Milton Biral Filho

Desafios da crise em um serviço essencial

Suspensão do corte de energia dos inadimplentes, fechamento temporário das agências de atendimento físico, transferência de um quarto dos operadores para a inédita experiência de home office, gestão remota da central e transtornos naturais por se tratar de atividade essencial. Tudo isso poderia nos levar a pensar no caos dentro do setor de geração, transmissão, distribuição e comercialização de energia elétrica diante dos impactos do novo coronavírus. Entretanto, nada poderia contrastar mais com isso do que a relativa tranquilidade do entrevistado, de hoje (30), da série de entrevistas dos portais ClienteSA e Callcenter.inf.br.

Há nada menos que 38 anos atuando na área, Milton Biral Filho, head de contact center e canais virtuais da EDP, mostrou que, em termos relativos, diante do tamanho da crise, o impacto ainda pode ser considerado pequeno, se não em todo o setor, pelo menos na sua empresa. “A Aneel flexibilizou as regras do setor e acabou, paradoxalmente, até favorecendo nosso trabalho no atendimento. Como a agência suspendeu os cortes do fornecimento de energia para os endereços residenciais, teremos menos demandas por causa de atrasos nos pagamentos”, explicou o executivo, levando em conta que cerca de 40% do acesso à central da EDP é de inadimplentes, e estes quase sempre exigem um relacionamento mais demorado.

Embora encarando com confiança o momento presente, o executivo não subestima o grau de desafios impostos ao setor. “Trata-se de fornecimento de produto essencial. Não pode faltar. Também, há as demandas por risco de acidentes. O nível de exigência da Aneel já superava a própria lei do consumidor. Mais pessoas terão menos condições de pagar as contas de energia e numa circunstância em que estão em casa, consumindo mais. O impacto para as organizações desse segmento aumentou com o fato de a agência reguladora haver suspendido o corte. Como atenuar tudo isso lá na frente? Os desafios são enormes”.

Atendendo 3,5 milhões de consumidores em São Paulo e Espírito Santo, a primeira decisão da empresa diante da crise foi de sensibilização e conscientização sobre o vírus e os cuidados das pessoas nas centrais de atendimento. Depois, estabelecer um espaçamento entre PAs. “Por se tratar de uma atividade essencial, então teríamos de mostrar nossa responsabilidade perante a sociedade. Na terça-feira (31), começaremos com o home office em 25% dos operadores. É uma coisa nova. Não sabemos se poderemos fazer essa modificação como estratégia de atuação no futuro. No curto prazo, é a única alternativa”.

O executivo contou também que o absenteísmo na EDP aumentou cerca de 20 pontos percentuais, mas, como estão suspensos os cortes de energia nas residências, a central de relacionamento ficou equilibrada. “Temos condições tecnológicas para uma gestão remota. Mas, nesta área, sem o indispensável acompanhamento de perto, fisicamente, pode haver sempre perda de qualidade. Estar presente, como liderança, faz muita diferença”, considera Biral. O desafio para todo o setor, no entendimento do executivo, é grande também porque, ao mesmo tempo em que a inadimplência deve aumentar, os custos se elevarão.

Mesmo com quase duas décadas de atividade dentro do setor de eletricidade, esta é a primeira vez que Milton Biral Filho se depara com essa situação. Tem trabalhado, à distância, 14 horas por dia, na preocupação principal com os profissionais do contact center que ficam operando no site físico. Foi contratado para comandar a transformação digital da EDP, mas agora a pandemia interrompeu o processo que vinha em curso acelerado. Há um ano a empresa vem se inserindo na transformação digital. “Nosso consumidor já desfruta de agência virtual, app, chatbot, etc. E agora vínhamos trabalhando na PA digital e o Whatsapp business. Não pretendemos parar não. Todos os atendimentos de menor complexidade serão digitalizados até o final do ano. E está sendo agora um grande teste, porque o atendimento presencial está fechado”. A entrevista, na íntegra, estará disponível em nosso canal no Youtube.

Amanhã, no centro da série de entrevistas será a vez de Paulo Sérgio João, advogado e professor de Direito Trabalhista da PUC-SP (31/03). Também estão confirmados para essa semana Marcos Calliari, CEO da Ipsos (01/04); e Rodrigo Tavares, diretor de atendimento aos clientes da PagSeguro (02/04). Já na sexta (03/04),o projeto realizará um debate com alguns executivos da área para falar sobre os efeitos no setor de call center.

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