Capazes de mudar de produto ou serviço, pelo descaso ou falta de compromisso ecológico ou social de determinada empresa, os consumidores estão obrigando as empresas a reverem suas estratégias e agregarem o respeito ao meio ambiente na pauta de reuniões como elemento fundamental. A discussão chega como ferramenta importantíssima, de compromisso e credibilidade, a responsabilidade socioambiental, que atrai clientes e agrega valor à marca. São muitos os exemplos de empresas que exigem a associação de parceiros e fornecedores à preservação ambiental. Inclusive para exportação, como ficou claro no dia de discussão promovido pela Conference ClienteSA, em meados de junho, em São Paulo, realizado em parceria com a Oscip Bio-Bras, que reuniu especialistas e cases para apontar caminhos a empresas de entidades não-governamentais.
O debate demonstrou estratégias de sustentabilidade com visão de futuro, marketing social, linhas de financiamento e incentivos para a área ambiental, legislação, além de mostrar o caminho de parceria entre empresas e a sociedade civil. Entre os cases, BS Colway, SPCom e Avape, que obtém retorno. E já que a preocupação com o meio ambiente foi a principal pauta, a conferência promoveu também uma ação inovadora. No ano em que todos voltaram os olhos para o aquecimento global e a emissão de Gases de Efeito Estufa, a organização do congresso se preocupou em fazer um evento limpo, recuperando as emissões de CO², neutralizadas com plantio de mudas.
Um novo mercado – O que surge como novo, a discussão do aquecimento global, é o mercado de créditos de carbono, que ajuda na luta pela redução do CO2 e traz vantagens às empresas. “É uma atividade nova, mas que já vem gerando grande mobilização por parte dos empresários brasileiros”, explica João Alves, gerente da divisão de questões globais da Cetesb/Secretaria Estadual do Meio Ambiente e Recursos Hídricos, que abriu o primeiro painel do evento.
De acordo com João, para não comprometer as economias dos países, o protocolo de Quioto estabeleceu que os países desenvolvidos poderão comprar créditos de carbono de outras nações em desenvolvimento que possuam projetos (energéticos ou florestais) de Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL). Assim, o mecanismo passa a ser um instrumento que permite a participação no mercado dos países em desenvolvimento ou nações sem compromissos de redução, como o Brasil. “Com isso, as empresas brasileiras podem se beneficiar deste cenário como vendedoras de créditos de carbono e como alvo de investimentos em projetos de redução da emissão de gases”, afirma.
Vantagens – Uma das empresas que já vem colhendo resultados pelas ações socioambientais é a BS Colway Pneus. “Tudo começou quando entendemos que os problemas socioambientais dificilmente seriam resolvidos se ficássemos parados. Então decidimos incluir ações nessa área na nossa estratégia”, conta Ozil Pedro Coelho Neto, diretor de assuntos corporativos da BS Colway Pneus e do IBS – Instituto BS Colway Social, em sua apresentação.
Um dos projetos desenvolvido pela empresa é o Curitiba Rodando Limpo. Nele, a Prefeitura passou a mobilizar as associações de catadores de papel a incluírem pneus inservíveis jogados na natureza entre seus objetos de trabalho. Os catadores passaram a contar com uma alternativa de renda, vendendo os pneus à BS Colway. Eles são picados e transportados para a Unidade Rio Branco da Votorantim Cimentos, no Paraná, onde são utilizados como fonte de energia ecológica e matéria-prima nas cimenteiras. O programa também fez os pneus velhos praticamente sumirem da natureza, no Paraná.
“Assumimos a vanguarda desse projeto mostrando que é possível ser feito. No fim, nossa política de relação social e ambiental acabou trazendo reflexos positivos de imagem e business para a empresa, pois agregamos valor à marca”, afirmou Ozil.
Mudança nos negócios – Os investimentos em meio ambiente, mais do que marketing, é uma estratégia de sustentabilidade com visão de futuro, reforça Lívio Giosa, diretor do Instituto ADVB de Responsabilidade Social (Ires). De acordo com o executivo, as empresas assumiram no Brasil um papel importante junto à sociedade. E de olho nos clientes, mudaram a estratégia. Exemplo: pesquisa realizada, recentemente, pelo Ires apontou que a maioria das empresas já adotou a governança corporativa. “Com os consumidores mais preocupados com a situação do planeta, houve uma transformação nos negócios. Buscando aumentar o relacionamento com o cliente, empresas decidiram por investir no terceiro setor. Hoje a responsabilidade socioambiental é uma grande aliada das empresas que buscam uma vantagem competitiva frente os concorrentes”, comenta Lívio.
Exemplo é a SPCom. Alexandra Periscinoto, presidente, foi enfática: “As questões ambientais foram mudando e nossos projetos acompanharam essa evolução”. A empresa paulistana de call center tem apostado em políticas de gestão visando virar referência em termos de sustentabilidade.
A preocupação está em todas as áreas da empresa e teve início de maneira mais intensa a partir de 1999. A política dos cinco Rs – reduzir, reutilizar, reciclar, recomprar e repensar – é um dos pilares da área de Qualidade e Meio Ambiente. “Nós entendemos que essa política vem a aprimorar nosso desempenho como empresa, e com isso conseguimos um melhor posicionamento no mercado”, afirmou Alexandra. Depois de oito anos de trabalho e investimentos de R$ 1,7 milhões, a empresa já vê o impacto positivo das ações de responsabilidade ambiental, entre elas coleta seletiva de materiais para reciclagem, uso de papel reciclado, coleta de água da chuva, utilização consciente da luz e de outros insumos.
Incentivo e legislação – Os caminhos de benefícios para investimentos em projetos socioambientais foram revelados pelo economista do BNDES, Walsey de Assis Magalhães, que descreveu as linhas de financiamento e incentivos que a instituição tem para uma política de sustentabilidade e explicou como consegui-los. Walsey realçou o fato que o banco não considera o cuidado com o meio ambiente algo que vá contra o desenvolvimento. “Pelo contrário, é uma atividade que promove o desenvolvimento, criando conhecimentos técnicos, gerando emprego, fazendo surgir atividades econômicas e, principalmente, reduzindo o custo empresarial”, afirma o. Exemplo é a biotecnologia, biodiversidade, ecoeficiência e a melhor utilização dos recursos naturais, que geram uma competitividade muito grande para as empresas e promove a capacidade de buscar recursos internacionais, seja pela forma do aumento das exportações ou pelo investimento direto.
Horácio Pedro Peraltta, especialista em direito ambiental da PePeC Ambiental e Associação Paulista de Empresas de Transporte e Destinação de Resíduos Urbanos, Apetres, alertou para a legislação ambiental brasileira, em interface com a responsabilidade socioambiental, com leis repressivas, preventivas e de incentivo. Horácio explicou como organizar legalmente uma parceria com uma organização do terceiro setor e os ganhos que isso traz. “Hoje já há leis que incentivam as empresas a apoiarem Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (Oscips), com descontos fiscais”, apontou. Outro dado importante trazido pelo advogado foi sobre o projeto de lei que obriga o Balanço Social como mecanismo de controle e transparência da responsabilidade social da empresa.
Parceria – Apontado como um dos melhores caminhos para o sucesso de um projeto ambiental, as parcerias entre empresa e sociedade civil foram destacadas por Carina Pimenta, coordenadora do Centro de Competência para Empreendedores Sociais AshoKa Empreendedores Sociais, parceira da McKinsey & Company. Mas ela faz um alerta: para a parceria dar certo é preciso um bom planejamento. Ou os dois lados saem perdendo. Assim, o acordo tem que trazer benefícios para as partes, precisam ter projetos comum e envolvimento. Para facilitar, Carina da a receita: “Primeiro, é preciso ter objetivos bem construídos e claros. Depois, estabelecer diferencial positivo e inovador em relação à atuação. Por fim, construir visão holística do projeto, entender o problema e as soluções”.
Um exemplo prática: a Avape, apresentada por Eliana Victor, gerente de reabilitação clínica. Fundada em 1982 por funcionários da Volkswagen do Brasil, a instituição filantrópica foi criada para valorizar e promover deficientes. Hoje, a Avape conta com trabalhos de inclusão profissional e cultural desenvolvidos em parceria com empresas privadas, como Banco do Brasil, HSBC, GM e American Express. “A Avape é prova de que uma organização sem fins lucrativos pode ter sucesso sem ter que ficar pedindo dinheiro, mas oferecendo serviços sociais para que exista uma melhoria na qualidade de vida da sociedade”, enfatiza Eliana.