Contraponto: tecnologia x recursos humanos

Qual é a melhor alternativa de atendimento: a automática (feita por gravações e sistemas digitais de comando), ou o velho e aconchegante atendimento humano, com todas as suas imperfeições e suas idiossincrasias individuais? Colocada assim, de forma simplista, para que se escolha A ou B, parece óbvio que a preferência irá recair sobre o atendimento humano, mesmo considerando que este é, por vezes, confuso, mal informado e nem sempre tão atencioso como gostaríamos. Mas vamos repor a questão em seu contexto não maniqueísta. À medida em que a tecnologia se democratiza, mais e mais vão se tornando numerosas e complexas as formas de interação entre indivíduos, instituições e empresas.

Já houve tempo, por exemplo, em que a reclamação de um consumidor ao fabricante exigia o envio de cartas, que poderiam levar meses até chegar às mãos adequadas, ou até o deslocamento do reclamante até um balcão de atendimento.
Este ecossistema moroso e cheio de entraves serviu, durante muitos anos, como uma enorme barreira entre indivíduos e empresas, desestimulando fatalmente o fluxo de mensagens entre ambos e colocando a questão do atendimento num plano quase que pessoal. Ou seja: se quisesse, por exemplo, tirar uma dúvida junto ao banco em que mantém conta, o correntista necessitaria conhecer alguém na instituição, que se dispusesse a atendê-lo de forma altamente personalizada, ou perder inúmeras horas em filas ou ao telefone até descobrir o interlocutor adequado para o caso.

Com a disseminação do fax, a fantástica multiplicação das linhas telefônicas, a banalização do PC e, finalmente, o surgimento da Internet, a quantidade de inputs recebidos pelas empresas, a partir de seus clientes e parceiros, atingiu a estratosfera em poucos anos. E há quem atribua a este novo e frenético fluxo de interações indivíduo-empresa o próprio amadurecimento de dispositivos como o Código de Defesa do Consumidor, já que sem a confluência destas tecnologias seria praticamente impossível o surgimento do SAC (Serviço de Atendimento ao Consumidor), um importante requisito para o cumprimento do Código.

Assim como a tecnologia propiciou a explosão dos fluxos de interação nas empresas, é nela que se vem encontrando respostas para o problema de como suportar adequadamente estes fluxos. Mas será a tecnologia sinônimo de despersonalização do atendimento? Engana-se redondamente quem assim pensa. Ao procurar atendimento em um call center da sua empresa de cartão de crédito, o portador deste cartão é hoje muito mais conhecido do que o seria sem os sistemas automáticos de mapeamento estatístico associados à tela do atendente. Assim, ao se relacionar com o cliente A, o atendente do call center pode ter à mão não só um perfil estatístico do seu interlocutor, mas também o histórico de contatos realizados, seus principais pontos de insatisfação e até seu nível de fidelidade à empresa.

E a rapidez com que o cliente é direcionado para o departamento correto para o seu problema é igualmente favorecida pelos famosos menus de opção, que evitam contatos inócuos e eliminam a perambulação inútil pelos departamentos. Mas temos de admitir que dispositivos como menus de opção, sistemas de resposta audível, sistemas de reconhecimento da fala natural, telefonistas automáticas, centrais digitais de mensagens e tecnologias afins são muitas vezes objeto da ira dos consumidores, notadamente os “puristas”, que preferem “falar com gente”.
Ora, levando em consideração que a reivindicação dos puristas é simplesmente infactível (afinal, não há como retroceder ao tempo em que o atendimento one-to-one envolvia uma conhecimento real entre as partes); uma questão interessante a investigar é como dosar corretamente os níveis de automação e humanidade no atendimento de call center.

Primeiro, é preciso enfatizar que uma boa política de call center é a que consegue retirar o melhor dos mundos digital e pessoal, eliminando também os elementos indesejáveis (que existem sim) do aspecto humano e do aspecto eletro-mecânico empregado ao atendimento. Vantagens do atendimento humano: as óbvias – capacidade de interação criativa, improvisação adaptativa, humor, subjetividade… Desvantagem do atendimento humano: sujeito ao humor (nem sempre é positivo); despersonalização (o atendente de um call center, sem a tecnologia, é praticamente incapaz de conhecer minimamente o seu interlocutor) e improvisação. E há muitas outras desvantagens, como a baixa produtividade, mas a lista já é suficiente para caracterizar os pontos fracos desta modalidade.

Vantagens do modelo automático: as óbvias – ganho de escala, uniformização, articulação inteligente de dados para personalizar o atendimento; rapidez e objetividade de resposta, alto nível de produtividade. Outra vantagem importante do atendimento com viés tecnológico está na gerenciabilidade (monitoramento on-line) e nos mecanismos de controle que possibilitam o constante aprimoramento e ajuste da operação para melhorar a curva de satisfação dos clientes. Um atendimento de call center excessivamente robótico pode muito bem satisfazer as necessidades de redução imediata de custo. A longo prazo, porém, pode repercutir nos altíssimos custos que, em última instância, são acarretados pela irritação do cliente: aumento do churn, descontrole dos níveis de stress do canal de atendimento, despesas de retrabalho e eliminação de ruídos improdutivos.

Um atendimento de call center excessivamente humano é aquela solução caseira: simpática (dependendo do dia), mas incapaz de atuar sob um modelo mais rigoroso e raramente eficiente o bastante para evitar a irritação do cliente, o aumento das taxas de stress, o ruído improdutivo e ainda com o agravante de ser economicamente perdulário.

Assim, cabe ao desenvolvedor de tecnologia de call center encontrar a equação exata para harmonizar as contradições dos homens e dos robôs a seu serviço, para resolver outra equação ainda mais difícil: harmonizar as contradições entre o binômio produtividade/custo versus o desejo que cada indivíduo manifesta de receber uma atenção especial das empresas. Estamos saindo do velho conceito do call center como central de posições estanques e repetitivas. Começamos agora a trilhar o verdadeiro caminho do call center associado à idéia do costumer care. A tecnologia para tanto está pronta.]

Cláudio Luiz Moreira de Sá – especialista em tecnologias de call-center e diretor de negócios da Teclan.

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