Autora: Vanessa Togniolli
Pesquisas de satisfação de colaboradores são ferramentas comumente utilizadas nas empresas para nortear o trabalho da área de pessoas. Ao apresentar uma abordagem transacional, tratando de questões elementares, como remuneração e benefícios ou associadas a perks (componentes oferecidos que fazem parte da cultura da empresa, como horário flexível, snacks grátis, entre outros), seus resultados apontam exclusivamente para oportunidades de melhorias incrementais em processos e programas corporativos já existentes. Tudo isso é, muitas vezes, encarado pelas pessoas como commodities.
E, sinto dizer, esse modelo de operação dos RHs está com os dias contados. Isso porque vivemos em um ambiente cada vez mais digital, que gera um processo acelerado de transformações no mundo. Esse processo esbarra necessariamente em um aspecto essencial: a mudança do comportamento das pessoas. Com a proliferação veloz das informações e das opções, hoje elas têm nas mãos o poder de não só escolher entre o que lhes é oferecido, mas também de reivindicar a atenção às suas necessidades específicas, aos seus desejos. Com isso, têm o poder de transformar mercados e de estabelecer novos modelos de relacionamento.
Nesse contexto, surge a necessidade de trazer o cliente para o centro das tomadas de decisão nas empresas. Como estamos falando em pessoas, isso vale também para os RHs. Já não é mais suficiente para elas receberem benefícios ou agrados. Elas querem participar, ter voz, atuar segundo um propósito que as preencha. Buscam companhias que lhes ofereçam esse ambiente.
Assim, a área deve encarar o desafio de conhecer melhor as pessoas da companhia, escutá-las, entender o que desejam, o que de fato necessitam para construir soluções e práticas com elas, e não para elas. A centralidade do cliente (aqui, no caso, colaborador(a)) é uma mudança de perspectiva fundamental que vira o jogo e desloca o foco da satisfação para o engajamento.
E é importante desfazer um mal-entendido comum: manter as pessoas satisfeitas não significa que podemos afirmar que estão engajadas. O significado de engajamento é bem mais amplo do que o de satisfação. Enquanto a satisfação é dependente de estímulos e, portanto, momentânea, o engajamento é um estado emocional e tem caráter transformacional. Ou seja, alguém engajado tem paixão pelo que faz e quer fazer a diferença. Sente-se motivado para desenvolver e entregar o máximo de suas habilidades em prol da companhia.
Pode até ter insatisfação com algumas questões da empresa, mas o próprio engajamento o coloca como parte da discussão dos problemas associados a essa insatisfação. O engajamento gera pessoas com inquietações positivas e protagonistas da própria história.
Segundo o professor Tracy Maylett, CEO da DecisionWise e Conselheiro de Experiência do Colaborador e Engajamento, existem 5 drivers para gerar engajamento e eles podem ser resumidos no acrônimo M.A.G.I.C.:
Meaning – Encontrar propósito no trabalho que realizamos. Falar de propósito é pensar e repensar sobre a causa com a qual estamos contribuindo de forma genuína.
Autonomy – Ter liberdade para fazer o melhor trabalho. Aqui, trata-se de assumir a responsabilidade por suas escolhas profissionais e, claro, ter reconhecimento pelos resultados gerados. O gerenciamento dos riscos de se cometer erros também é parte dessa autonomia e cabe à liderança gerar um ambiente seguro para que erros se transformem em aprendizado. Apostar na construção coletiva como um grande veículo para destravar potenciais humanos é um dos segredos do sucesso no ambiente digital.
Growth – Sentir-se desafiado no trabalho. A vontade de crescer profissionalmente por meio do autoconhecimento e do aprendizado deve ser despertada e estimulada. O crescimento deve ser encarado não apenas do ponto de vista particular, mas também coletivo. Compartilhar conhecimentos, focando na formação de outras pessoas e assumir o papel de mentor e coach de carreira.
Impact – Fazer a diferença e ter senso de realização. Gerar resultados relevantes produzem orgulho e vontade de fazer ainda melhor. Ter reconhecimento da empresa sobre as conquistas e os impactos de negócio gerados. Reconhecer o time.
Connection – Sentimento de pertencimento a algo maior que nós mesmos. Isso é o que nos motiva a levantar da cama todos os dias, dá sentido e propósito.
E como gerar engajamento?
No contexto digital, estamos falando em criar ambientes propícios à colaboração, à experimentação, à troca de ideias e à construção do conhecimento coletivo, além, é claro, de trazer novas e melhores práticas operacionais em si. Ouvir as pessoas, entender seus problemas e dificuldades e construir em conjunto as soluções que se encaixem na realidade da empresa têm se mostrado, efetivamente, o melhor caminho.
Além do ambiente, é preciso trabalhar também as crenças limitantes individuais em particular. Ajudar a quebrar barreiras mentais, estimulando o desenvolvimento de novos modos de pensar leva a um posicionamento diferente, mais colaborativo, que de fato produz engajamento. E o respeito pela história de cada um aqui é fundamental!
Por último, não menos importante, cito um elemento essencial nessa equação: a liderança. Líderes têm responsabilidade por promover o engajamento. Aqui, minha principal aposta é o fortalecimento das relações que deve passar pelo respeito, transparência, geração de um ambiente seguro para a experimentação e aprendizado e pela valorização da voz do outro. Em tempos digitais, líderes devem ser os primeiros a se envolver, se engajar no novo mindset, incentivar a construção coletiva real e fazer parte dela. À área de pessoas, fica a responsabilidade de criar condições para que essa forma de liderança seja estimulada e torne-se padrão.
Vanessa Togniolli é gerente de desenvolvimento de lideranças na CI&T.