o que o mercado demanda”, diz. Ele ainda acha tempo para trabalhar em sua consultoria, a Romanoski Associados. “Eu vivi os dois lados”, lembra. Confira mais esta Entrevista Exclusiva.

Nessa sua longa trajetória profissional qual é a percepção de relacionamento com clientes?
Esse tema não se esgota nunca. De um modo geral, todo empresário, executivo ou qualquer pessoa que mexe com consumo quer ser reconhecido como um bom negócio, bom parceiro, por ter um bom produto. O segredo é a comunicação. E como a comunicação não tem uma receita pronta, a discussão não se esgota nunca. A experiência me mostra que sempre temos nossas falhas, mas ela é fundamental nas relações tanto em uma mão quanto a outra. E o desafio é identificar um processo que leve o cliente a entender a empresa de uma forma clara. A receita número um é integridade. Quer dizer, integridade não é padrão de conduta, é você ser inteiro. Há um grande equivoco, e em muitos empresários experientes, de se aproximar do consumidor utilizando mecanismos que não são íntegros, falando uma coisa que não é verdade, transmitindo uma realidade que não bate com o comportamento. Essa falta de integridade é até aceita entre as partes, mas a integridade gera credibilidade. Nesse caso, as duas partes se aceitam, se toleram. Vira um faz-de-contas. Faz de conta que eu estou entendendo que você faz isso e você faz de conta que eu estou comunicando a verdade. A regra número dois é a integridade, a forma limpa de se comunicar. E a regra que cobre tudo isso é o que o consumidor pensa do seu produto, ele pensa de sua empresa e vice-versa. Essa é uma regra que aprendi, quase que com base científica, durante a experiência que tive na Electrolux, que me deu a oportunidade de viajar pelo mundo e estudar o comportamento do consumidor. Para você ter um bom relacionamento com seu cliente, em primeiro lugar, você precisa ter um produto bom, mas junto com isso, sua empresa precisa ser boa. Você está dizendo ao consumidor: eu vou lhe vender isso, a minha garantia é essa, minha qualidade é essa… eu estou falando, não para o meu distribuidor, é para o meu consumidor final. Esse processo está no subconsciente. Se você fizer um exercício mental, vai ver que, quando você vai comprar um produto coreano, sempre terá uma preocupação, ao contrário de quando vai comprar um Mercedes. Intuitivamente, você liga as duas coisas. O desafio da coreana, que não tem tradição, é mostrar que sua empresa é boa, que o produto é bom… mas só isso não resolve. Você se preocupa se a empresa realmente é boa, se não vai sair do mercado, se não vai faltar peça de reposição, se o produto vai ter preço de revenda. É por isso que em comunicação, no relacionamento, além dos mecanismos usuais mais comunicação como televendas, telemarketing, linha direta e tal, o que vale para ser consistente é a empresa ter consciência da importância de se comunicar, da integridade para conseguir credibilidade e estar com todo o processo organizado – o produto e a empresa.

Como o você avalia a fidelidade do cliente?
Ela está bastante enfraquecida, principalmente no Brasil. Vamos falar em diversos produtos. No caso de marcas de automóveis, não existe fidelidade. Antes era por Volkswagen, depois Ford, a Fiat, que começou mal e reagiu, virou líder. Mas hoje você tem uma gama de produtos tão grande que, por mais que a Ford ou a GM tenham desenvolvido produtos que você gostaria de comprar, tem tantas opções de marcas oferecendo coisas que você gosta! Mesmo no caso do mercado de linha branca. Eu competi, pela Electrolux, por muito tempo com a Brastemp. Era uma luta danada para posicionarmos a Electrolux em função da campanha que eles criaram que posicionou Brastemp como sinônimo de qualidade. Não dava para fazer nada com a nossa marca para competir com a Brastemp em termos de qualidade. Até o ano passado, eles usavam a campanha. Mas hoje, se eles recorrerem a este ícone vão jogar dinheiro fora, pois existem muitas marcas que inspiram qualidade como Electrolux, GE, Bosch. A fidelidade em relação à marca está muito fragilizada, hoje. Quem acha que vai sustentar sua marca, usar só a marca como força, vai ter que investir muito. Isso no caso das empresas globais.

E no caso das empresas nacionais?
Eu fui presidente da Atlas, que teve seu fogão eleito pelo Inmetro como melhor do País. Mas o que adianta investir em uma campanha para posicionar fogão Atlas como o melhor produto em sua categoria quando temos concorrentes como Consul, Dako, Bosch, GE? Não sensibilizar em nada o consumidor. Nesse caso, você tem que fidelizar o cliente com a seriedade de seu produto. A marca é relativa. A comunicação com o cliente tem todos esses ingredientes.

Quando você acha que as empresas pararam de pensar produto e passaram a se focar no cliente?
O marco foi 1991. Quando o então presidente Fernando Collor fez um pronunciamento bombástico, dizendo que os carros brasileiros eram umas carroças. Apesar de provocar a ira do mercado, era fácil perceber o atraso do País pelo fechamento do mercado interno para quem viajava um pouquinho ao exterior. O conceito da empresa que eu trabalhava na época era o de que a indústria fazia e o marketing tinha que vender. A partir deste período, mudou. Quem passou a determinar o produto foi o marketing. Na época, uma mudança radical. A partir do momento que o marketing passou a assumir essa função, passou-se a trabalhar com o conceito de que o produto em desenvolvimento atende o que o mercado quer comprar. Mas acho que a consciência ocorreu mesmo nos últimos quatro a cinco anos, com as corporações se dando conta da necessidade de integrarse com o cliente porque, como conseqüência, perdeu-se o efeito da marca. Como as empresas perderam o diferencial da marca, tiveram que correr atrás do que o mercado queria.

Você acredita que o marketing ainda deve estar à frente da gestão do negócio?
Essa é uma discussão acadêmica bastante polêmica. Não quero desqualificá-la, mas acho que sim. O marketing precisa estar acima da área de vendas, por exemplo. Dentro do business, é a área de marketing que tem que identificar a necessidade do mercado, perfil de produto, de que maneira tem que vender, que região tem que vender. Quando você tem o marketing ligado à comunicação e propaganda, ele fica relativo. Se o marketing não tem essa missão, você acaba fazendo o que a engenharia quer, ou o que o presidente quer. Mas não é tão fácil assim adotar essa cultura, pois quando você vai desenvolver um produto, saber o que o mercado quer, quem está se relacionando com o mercado, vendendo o produto, tem uma visão privilegiada. Mas, muitas vezes, o comercial quer um produto com preço. Mas este produto pode não gerar margem. Por isso, quem tem que ter visão de negócio é o marketing, para ponderar estas necessidades e oportunidades. O financeiro, vai reclamar que o produto pode ter preço mas não dará margem. Fica uma eterna discussão triangular.

E você acha que muitas empresas acabaram fechando por perder esse time?
Sim, muitas. E por incrível que pareça, muita gente vai ler essa matéria e dizer: “puxa, eu tenho de mudar”. Tem muita gente que ainda não se deu conta. Eu defendo a tese de que toda empresa precisa criar o cargo de diretor de “destruição”. Se ele não destruir o seu cargo em um mês, ele não é um bom diretor. Tem muita empresa que o comando está dentro dela. Se você for nas grandes empresas, as salas dos presidentes são confortáveis e o sistema corporativo lhe em volve de tal maneira que ele acha que está produzindo muito, trabalhando 10 horas por dia no escritório. Mas eu defendo que o presidente que não conseguir ficar 15 dias fora da empresa não é um bom presidente. A empresa não precisa do presidente dentro dela. Ela tem que ter sistemas e processos que funcionem para que o presidente fique no mercado, observando o que está acontecendo, as mudanças. A cadeia do processo de venda é muito dinâmica. Você não pode deixar nas mãos do supervisor, gerente ou diretor de vendas. É um processo que toda a organização precisa estar envolvida. O meu diretor financeiro está visitando cliente, vendo o que está acontecendo com o mercado. Ele tem que estar lá, tem que ter sua opinião sobre o posicionamento de nosso produto. A empresa tem que se voltar para fora. E olha que sou presidente há muitos anos e já vivi dentro da empresa achando que a empresa não funciona sem você. Quando passei para o lado de consultor, comecei a ver e ter experiência. Até porque assumi algumas empresas que precisavam que essa mudança ocorresse
rápido.

Como o você traz para a empresa a visão de cliente?
Particularmente, circulo muito e converso muito com o pessoal da área comercial e com representantes tenho hábito de conversar periodicamente para identificar o posicionamento dos competidores. Outra alternativa é cercar-se de gente que tenha capacidade de medir estas ações. E todo segredo do negócio é o produto. Não tenho nenhuma dúvida. A Mercedes-Benz lançou o Classe A, que quase que não pegou. Não necessariamente a marca estabelece a garantia do produto. Você falou a palavra-chave. Visão. Visão é sonho e sonho, dentro da empresa, só o presidente pode ter. Os demais têm missão. Como não estou na empresa no dia a dia, não me interessa se o porteiro bateu o carro, se o porteiro roubou. Claro que não me distancio destas coisas, que fatalmente acabam chegando ao presidente, mas eu preciso saber o que está acontecendo com o mercado. Veja que hoje estamos brigando com o maior fabricante do mundo, a Honda. Eu tenho que me posicionar como um produto onde o cliente veja que o meu produto é honesto e que é bom ele ter aquele produto, que ele vai gostar. Como eu penso assim, todo mundo tem que pensar assim. Quem não compartilhar está fora. Às vezes, pela necessidade da rapidez da ação, não temos tempo para treinar. O profissional precisa entender o que é importante. Se ele não entender e está no campo, não agrega ao negócio. Muitas vezes, pela velocidade, se comete injustiças, claro. Mas o mercado não está permitindo que você demore muito em suas ações.

E qual é a grande dificuldade?
É a de voltar a empresa para o mercado. Todo mundo fala e não consegue. Esse é o segredo. Um exemplo que gosto muito é o Grupo Y. Yamada, de Belém, PA. Eles desenvolveram um cartão de fidelidade que tem três categorias. Fiquei surpreso ao saber que ele dão o cartão diamante para os flanelinhas. A surpresa é a fidelidade incrível que conseguem. Eles descobriram que o cartão deve ser o único documento que o flanelinha tem e o usa para comprar inclusive em outras lojas.

Como você se divide entre o consultor Romanoski e o executivo?
Até julho do ano passado eu era presidente de duas empresas ao mesmo tempo. Da Atlas, que fatura R$ 300 milhões por ano, e da CBB, onde estou agora 100% do tempo como executivo. Mas sou conselheiro de várias empresas e atendo alguns clientes no escritório.

Como consultor, qual o seu primeiro conselho aos executivos?
Uma empresa precisa ter processos. Não adianta você melhorar ou investir em sistemas para melhorar a performance. O desafio é melhorar a performance dez vezes, não 10%. É saber se o que você está fazendo é o que o mercado quer, pois o mercado é muito dinâmico.

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