Inadimplência em alta: oportunidade ou desafio?



Recentes artigos publicados pelas revistas e jornais econômicos e dados de bureau de créditos demonstram claramente que o índice de inadimplência está crescendo em todos os segmentos e produtos de créditos. Fundos, que investiram em direitos creditórios, têm visto o nível de recebíveis vencidos e não pagos crescer de 2,5% para 3,7% no segmento de financiamentos de veículos; de 1,4% para 2,95% para o crédito consignado e de 7% para 13,31% para o crédito corporativo middle, no período que vai de julho de 2007 a outubro de 2008. O número de pedidos de falências e recuperações judiciais também aumentou. Os setores particularmente atingidos são agrobusiness, sucroalcooleiro, carnes e o varejo de eletroeletrônicos. As empresas que já enfrentam alguma dificuldade recorrem à recuperação judicial.

Discutindo o assunto com executivos de bancos de investimentos e da área de crédito bancário parece claro que o cenário para o próximo semestre (ou até mesmo para todo o ano de 2009) será o de empresas de outros setores sofrendo os efeitos da crise, enquanto indivíduos, que esgotaram sua capacidade de endividamento, atrasam o pagamento das parcelas referentes às dívidas contraídas no passado e que comprometeram seus orçamentos por longo período. Um cenário desses é uma oportunidade ou risco para a indústria de cobrança?

Recebi um artigo sobre os efeitos da crise econômica global na indústria de cobrança dos EUA, que demonstra claramente como a estagnação do crescimento reduziu os níveis de recuperação das carteiras de créditos inadimplidos trabalhadas nos EUA de 20% a 30%. As curvas de reabilitação tiverem um significativo shift para baixo, ou seja, significa que não adianta cobrar as pessoas e empresas em um momento em que não há cash extra nos bolsos ou nas tesourarias. O mesmo artigo reporta que, devido a esta situação, muitas empresas de cobrança, que trabalham com success fee, estão revendo e reduzindo as próprias estruturas de custos para não correrem o risco de incorrer em prejuízos.

Ainda assim, creio que não precisamos nos assustar com tais notícias. O mais importante é tomar consciência de que estamos em uma fase de baixa no ciclo econômico e que é preciso pensar e agir rapidamente, visando nos adequar a essa nova situação. Muitos sabem que a palavra crise, em chinês, é composta por dois ideogramas – e que um deles significa oportunidade. Para os empresários do segmento de cobrança, esse é o momento ideal para aplicar mais rigor e disciplina aos seus próprios negócios.

Uma prioridade é se concentrar no core business, descartando negócios marginais e em prejuízo – medida que vale também para os clientes e as carteiras administradas. Foco nos resultados também é essencial, e para tanto é preciso definir metas rígidas, especialmente em relação aos custos e despesas, variáveis essas que são certas enquanto as receitas são incertas ou atreladas ao sucesso da recuperação. Outro aspecto a ser controlado são os investimentos, só no necessário e inadiável. Em tempo de crise “cash is king”. É melhor preservá-lo, se não tiverem um cenário claro do amanhã.

Por fim, se for necessário reduzir a estrutura ou mesmo o staff, tenham a coragem de fazê-lo. O mais importante é manter, ao seu lado, executivos preparados para suportar a situação – e revertê-la favoravelmente.

Salvatore Milanese é sócio da KPMG Corporate Finance Ltda. na área de reestruturação de empresa e transações envolvendo créditos inadimplidos.

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