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Atenção. O cliente está no comando! Um alerta aparentemente óbvio que não tem fronteiras em atividades e segmentos. Certo? Bem, tem um que precisa urgente se adaptar a esse novo cenário: o varejo. E olha que é palavra do próprio segmento. Trabalhando de forma direta com o cliente, o setor ainda precisa de estratégias para fazer desse relacionamento próximo uma arma de fidelização, avaliam os especialistas. O consenso é de que os varejistas precisam passar por uma revisão na forma de atuação para se adequarem ao perfil de compra dos consumidores.


“Nos últimos 20 anos houve uma grande transformação no mercado. Na década de 90, o poder era do varejo. Depois, nos anos 2000, passou para as mãos da indústria. E a partir de 2010 teve início a Era do consumidor. Foi ele quem começou a definir o caminho que as estratégias do mercado deveriam seguir”, explica Roberto Nascimento de Oliveira, professor do núcleo de estudos e negócios do varejo da ESPM. Apesar de sempre o colocarem em evidência, Nascimento comenta que o setor só começou a enxergar agora que, quem manda é o cliente, e de que é preciso conhecê-lo melhor. “Antes era apenas um discurso”, complementa. Nuno Fouto, coordenador de estudos e pesquisas do Ibevar, Instituto Brasileiro de Executivos de Varejo e Mercado de Consumo, comenta que o varejo brasileiro ainda não é sincero em suas proposições com os clientes. “O mercado está começando agora a perder o medo de trabalhar com os dados para lidar adequadamente com os consumidores”, esclarece.


A opinião é compartilhada por Claudio Felisoni de Angelo, presidente do conselho do Programa de Administração de Varejo da Fundação Instituto de Administração, Provar/FIA. Segundo ele, embora os maiores avanços do setor estejam na captura de informações sobre o cliente, o ponto em que está mais atrasado é na maneira de trabalhar esse material, transformando as informações em dados estratégicos para os negócios. “O próprio mercado corrobora com essa visão. Antes as empresas estavam concentradas em obter a maior quantidade possível de informações sobre o cliente. Hoje, as energias estão voltadas para fazer com que esse imenso banco de dados seja convergente, organizado e construa informações eficazes”, afirma Patricia Cansi, gerente relacionamento com o cliente do Grupo Pão de Açúcar.


E não é por falta de vontade do cliente, pois estes permanecem cada vez mais dispostos a revelar informações pessoais em busca de uma experiência de consumo mais personalizada e eficiente. É o que revela a pesquisa Winning over the Empowered Consumers, realizada pela divisão de consultoria da IBM, com 28 mil consumidores de 15 países, incluindo 1,8 mil brasileiros. Cerca de 60% dos entrevistados se sentem confortáveis em divulgar nome e endereço aos varejistas e 59% não vêem problemas em revelar conteúdo sobre estilo de vida, como quantidade de bens, frequência de viagens e número de filhos. Os brasileiros são um pouco mais contidos neste compartilhamento: 55% estão dispostos a passar dados demográficos básicos e 41% concordam em divulgar informações sobre estilo de vida. A maior resistência está em passar aos varejistas informações financeiras, como renda familiar mensal – 55% dos brasileiros responderam que não aceitam informar estes dados às empresas. Já 50% dos entrevistados não gostam de informar dados que permitam sua localização e 45% não aceitam passar o número de documentos pessoais, como RG e CPF.


Vamos conversar
Apesar de ser apresentado como maior desafio, é no próprio tratamento das informações do cliente que estão as principais oportunidades, com a decodificação do comportamento de compra. “O caminho para a rentabilidade está em conhecer mais profundamente os consumidores para explorar alguns nichos. Quanto mais se conhece, mais você melhora a sua estratégia de relacionamento”, reforça Felisoni. Esse trabalho já vem sendo feito por algumas empresas, principalmente do setor supermercadista, e mesmo neste segmento há possibilidades de amplas melhorias. Já outros setores do varejo ainda fazem isso de forma muito inicial, segundo o presidente do conselho do Provar/FIA.


O Grupo Pão de Açúcar foi por esse caminho. Desde 2011, possui um joint venture com a Dunnhumby, que lhe permite usar o conhecimento sobre os clientes para definição de sortimentos e promoções mais aderentes às suas necessidades. Já a bandeira Pão de Açúcar apostou em uma solução técnica focada em conhecer melhor os hábitos de compra, além de promover ajustes nas lojas e ações direcionadas de acordo com o comportamento do consumidor. “A necessidade cada vez maior de diversificação de produtos, serviços e canais traz consigo, e, na mesma proporção, a urgência de se entender e mapear comportamentos a partir de uma visão 360º do consumidor, em todos os momentos em que faz interface com a empresa”, justifica Patricia Cansi, gerente de relacionamento com o cliente, do Grupo Pão de Açúcar.


Estratégia semelhante tem a Livraria Cultura, que possui uma área de inteligência de marketing, responsável por trabalhar com todas as informações trazidas pelos clientes. “Essa área acompanha todo o ciclo de vida do cliente. Sabemos que cada um tem o seu perfil. Hoje, são mais de 70 clusters para que cada vez mais possamos efetivamente falar em gestão de clientes”, pontua Karla Garcia, diretora de marketing e relacionamento da Livraria Cultura. Um componente essencial para essa estratégia é o programa de fidelidade, já que mais de 80% das vendas da rede são realizadas utilizando o cartão. Com o programa, é possível acompanhar a vida do cliente dentro da Livraria Cultura. Isso se reflete, por exemplo, na loja quando o cliente pede uma ajuda ao atendente e, a partir do programa, consegue ter acesso ao histórico de compras, oferecendo uma ajuda mais coerente com aquele perfil.


O professor da ESPM, Oliveira, reforça que é na conversa com o cliente que se sabe suas necessidades. “Caso, contrário, o varejo continuará vendendo o que ele não quer, pelo preço que não quer, na hora que não quer”, adverte. Nesse processo, o callcenter também passa a ser um canal estratégico para conhecer melhor o cliente, como no caso da Viavarejo, grupo formado pela Casas Bahia e Ponto Frio. Por meio do acompanhamento dos registros das manifestações na central de atendimento, a direção da empresa identifica o que está acontecendo. “Na prática, essa ação colabora para a implementação de ações no intuito de superar a expectativa do cliente”, justifica Jorge Azevedo, diretor da CBCC, empresa de relacionamento com clientes da Viavarejo. A empresa também realiza pesquisas para manter um histórico atualizado de cada cliente. O modelo é parecido com o do Walmart. A rede registra as demandas do callcenter no CRM, que é interligado com todas as lojas e áreas de apoio. Dessa forma, gera estatísticas dos fatores mais criticados que são apresentadas, semanalmente, para a alta diretoria. “Este procedimento tem reduzido significativamente nossos processos operacionais indevidos, melhorando a produtividade bem como a experiência de clientes em nossas lojas”, avalia Susana Kokron, diretora de relacionamento com cliente do Walmart. Além disso, a rede de conta com a pesquisa Store Track, que dá um panorama da opinião do cliente, inclusive sobre a concorrência, e dos resultados das ações de cliente misterioso, possibilitando uma avaliação mais direcionada do atendimento de cada uma das unidades.


Multicanal
Diante do desafio de estreitar o contato com o cliente, o varejo também vem investindo na presença multicanal. “Alguns setores mais, outros menos, mas esse é o caminho. Hoje já vemos empresas procurando ampliar o relacionamento com o cliente por diversos canais de contato”, afirma Felisoni, do Provar/FIA. A visão é compartilhada pela gerente nacional de relacionamento com o cliente da Máquina de Vendas, Raquel da C. Macedo Damasceno Costa. “Essa é a tendência. As empresas precisam estar conectadas a todos os meios para melhor atender. E, além de responder ao consumidor o mais rápido possível, é importante que estabeleçam uma relação de confiança”, reforça. O Grupo Pão de Açúcar segue essa estratégia. Hoje, a Casa do Cliente, como é chamada a área responsável pelo contato com o público, possui cinco canais de atendimento: telefone, e-mail, chat, redes sociais e Procon. “A multicanalidade e a necessidade constante de adaptação dos canais tradicionais são sem dúvida um caminho que se faz obrigatório para o sucesso das empresas que tem no relacionamento com clientes o pilar de sustentação”, considera Patricia, do Grupo Pão de Açúcar.


Porém, é preciso haver integração entre os canais, pois devem possibilitar a co-criação de valor, adverte Fouto, do Ibevar. Um exemplo é a estratégia de atendimento feitavpelas redes sociais da Livraria Cultura. Com uma fanpage desde o ano passado, a rede optou por ter uma página interativa, onde o cliente também pode postar para tirar dúvidas. Para tanto, possui uma equipe dedicada às redes sociais que interage com o callcenter. “Dependendo da dúvida, a área faz a ponte com eles, que ficam responsáveis pelo retorno, sempre respeitando o canal que o cliente preferir ser contatado, seja e-mail ou telefone”, esclarece Karla, da Livraria Cultura.


Novo perfil
Esse uso de múltiplos canais de atendimento também é resultado da busca por parte das empresas em atender aos novos perfis de consumidores. Na visão de Patricia Cansi, gerente relacionamento com o cliente do Grupo Pão de Açúcar, a recente mobilidade social gerou novas necessidades para a área de relacionamento, como a adaptação dos canais tradicionais de contato. “A inclusão econômica pressupõe acesso à informação e aos meios de comunicação cada vez mais diversificados”, justifica.


Além disso, o avanço das classes C e D também impulsionou a criação de novos modelos de lojas. “O varejo físico está procurando diversificar os formatos para ir até onde o cliente está. Por isso que surgiram nos últimos anos os ‘atacarejos’, sacolões e minimercados”, exemplifica Roberto Nascimento Azevedo de Oliveira, professor do núcleo de estudos e negócios do varejo da ESPM. Dentro dessa visão, o Walmart criou a Soft Discount, que se aproxima dos modelos de lojas de bairro com preços mais baixos e gama de produtos diferenciada para atender esse nicho de mercado. “Elas possibilitaram a penetração da rede em localidades que não comportavam formatos de lojas maiores”, esclarece Susana Kokron, diretora de relacionamento com cliente.


Apesar desse caminho em direção à nova classe média, Fouto considera que o varejo perdeu a oportunidade de fazer isso no momento adequado e ainda tem dificuldade de entender esses novos grupos de clientes. “Falta perceber que não é um público só, mas diferentes grupos com diferentes expectativas”, alerta o coordenador de estudos e pesquisas do Ibevar. Dessa forma, volta-se lá para o começo e à necessidade de conhecer o cliente. “Se eu não sei quem é o meu cliente, não posso entregar o que ele busca. As empresas já viram que precisam mudar urgentemente sua forma de gestão ou irão fechar as portas”, garante Oliveira.


Forca do pequeno relacionamento próximo
O pequeno varejista brasileiro vem registrando nos últimos anos crescimento superior ao grande, segundo Roberto Nascimento de Oliveira, professor do núcleo de estudos e negócios do varejo da ESPM. A explicação, para o especialista, é que o pequeno varejista percebeu antes, que o poder foi para as mãos dos clientes. “Enquanto o grande está engatinhando, ainda perdido com o nome que cada modelo de loja deve ter, o pequeno saiu na frente e rapidamente incorporou as tendências”, explica. Pesquisa realizada pela instituição com mais de 100 empresas formais de pequeno porte mostra que o segmento registrou um crescimento médio de 15,5% nos últimos anos. “O pequeno conhece mais o cliente, porque está próximo dele, além de ser mais dinâmico para a tomada de decisão, dois fatores essenciais para esse crescimento”, esclarece Oliveira.

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