Autor: Thiago Frederick
Hoje em dia existem pontos bastante divergentes sobre o processo de automatização do atendimento: muitos defendem que é necessário automatizar todos os processos e reduzir os custos do atendimento ao cliente; por outro lado, existe um grupo que defende fortemente que todo o atendimento deve ser prestado por uma pessoa, pois é necessário atendimento personalizado para prestar um bom serviço. Quem está certo? A meu ver, nenhum deles.
Para atender bem seu cliente e ainda manter uma relação de custo eficiente é necessário mapear quais processos de atendimento devem ser automatizados, liberando, assim, os operadores para os atendimentos especializados. Recentemente, li a entrevista de um executivo de um grande e-commerce do Brasil. Na ocasião, ele se vangloriava porque sua central não possuía nenhum atendimento eletrônico, dizia ele: “aqui atendemos todos os nossos clientes de forma personalizada, por isso não colocamos máquinas no atendimento”. Suas palavras soaram muito bem, mas na prática como funciona efetivamente? Ele realmente consegue atender com qualidade todo mundo que tenta contatá-lo?
Felizmente, sou cliente desta empresa e tive a experiência de contatar sua central para obter informações sobre um pedido. Relato agora minha experiência: liguei para a central de atendimento e, após aguardar cinco minutos na fila de atendimento, descobri que o atendente deveria consultar o sistema. Em menos de 30 segundos ele me retornou com a seguinte frase: “Sr. o seu pedido está em transporte e chegará hoje na sua residência”. Conclusão: eu gosto do atendimento desta empresa e acho que o executivo realmente quer atender os seus clientes de forma personalizada, entretanto, ele está usando a estratégia errada. A informação passada era padronizada de acordo com a situação do meu pedido e eu não acho que precisaria esperar cinco minutos na fila de espera para escutá-la. Sendo assim, defendo que esse, com certeza, é um processo que deveria ser automatizado, pois melhoraria a qualidade do serviço prestado.
Quais serviços uma empresa deve automatizar e quais devem ser efetuados por um atendente?
No processo de análise do que automatizar, a empresa precisa fazer algumas perguntas essenciais que auxiliam em sua decisão, como:
– A informação que será passada ao cliente está disponível em um sistema ou requer análise do atendente?
– O processo feito pelo operador está no sistema ou é feito manualmente?
– A informação que será passada ao cliente pode gerar estresse no relacionamento?
– É necessário tomar alguma ação após a informação dada ao cliente?
De posse das respostas para estas perguntas, torna-se possível mapear de maneira eficiente quais processos automatizar. É como um banco, se o cliente quer sacar ou depositar dinheiro, hoje, o processo mais simples é ele usar o caixa automático, por outro lado, se ele quiser fazer um investimento e não for experiente no assunto, com certeza, é melhor falar com o gerente de sua conta. Não existe um caminho certo para todos os casos, é preciso avaliar cada situação de relacionamento de acordo com cada empresa, para então, determinar se o processo pode ou não ser automatizado.
Superada a etapa do que deve ou não ser automatizado, partimos para o processo de automatização dos processos. Até meados de 2010, os atendimentos automatizados, de modo geral, tinham como característica uma voz feminina padronizada, semelhante a um robô, independentemente para onde você ligava; banco ou laboratório de exames, a voz era sempre a mesma e, muitas vezes, até as opções no menu eram iguais. Inúmeras vezes ouvi pessoas dizerem que não gostavam de falar com máquinas, então digitava logo o “9” para ser transferido para o atendimento humano. Sendo assim, estava lançado o desafio às empresas: era preciso inovar ou o atendimento eletrônico não faria mais sentido.
Começaram então a surgir os primeiros casos de atendimento humanizado. Ainda muito pautados em mudar o diálogo, porém tornando a abordagem mais amigável. Outra mudança foi a alteração no tom da voz e algumas empresas passaram a utilizar uma voz masculina. A ideia era romper com aquela voz padronizada e robotizada das antigas URAs.
Foram inúmeros e importantes os esforços para promover algumas mudanças, que isolados até causam algum impacto nos usuários, mas não são efetivos. Para realmente humanizar o atendimento eletrônico é necessário ir além e entender o comportamento do seu cliente e, principalmente, conhecer seus processos internos e sistêmicos.
Uma dica bastante útil na construção da URA humanizada é: não queira resolver todos os problemas de forma automática. Primeiro, você não conseguirá. Segundo, seu cliente não terá paciência para ouvir um menu recheado de opções. Sendo assim, é preciso usar pareto, ou seja, disponibilizar os 20% dos serviços que serão utilizados por 80% dos clientes; quanto mais simples forem as opções e mais fácil a interação, maiores serão as chances do cliente usar e gostar do atendimento eletrônico.
Imagine você ao ligar na empresa de TV por assinatura cinco minutos antes do jogo do seu time e ouvir: “Olá Sr. Fulano de Tal, temos disponível a compra do jogo com início de transmissão daqui a 5 minutos por apenas 50 reais”. Você comprou o jogo nos últimos 3 domingos, está próximo da hora do jogo, porque a URA deveria lhe passar 5 opções antes de oferecer o jogo? Só porque ela foi construída assim? Ela precisa ser dinâmica, e como existe uma grande chance do cliente ter ligado para comprar novamente a transmissão do jogo, esta deveria ser sua primeira opção. Agora, imagine esse mesmo cliente ligando e ouvindo: informações sobre fatura digite 1; problemas técnicos digite 2; upgrade de pacote digite 3; etc. Efetivamente, ele não precisaria esperar até a opção 5, se houvesse uma opção para reduzir o caminho e logo falar com alguém que resolva seu problema de maneira rápida.
Dentro do processo de humanização é preciso o envolvimento de uma equipe bastante diversificada para analisar todos os aspectos do atendimento, tais como, especialistas de atendimento ao cliente, analista de produtos, analista de negócios, cientista da voz, jornalista e locutor.
Existem empresas especializadas em projetos de humanização de URA que poderão lhe assistir nesse processo. Seja dentro de “casa” ou por meio de uma empresa especializada, o projeto precisa ser feito de forma estruturada, antes de dar início à etapa de implantação de automatização. Para colocar qualquer serviço em funcionamento, é necessário que você saiba o seguinte:
– Qual o perfil dos seus clientes?
– Existe uma segmentação de cliente Premium?
– Seu cliente prefere uma linguagem formal ou informal?
– Quais os principais motivos que geram ligações para a central de atendimento?
Após discorrer um pouco sobre o assunto, creio não ter respondido, ainda, à pergunta principal: o que é então atendimento humanizado? A meu ver, o atendimento humanizado deve priorizar que o atendimento eletrônico seja o mais próximo possível de um atendimento humano; não somente a forma de falar, mas a inteligência nas interações. Por exemplo, uma URA que você identifica o cliente pelo número em que ele está ligando (número de A) e diz: “Olá, já te identifiquei”, é uma abordagem legal, certo? E se esta for a quinta vez que o cliente liga com um problema e a central não consegue resolver? Ele (o cliente), com certeza, não têm mais paciência para ouvir nada, muito menos uma frase que já escutou 4 vezes na última hora. O processo precisa ser inteligente, o cliente já ligou diversas vezes, portanto, deve ser transferido direto com prioridade no atendimento, pois nesse momento ele já está com um nível de tolerância muito baixo.
Outro exemplo é quando ligamos para a central referente a entrega de um pedido e a URA automaticamente informa: “Sr. o seu pedido será entregue na segunda-feira, dia 29”. Seria ótimo, se já não fosse quarta-feira, dia 31! É preciso validar se o pedido do cliente está no prazo para dar-lhe um posicionamento correto no atendimento eletrônico, caso contrário, o melhor seria transferi-lo prioritariamente para um atendente que solucione seu problema.
A construção desse atendimento humanizado depende em grande parte das integrações sistêmicas que responderão rapidamente às questões de seus clientes, usando uma linguagem que se aproxime de seu público, mas com muito cuidado com os exageros. Há casos em que determinadas empresas fizeram uma “URA humanizada” porque o conceito era bonito, contudo erraram na forma. A abordagem inicial era a seguinte: “na moral, digite seu CPF pra eu te ajudar”; não há necessidade do uso de gírias para ser informal. Imaginemos, por exemplo, um cliente que já está ligando estressado com um problema técnico gerado por esta empresa e, no momento em que é atendido, é abordado dessa forma. Deve-se aproximar um atendimento eletrônico de um atendimento humano, mas com certeza essa não é a melhor forma.
Não adianta ser informal, locução cheia de gírias e frases coloquiais e nem mesmo a transferência sincronizada funcionar ou você passar na URA uma informação ultrapassada! Isso não é humanização e irá irritar ainda mais o seu cliente.
Para a construção do atendimento eletrônico humanizado deve-se conhecer o cliente, mapear seus processos de atendimento de forma eficiente, construir integrações sistêmicas funcionais, dispor de uma equipe especializada na construção dos diálogos (árvore de navegação) e, principalmente, ter foco na qualidade do atendimento aos clientes. Somente assim, será possível reduzir custos automatizando processos e, consequentemente, liberar os atendentes para realizar atendimentos críticos com maior qualidade. Ressalto ainda que, assim como os processos da empresa são vivos, a gestão dos processos automatizados também precisam ser. O seu cliente muda, os seus processos e problemas se alteram para melhor ou para pior, novas necessidades e desejos são esperados. Para que o atendimento eletrônico humanizado não se perca ao longo do tempo, manutenção e PDCA contínuo são imprescindíveis na gestão da sua URA.
Thiago Frederick é gestor comercial, projetos e marketing da VoxAge.